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Passos N.151, Agosto 2013

DESTAQUE / JMJ Rio 2013

La Juventud del Papa

por Felippe Mecchi e Isabella Alberto

Uma semana que abalou Copacabana, o Rio de Janeiro, o Brasil e o mundo. Um evento de proporções gigantescas, tendo no centro o olhar a Cristo, presente e real. Que não nos deixa tranquilos e desperta perguntas que são o início de um caminho, não o ponto de chegada

Nas últimas semanas, a Jornada Mundial da Juventude realizada de 23 a 28 de julho no Rio de Janeiro foi o tema mais frequente em capas de revistas, primeira página dos jornais e o destaque em sites de notícias. O motivo é óbvio: foi o grande evento do ano no Brasil. Desde o planejamento do evento, já eram esperadas em torno de 2 milhões de pessoas nos principais gestos da JMJ, além de grandes planos logísticos da Prefeitura, enormes montagens de estruturas para palcos e sistemas de som e, o mais importante: a visita do novo pontífice, Papa Francisco, um líder extremamente carismático e de atitudes simples. É natural que tudo isso chame atenção de todos e, por conseguinte, da mídia. Entretanto, quem foi peregrino naqueles dias, pôde observar também um “algo mais”, muito além de números, por maiores que fossem.
Andar pelas ruas do Rio de Janeiro durante a Jornada foi uma experiência realmente inesquecível. Via e ouvia-se pessoas que vieram de distintos países, caminhado e conversando em diversas línguas diferentes, tirando fotos, cantando, conhecendo a cidade. Era comum ouvir “gritos de guerra” quando os grupos se encontravam. E, principalmente, o grito comum a todos: “Esta es la juventud del papa”. Todos seguindo a figura firme do Papa que os guiava a Cristo: “O amigo que não decepciona”, como repetiu o Santo Padre em diversas ocasiões. A semana em que o Papa Francisco esteve no Brasil conduzindo a XXVIII Jornada Mundial da Juventude foi um evento tão marcante que não deixou ninguém indiferente. E a agenda do Papa, aos 76 anos, foi de tirar o fôlego: a peregrinação ao Santuário de Aparecida, o encontro com os jovens na praia de Copacabana, a visita a favela de Varginha, a vigília de sábado, a missa final de domingo, entre outros momentos com as autoridades civis e eclesiais. Mas sua prioridade sempre foi o contato com o povo. Em entrevista a jornalistas no encerramento destes dias o Papa afirmou: “Para mim é fundamental a proximidade da Igreja. Porque a Igreja é mãe, e nem você nem eu conhecemos uma mãe por correspondência. A mãe dá carinho, toca, beija, ama”. E as pessoas reconheceram e acolheram seu carinho. Já no primeiro dia de sua chegada, segunda-feira, as ruas do centro da cidade ficaram lotadas de pessoas que queriam saudá-lo. E à medida que os dias se passavam os voluntários que trabalharam na acolhida aos peregrinos tiverem que juntar toda a energia para dobrar o turno e receber milhares de pessoas que decidiram se inscrever na última hora. Estes peregrinos ficavam nas filas por até 6 horas para retirarem o kit peregrino com a mochila, camiseta, alguns livros e ticket de ônibus e alimentação. Por isso as cores verde, azul e amarelo tomaram conta das ruas. Os mesmos peregrinos que enfrentaram longuíssimas filas para entrar no metrô, ou caminharam durante muito tempo todos os dias para pegar um ônibus ou a barca, ou iam a pé todo o trajeto até seu local de hospedagem. Mas enquanto a mídia reclamava das filas estas pessoas não pareciam estar muito preocupadas. Elas cantavam felizes enquanto aguardavam, faziam amigos trocando endereços de e-mail e facebook, compartilhando experiências, aproveitando cada ocasião.

