Beatíssimo Padre, Veneráveis Padres, Irmãos e irmãs:
O Sínodo sobre a Nova Evangelização e o Ano da Fé têm origem na mesma constatação: não podemos continuar a “pensar na fé como um pressuposto óbvio da vida comum” . Com efeito, “este pressuposto não só deixou de existir, mas frequentemente acaba até por ser negado” (Porta fidei, 2). Se já não se pode continuar a dar por óbvia a fé, a primeira urgência está em como despertar nos homens do nosso tempo o interesse por ela e pelo cristianismo. E o lugar privilegiado onde isso pode acontecer é na vida quotidiana, onde, como cristãos, entramos em relação com os nossos irmãos homens.
Lendo o Instrumentum Laboris, que contém tantos elementos preciosos para o nosso trabalho, fiquei impressionado com esta observação: “Desperta preocupação em muitas respostas [nos Lineamenta] a escassez do primeiro anúncio na vida quotidiana, que se desenrola no bairro, no mundo do trabalho”. Parece-me que esta avaliação, que emerge em tantas respostas, coloca o dedo na ferida ao indicar o desafio que temos que enfrentar.
Apesar de todas as tentativas feitas nas últimas décadas para melhorar os instrumentos da transmissão da fé, a constatação é simples: todo o esforço feito até agora encontra dificuldade para gerar uma tal novidade de vida que desperte nos vizinhos e nos colegas a curiosidade por aquilo que os batizados vivem na vida quotidiana (bairro, local de trabalho). Isto diz muito da dificuldade que hoje enfrentamos como Igreja: como superar aquela fratura entre a fé e a vida que torna mais difícil que a fé seja encontrada de modo razoável e, portanto, atraente na vida quotidiana. Se não conseguirmos enfrentar com clareza a questão, continuaremos a fazer esforços desmedidos sem conseguir dar uma resposta adequada à raiz do problema.
Nisso reside, em meu entender, o nexo profundo entre o Ano da Fé e a Nova Evangelização. Com efeito, sem “redescobrir e reacolher o dom precioso que é a fé”, que torne cada batizado uma “nova criatura” capaz de mostrar a beleza de uma existência vivida na fé, a nova evangelização corre o risco de ficar reduzida a uma questão de especialistas e a uma discussão sobre os instrumentos, e de não se verificar como experiência pessoal e eclesial capaz de despertar nos homens o interesse pela fé.
Para suscitar este interesse temos um aliado dentro do homem de qualquer cultura ou condição que seja. Sabemos que o coração do homem é feito para o infinito. E este desejo, mesmo quando sepultado sob mil distrações e erros, é indelével. Permanece nele a espera por uma realização. Porque nenhum “falso infinito” – para usar uma expressão de Bento XVI –, com o qual tantas vezes identifica a sua realização, consegue satisfazê-lo. “De que serve ao homem ganhar o mundo inteiro e, depois, perder-se a si mesmo? O que poderá o homem dar em troca de si” (cf. Mt 16, 26).
No entanto, uma doutrina, um conjunto de regras, uma organização não podem simplesmente responder a esta espera, mas antes o acontecimento de uma humanidade diferente. Como disse Dom Giussani durante o Sínodo dos Leigos, em 1987, “o que falta não é tanto a repetição verbal ou cultural do anúncio. O homem de hoje espera, talvez inconscientemente, a experiência do encontro com pessoas para as quais o fato de Cristo é realidade tão presente que sua vida mudou. É um impacto humano que pode estimular o homem de hoje: um acontecimento que seja eco do acontecimento inicial, quando Jesus levantou os olhos e disse: ‘Zaqueu, desce rápido, vou a tua casa’”. Então como hoje, somente uma criatura nova, uma testemunha de uma vida mudada pode suscitar de novo a curiosidade pelo cristianismo: ver realizada aquela plenitude que se deseja alcançar, mas não se sabe como. Homens novos que criam lugares onde cada um possa ser convidado a fazer a verificação que os primeiros fizeram nas margens do Jordão – “Vinde e vede” – porque “uma fé que não pudesse ser descoberta e encontrada na experiência presente, confirmada por esta, útil para responder às suas exigências, não seria uma fé em condições de resistir num mundo onde tudo, tudo, dizia e diz o contrário” (Giussani, L. Educar é um risco. São Paulo: EDUSC, 2004, p. 16).
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