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Passos N.106, Julho 2009

BENTO XVI

Com a Ascensão, o ser humano entrou na intimidade de Deus

HOMILIA DO SANTO PADRE. Visita pastoral de Sua Santidade Bento XVI a Cassino, 24 de maio de 2009

Caros irmãos e irmãs! "Recebereis uma força, a do Espírito Santo, que descerá sobre vós e sereis minhas testemunhas em Jerusalém, em toda a Judéia, na Samaria e até aos confins do mundo" (At 1,8). Com estas palavras Jesus despede-se dos Apóstolos. Imediatamente depois, o autor sagrado acrescenta que "se elevou à vista deles e uma nuvem subtraiu-o a seus olhos" (At 1, 9). É o mistério da Ascensão, que no dia de hoje celebramos solenemente. Mas que tencionam comunicar-nos a Bíblia e a liturgia, dizendo que Jesus "foi elevado"? (...) Em Cristo, que subiu ao céu, o ser humano entrou de modo inaudito e novo na intimidade de Deus; o homem já encontra para sempre espaço em Deus. Esta palavra "céu", não indica um lugar acima das estrelas, mas algo muito mais ousado e sublime: indica o próprio Cristo, a Pessoa divina que acolhe plenamente e para sempre a humanidade, Aquele em quem Deus e o homem estão para sempre inseparavelmente unidos. O céu é o ser do homem em Deus. E nós aproximamo-nos do céu, aliás, entramos no céu, na medida em que nos aproximamos de Jesus e entramos em comunhão com Ele. Portanto, a hodierna solenidade da Ascensão convida-nos a uma profunda comunhão com Cristo morto e ressuscitado, invisivelmente presente na vida de cada um de nós.

Nesta perspectiva compreendemos por que motivo o evangelista Marcos afirma que, depois da Ascensão, os discípulos voltaram para Jerusalém "repletos de alegria" (24, 52). A causa da sua alegria está no fato de que aquilo que tinha acontecido não era na verdade uma separação, uma ausência permanente do Senhor: aliás, eles já tinham a certeza de que o Crucificado-Ressuscitado estava vivo, e nele as portas de Deus, as portas da vida eterna, foram abertas para sempre à humanidade. Por outras palavras, a sua Ascensão não comportava a sua ausência temporária do mundo, mas principalmente inaugurava a nova, definitiva e estável forma da sua presença, em virtude da sua participação no poder régio de Deus. Caberá precisamente a eles, aos discípulos, que se tornaram audazes graças ao poder do Espírito Santo, tornar perceptível a sua presença mediante o testemunho, a pregação e o compromisso missionário. A solenidade da Ascensão do Senhor também deveria nos encher de serenidade e de entusiasmo, precisamente como aconteceu com os Apóstolos que, do Monte das Oliveiras, voltaram a partir "repletos de alegria". Como eles, também nós aceitando o convite dos "dois homens em trajes resplandecentes", não devemos permanecer a fixar o céu, mas sob a guia do Espírito Santo, temos que ir a toda a parte e proclamar o anúncio salvífico da morte e ressurreição de Cristo. (...)

Caros irmãos e irmãs, a índole histórica do mistério da Ressurreição e da Ascensão de Cristo ajuda-nos a reconhecer e a compreender a condição transcendente da Igreja, que não nasceu e não vive para suprir à ausência do seu Senhor "desaparecido", mas sobretudo encontra a razão do seu ser e da sua missão na presença permanente embora invisível de Jesus, uma presença que atua pelo poder do seu Espírito. Com outros termos, poderíamos dizer que a Igreja não desempenha a função de preparar a vinda de um Jesus "ausente", mas, ao contrário, vive e age para proclamar a sua "presença gloriosa" de maneira histórica e existencial. Desde o dia da Ascensão, cada comunidade cristã progride no seu itinerário terreno rumo ao cumprimento das promessas messiânicas, alimentada pela Palavra de Deus alimentada pelo Corpo e Sangue do seu Senhor. Esta é a condição da Igreja – recorda o Concílio Vaticano II – enquanto "continua o seu peregrinar entre as perseguições do mundo e as consolações de Deus, anunciando a cruz e a morte do Senhor até que Ele venha" (Lumen gentium, 8).