O início de um caminho. Para participar desta grande festa, 600 jovens de Comunhão e Libertação se reuniram de diversas cidades do Brasil, América Latina e Europa. Dos estrangeiros destacavam-se os argentinos, conterrâneos de Papa Bergoglio, e um numeroso grupo de chilenos. Guiados por padre Julián de La Morena, os jovens se hospedaram em um galpão na região portuária do Rio. O pouco conforto tornou-se recurso para fixar o olhar na beleza do que estavam vivendo. Maria Fernanda, de 25 anos, veio de Lima. Fazia parte de um grupinho de cinco peruanos do Movimento. Ela conta: “Trabalhei muito para juntar dinheiro para vir aqui. Cheguei alguns dias antes e fui acolhida por uma família que me tratou como uma filha. Depois, vindo para o alojamento, foi um choque por causa do frio, tendo que dormir no chão, a água fria. Mas a alegria era maior que tudo isso, e durante as peregrinações que fizemos todos os dias, pois caminhávamos muito, foi crescendo em mim o desejo de descobrir algo grande para a minha vida. Fiquei me perguntando o que move pessoas de todas as partes do mundo a virem até aqui. E o trabalho juntos no galpão para retomar os textos do Papa me ajudou a perceber que esta experiência não é algo para uma semana, mas o início de um caminho”.
Fazer um gesto juntos, em unidade, causava impacto. Ver 600 pessoas juntas pelas ruas, seguindo as bandeiras verdes e laranjas, chamava a atenção. Certa manhã, ao vê-los saindo do galpão para a rotineira caminhada até o metrô, uma senhora grita para eles: “Tenho observado vocês. São especiais”. Silvana, do Chile, ficou provocada ao ouvir este grito: “O que carregamos que leva uma desconhecida a dizer algo assim de nós?”.
Apenas um acontecimento poderia fazer com que tantas pessoas saíssem do conforto de seus lares e da zona de conforto de uma fé vivida de forma intimista e participassem de um gesto de demonstração pública de sua fé. Apenas um acontecimento reuniria tantas pessoas dos mais variados costumes e formas de viver o cristianismo – havia desde grupos vestidos com trajes medievais até grupos com manifestações de fé mais “dançarinas e coreográficas”; padres, grupos de paróquia, freiras, leigos, frades e outros tantos –, todos estes diferentes modos de ser reunidos em um mesmo local, por um mesmo motivo: encontraram Cristo. Esta diversidade de pessoas é uma das riquezas da Igreja, mostra que ela não apaga a liberdade e a personalidade dos católicos, mas acolhe a todos. Como diz São Paulo, “De fato, o corpo é um só, mas tem muitos membros; e no entanto, apesar de serem muitos, todos os membros do corpo formam um só corpo”. A Igreja mostrou realmente ser uma, mesmo na diversidade.

O campo da fé. A chuva inesperada causou alagamento do campus fidei, o local preparado em Guaratiba para os últimos dias do evento. Tudo foi transferido para Copacabana e o Papa na vigília nos lembrou que “o verdadeiro Campo da Fé não é um lugar geográfico, mas somos nós mesmos. Cada um de nós, cada um de vocês, eu, todos.” Uma rota de peregrinação foi mantida. Um momento inesquecível para todos que puderam participar. Passo após passo, no cansaço, na tensão a doar um pouco de si pela glória de Cristo. Para o grupo do Movimento, o início com a oração do terço, uma parada para uma assembleia em pleno Aterro do Flamengo, com vista para o Pão de Açúcar e o Corcovado. Pontos de juízo para que não se parasse apenas na emoção, mas se deixassem provocar pelas perguntas de Papa Francisco, abertos ao que o Senhor estava querendo dizer a cada um naqueles dias.
Como último gesto da Jornada, a Missa de Envio reuniu um corpo de aproximadamente 3,5 milhões de pessoas na praia de Copacabana. Uma multidão lotou a praia e o bairro inteiro se envolveu com o gesto. A cidade viveu uma “Invasão do bem”, afirmou o prefeito Eduardo Paes, também ele surpreso pela beleza que tomou conta da Cidade Maravilhosa. Como a estrutura de banheiros não previa tamanho movimento, foi marcante ver pessoas que abriam suas casas ou estabelecimentos aos peregrinos. Não houve nenhuma ocorrência policial grave e a população se surpreendeu com a atitude dos jovens ao recolher o lixo e manter a ordem. Isso contagiou quem tinha um mínimo de abertura e fez brotar um desejo de participar da vida nova que se via realizar ali. O Papa, na homilia, propõe e explica a frase tema, retirada do Evangelho de São Mateus: “Ide e fazei discípulos entre todas as nações”: “Ide” – pois somos enviados em grupo -, um mandato de Cristo para a Missão. “Sem Medo”, pois “Quando vamos anunciar Cristo, Ele mesmo vai à nossa frente e nos guia”. “Para servir”, ou seja, servir aos outros em “testemunhar pessoalmente o Amor de Deus”. Então, a Juventude do Papa foi, mais uma vez, “convocada” para voltar a seus países para testemunhar o acontecimento de Cristo, com os ânimos renovados pela beleza destes dias.


