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Passos N.105, Junho 2009

CULTURA - DANTE

Uma aventura pela humanidade

por Elizabeth Sucupira

Professor de Literatura na Itália apresenta “A Divina Comédia” na Uerj. Um olhar apaixonado sobre a realidade, capaz de contagiar o público de qualquer idade

Muitos no Brasil já devem ter escutado falar sobre o escritor Dante Alighieri. Talvez alguns já tenham até lido sua principal obra “A Divina Comédia”. O texto é considerado a principal referência na língua italiana e também para a cultura ocidental. Um paradigma tanto para a linguagem quanto para a humanidade. Em 29 de abril, a Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) recebeu o professor italiano de Literatura e História, Franco Nembrini, em um evento promovido pelo Centro Cultural Fato e Presença. No encontro, ele fez uma apresentação da obra de Dante, falou sobre a Idade Média e, por fim, leu trechos e explicou o último canto do livro “A Divina Comédia”.
O professor, autor de uma coleção que estuda a obra de Dante, falou para uma plateia de cerca de 80 pessoas, como os valores da Idade Média influenciaram no livro “A Divina Comédia”. E esclareceu que, diferentemente do que se fala nas escolas e universidades, a Idade Média não é a época da barbárie e da escuridão. “Devemos à Idade Média a concepção unitária da vida”, reforça Nembrini. Dante viveu de 1265 a 1321 em Florença, na Itália, em plena Idade Média. Nembrini explicou que por causa dessa ruptura, dessa distorção existente após a Idade Média, há sempre uma dificuldade em entender Dante.
Sobre Dante, o professor enfatizou que o escritor busca o significado de todas as coisas que existem. “Ele quer saber se tudo que lhe acontece tem um significado. Procura a verdade, se preocupa com a verdade. O que ele tem de mais caro é o amor pela verdade, pelo bem e pela beleza”, acentua Nembrini. O texto de Dante tem relação com a imagem de uma bela menina. Desde criança, ele tinha a imagem de uma bela menina. “No encontro com aquela moça aconteceu o que ele esperava na vida. Deus sorriu para ele no sorriso de Beatriz. No encontro com Beatriz se realiza o encontro com Deus”, conta Nembrini. Beatriz morre de repente. Dante se encontra numa encruzilhada tremenda, encontrou algo que parece trazer felicidade, mas morre. Nembrini diz que Dante reflete muito sobre a morte de Beatriz. “Eu vim ao mundo com todo esse desejo de felicidade, encontro essa mulher que parece responder a esse desejo, mas ela morre”, completa Nembrini.
No livro, o caminho que Dante propõe tem uma introdução, 33 cantos do Inferno, 33 do Purgatório e 33 do Paraíso. A soma é cem. O número cem foi escolhido por Dante porque significa a perfeição. O número três se repete porque significa a Santíssima Trindade. A estrutura do Cosmo, segundo Dante: (esquema do desenho)
Dante acredita que o conhecimento do nosso mal é o início da nossa salvação. Para ele, cada um de nós é feito de inferno, purgatório e céu. O escritor afirma que é preciso conhecer todo o próprio mal para perdoar todo esse mal e chegar a Deus. “A Divina Comédia” fala primeiramente no Inferno. Ele começa a caminhar pelo inferno até o mais profundo do que seria este lugar. Em resumo, o inferno para Dante é o lugar onde fomos para fora para ver novamente as estrelas. Já no purgatório, Dante diz que é o lugar onde se está puro e disposto a chegar às estrelas. Por fim, no paraíso, é o lugar onde o amor é o céu e as estrelas. Mas por que Dante insiste tanto na palavra estrela? Para ele, a nossa vida tem a ver com as estrelas. Tudo tem a ver com as estrelas. Tudo tem a ver com o destino. Até o cabelo da vossa cabeça.
Antes de começar a escrever o livro “A Divina Comédia”, Dante passou por um longo período reflexivo. Nembrini explica que Dante diz que se perdeu em uma selva escura. Na escuridão, não há possibilidade de conhecer e por isso de amar. Se houvesse luz, poderíamos conhecer um leão, uma onça. Dante intui que Deus existe. O professor enfatizou que para Dante a guerra da vida é decidir qual é o caminho, quais são os nossos mestres. Atrás de quem nós vamos andar.
Por fim, Franco Nembrini fez uma breve apresentação do último canto do Paraíso. Ele descreveu a cena em que Dante está sentado ao lado de São Bernardo. De um lado, está Nossa Senhora e do outro, Deus. São Bernardo pede à Virgem Maria que conceda a Dante contemplar a Deus. O poeta vê um tríplice círculo no qual está revelada a Trindade Divina. E depois, tem a sublime visão. A primeira parte do Canto XXXIII do Paraíso, o último do livro “A Divina Comédia”, é uma Oração a Maria. Os versos se seguem de forma surpreendente, talvez um dos textos mais importantes da humanidade, e o canto termina com a palavra “estrelas”.


Em ti, toda a misericórdia

Virgem mãe, ó filha de teu Filho,
a mais humilde e sublime entre todas as criaturas,
termo prefixado de eterno desígnio.

Tu és aquela que a natureza humana
enobreceste de tal forma,
que seu criador não desdenhou fazer-se sua criatura.

Em teu ventre reacendeu-se o amor,
por cujo calor na eterna paz
assim germinou esta flor.

Aqui és para nós luz meridiana de caridade;
e embaixo, entre os mortais,
és fonte vivaz de esperança.

Mulher, és tão grande e tanto vales,
que quem deseja graças e a ti não recorre
é como alguém que desejasse voar sem asas.

A tua benignidade não apenas socorre quem pede,
mas muitas vezes, livremente,
se antecipa ao pedido.

Em ti, misericórdia, em ti, piedade,
em ti, magnificência,
em ti se coaduna todo o bem que existe nas criaturas

(Dante, Paraíso, canto XXXIII, vv. 1-21; tradução livre)

 
 

Credits / © Sociedade Litterae Communionis Av. Nª Sra de Copacabana 420, Sbl 208, Copacabana, Rio de Janeiro - RJ
© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón

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