Irmãos e irmãs desta querida comunidade diocesana, a solenidade do dia de hoje exorta-nos a consolidar a nossa fé na presença real de Jesus na história; sem Ele, nada podemos realizar de eficaz na nossa vida e no nosso apostolado. (...) É nesta perspectiva que se insere esta minha visita de hoje que, como o vosso Pastor recordou, tem como finalidade encorajar-vos a "construir, fundar e reedificar" constantemente a vossa comunidade diocesana sobre Cristo. Como? É o próprio São Bento que no-lo indica, recomendando na sua Regra a nada antepor a Cristo: "Christo nihil omnino praeponere" (LXII, 11). (...)

Prezados irmãos e irmãs, sentimos ressoar nesta nossa celebração o apelo de São Bento a conservar o coração fixo em Cristo, a nada antepor a Ele. Isto não nos distrai mas, pelo contrário, impele-nos ainda mais a comprometer-nos na construção de uma sociedade em que a solidariedade seja manifestada por sinais concretos. Mas como? A espiritualidade beneditina, que vós conheceis bem, propõe um programa evangélico resumido neste mote: ora et labora et lege, a oração, o trabalho e a cultura. Antes de tudo, a oração, que constitui a herança mais bonita legada por São Bento aos monges, mas inclusive à vossa Igreja particular. (...) A oração, para a qual todas as manhãs o sino de São Bento com os seus repiques graves convida os monges, é a vereda silenciosa que nos conduz diretamente ao Coração de Deus; é o respiro da alma que nos restitui a paz nas tempestades da vida. Além disso, na escola de São Bento, os monges cultivaram sempre um amor especial pela Palavra de Deus na lectio divina, que hoje se tornou patrimônio comum de muitas pessoas. (...)

Outro ponto fundamental da espiritualidade beneditina é o trabalho. Humanizar o mundo do trabalho é típico da alma do monaquismo, e este é também o esforço da vossa comunidade, que procura estar ao lado dos numerosos trabalhadores da grande indústria presente em Cassino e das empresas a ela ligadas. Sei como é crítica a situação de muitos operários. Exprimo a minha solidariedade a quantos vivem uma precariedade preocupante, nos trabalhadores demitidos ou que vivem de auxílios. A ferida do desemprego que aflige este território induza os responsáveis do Estado, os empresários e quantos têm a possibilidade a procurar, com a contribuição de todos, soluções válidas para a crise do emprego, criando novos postos de trabalho para a salvaguarda das famílias. A este propósito, como deixar de recordar que hoje a família tem necessidade urgente de ser melhor tutelada, dado que está fortemente ameaçada nas próprias raízes da sua instituição? Além disso, penso nos jovens que têm dificuldade de encontrar uma atividade de trabalho digna, que lhes permita construir uma família. Gostaria de lhes dizer: queridos amigos, não desanimeis, a Igreja não vos abandona! (...) Enfim, também a atenção ao mundo da cultura e da educação pertence à vossa tradição. O célebre Arquivo e a Biblioteca de Montecassino reúnem inúmeros testemunhos do compromisso de homens e mulheres que meditaram e investigaram como melhorar a vida espiritual e material do homem. Na vossa Abadia toca-se com a mão o "quaerere Deum", ou seja, o fato de que a cultura europeia foi a busca de Deus e a disponibilidade à sua escuta. E isto é válido inclusive na nossa época. (...)

Não é difícil compreender que esta vossa comunidade, esta porção de Igreja que vive nos arredores de Montecassino, é herdeira e depositária da missão imbuída do espírito de São Bento de proclamar que na nossa vida ninguém e nada deve ser anteposto a Jesus; a missão de construir, em nome de Cristo, uma nova humanidade caracterizada pela hospitalidade e pela assistência aos mais frágeis. Que vos ajude e vos acompanhe o vosso santo Patriarca, com a sua irmã Santa Escolástica, e vos protejam os santos Padroeiros e principalmente Maria, Mãe da Igreja e Estrela da nossa esperança.
Amém!

© Copyright 2009 - Libreria Editrice Vaticana

 
 

Credits / © Sociedade Litterae Communionis Av. Nª Sra de Copacabana 420, Sbl 208, Copacabana, Rio de Janeiro - RJ
© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón

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