TESTEMUNHO

“Praia Fidei”


por Alexandre Varela

Em meados de janeiro fui convidado a assumir a coordenação geral do Centro de Imprensa da Jornada Mundial da Juventude. Aceitei mesmo sem me sentir apto para o trabalho. Afinal, seria um enorme aprendizado para a minha função dentro do Comitê Organizador dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos Rio 2016, onde trabalho, além de obviamente ser uma maneira de colocar meus dons a serviço da JMJ.
Tirei dois meses de férias e fui trabalhar como voluntário no COL (Comitê Organizador Local). Preparei a operação do Centro de Imprensa com o maior esmero possível, tentando prever todos os tipos de problemas que poderiam ocorrer. Acompanhei todas as fases da construção da instalação e percebi que tudo se assemelhava muito a um trabalho como outro qualquer. Essa impressão se acentuou quando o projeto foi terminado. Era um ambiente puramente corporativo. Não havia ali nada que lembrasse o verdadeiro sentido de estarmos trabalhando. Confesso que isso me entristeceu um pouco. Já havia brigado internamente pela construção de uma capela, mas os sucessivos cortes de custo não deixaram e, como trabalhávamos com muita terceirização, nem sempre quem estava do outro lado entendia por que isso realmente era essencial.
Lembrei-me de Dom Giussani, quando falava da relação entre Cristo e o trabalho. Sabia que era possível viver o cristianismo em um ambiente “laico”. Mas não me conformava com isso. Afinal, era a Jornada Mundial da Juventude! Dom Giussani sempre nos chamava ao protagonismo, então resolvi parar de me lamentar e fazer o que estava ao meu alcance. A primeira coisa foi organizar a celebração da Santa Missa todos os dias. O segundo passo foi tentar trazer um sinal permanente da nossa fé. E como o Centro de Imprensa estava localizado no Forte de Copacabana, no local exato da igrejinha original de Nossa Senhora de Copacabana, achei que deveria ter a imagem no auditório. E isso foi muito mais difícil do que parecia, pois a paróquia não pôde nos ceder uma imagem grande o suficiente para ocupar o espaço. E foi aí que a Presença de Cristo começou a se revelar. No dia em que ouvi o “não” definitivo da paróquia, recebi a assessora de imprensa do Forte, que queria divulgar mais a história do lugar. Eu sabia que eles guardavam uma cópia da imagem original e perguntei se não se interessariam em trazê-la para o Centro de Imprensa, ajudando a divulgar toda a história daquele lugar. Descemos para conversar com o Coronel, que prontamente atendeu nosso pedido. E finalmente, depois de alguns dias de frustração, Nossa Senhora de Copacabana, acompanhada de um belíssimo oratório do Século XVIII, foi colocada onde deveria e o Centro de Imprensa da Jornada Mundial da Juventude finalmente tinha personalidade católica. Um detalhe que me emocionou muito foi que neste momento caiu a primeira chuva da JMJ. Choveu muito todas as vezes que Nossa Senhora de Copacabana foi entronizada, tanto aqui, quanto na Bolívia.
