Antes de tudo, é sempre importante ressaltar a orientação cristológica do Rosário, do Círio de Nazaré e de toda outra forma de culto à Virgem Maria. A letra de uma conhecida canção do padre Zezinho pode nos ajudar a entender o que isso significa: “O povo te chama de Nossa Senhora por causa de Nosso Senhor. O povo te chama de Mãe e Rainha, por que Jesus Cristo é o Rei do céu... Não és deusa, não és mais que Deus, mas depois de Jesus, o Senhor, neste mundo ninguém foi maior”. A recitação do Santo Rosário, longe de ser uma prática devocional enfadonha, como pode parecer a quem desconhece seu significado,é um valioso exercício de contemplação e meditação que leva o crente a recordar Cristo com Maria, aprender Cristo de Maria,configurar-se a Cristo com Maria, suplicar a Cristo com Maria, anunciar Cristo com Maria (Rosarium Virginis Mariae, 13-17).
O Rosário, desse modo, apresenta-se como uma alternativa para enfrentarmos a agitação contemporânea que nos perturba a ponto de não reconhecermos mais quem somos e esquecermos o significado último de nossa existência. Tal confusão desordena nossas relações com as pessoas e as coisas que nos circundam e altera radicalmente a definição de nossas prioridades e necessidades pondo em risco a felicidade plena que tanto desejamos. Não devemos esquecer que somos abertura para o infinito e, assim, nossa sede de felicidade não será saciada enquanto o nosso horizonte se reduzir à realidade terrena. É, portanto, no encontro com Cristo que nos realizamos plenamente, pois “o mistério do homem só no mistério do Verbo encarnado se esclarece verdadeiramente” (Gaudium et Spes, 22).Percorrendo com Maria os mistérios gozosos, luminosos, dolorosos e gloriosos da vida de seu Filho retornamos às nossas origens mais profundas, redescobrimos o sentido de nossa existência e nos abrimos para a vida em abundância prometida por Cristo, o único capaz de dissipar nossa confusão existencial e nos dar a Paz que precisamos para recuperar nossa identidade e reordenar nossa relação com a realidade.
O Rosário, não por acaso, é a oração que acompanha os fiéis peregrinos ao longo da procissão do Círio de Nossa Senhora de Nazaré. Ambas as devoções lembram que a vida humana é uma caminhada em que a origem, o destino e a finalidade são Cristo, Alfa e Ômega (Ap 1, 8). O Rosário e o Círio também ressaltam a companhia de Maria, mãe, mestra e intercessora, que nos ajuda a nos conformarmos a seu Filho, ponto convergente de nossos desejos mais profundos. A propósito dos nossos desejos e necessidades, a corda do Círio e os ex-votos revelam a condição indigente da nossa existência temporal e a nossa dependência de Cristo, aquele que pode saciar nossa inevitável sede de felicidade plena: “Vós nos fizestes, Senhor, para Ti e o nosso coração estará inquieto enquanto não encontrar repouso em Ti” (Sto. Agostinho; Confissões, I, 1).
Por tudo isso, recitar o Rosário ou partirem romaria no Círio de Nazaré deve ser um ato consciente de empenho para que, com Maria, despertemos do torpor daquela confusão existencial que desfigura nossa identidade e de forma nossa relação com a realidade. Caso contrário, corremos o risco de tornar o Rosário uma prática árida e tediosa e transformar a procissão do Círio de Nazaré num mero caminhar pelas ruas de Belém.
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