As missas começaram a encher, e o auditório, que antes era reservado apenas para as entrevistas coletivas, passou a receber um ou outro que fugia da avalanche de responsabilidades para rezar um pouco diante da Mãe do Senhor. Todos, aos poucos, foram percebendo do que se tratava realmente aquele grande evento. E isso foi bonito porque muitos jornalistas vieram falar comigo sobre a Igreja e passaram a me perguntar sobre o significado de quase tudo o que estava acontecendo ali. Os voluntários despertaram para o fato de que, mesmo naquele ambiente extremamente profissional, podiam e deviam dar testemunho. E tudo começou a mudar de verdade. Todas as noites, eu e os voluntários fazíamos algumas brincadeiras (que eram acompanhadas de perto por alguns jornalistas que tentavam entender o que estava acontecendo). Sempre terminávamos com uma Ave Maria, rezada na mais absoluta falta de sincronia, em pelo menos 5 línguas diferentes ao mesmo tempo. Não importava. Era bela do mesmo jeito.
E veio a quinta-feira. O Papa Francisco pousaria pela primeira vez no Forte de Copacabana. Para a decepção de todos, o exército proibiu que os voluntários fossem para a lateral do Centro de Imprensa. Apenas eu e alguns funcionários da produção fomos “convidados” a assistir tudo de perto. Para compensar, consegui que os voluntários pudessem ficar na porta do Forte, fazendo uma espécie de cordão de isolamento, só que dentro das grades. No fundo era apenas uma maneira de fazê-los estar perto do Papa. O Santo Padre pousou. Passou ao lado do Centro de Imprensa, diante da nossa pequena plateia, seguiu pela porta do Forte, onde estavam os voluntários, e causou toda aquela catarse que todos vimos na Praia de Copacabana.
E como tudo ficou mais bonito! Os voluntários voltaram cheios de felicidade. Os funcionários da empresa que fazia a produção, que na época do planejamento achavam que a religião se opunha ao profissionalismo, estavam às lágrimas dizendo que não entendiam como aquilo podia acontecer. Afinal, era só um senhor vestido de branco. Mas todos perceberam que era muito mais do que isso! A partir daí o que se viu foi uma equipe profissional sim, mas antes de tudo, apaixonada pelo que fazia, pelo simples fato de que era feito para Deus. E com a certeza de que Deus não era uma entidade abstrata e distante, mas uma presença que todos podíamos sentir e tocar.
Neste mesmo dia se confirmou a notícia de que os eventos do Campus Fidei, em Guaratiba, passariam para Copacabana. Para nós, no Centro de Imprensa, isso significava passar a trabalhar 24h por dia. Mas como abrir mais um turno de trabalho a essa altura do campeonato? A pergunta não durou muito tempo. Um dos voluntários, que tinha assumido certa liderança sobre os outros, me procurou e disse: “Alexandre, estamos aqui. Estamos trabalhando demais e vamos trabalhar mais ainda. Não fomos em nenhum Ato Central, mas vimos, mais claro do que os outros, porque vale a pena estar aqui e fazer todas essas coisas”. Respondi com um “Sejam bem vindos ao Praia Fidei” (“Praia da fé”, expressão que acabou se espalhando e foi “oficializada” pela Rádio Vaticano para designar a Praia de Copacabana). E então, todos juntos, decidimos que iríamos dar tudo o que tínhamos para que os jornalistas do mundo inteiro pudessem ver e dar testemunho da beleza do nosso povo.
Nesses dias, acima de tudo, levarei para toda a vida o encontro com essas pessoas que vieram para trabalhar em um grande evento e saíram com a certeza de pertencer a um grande povo. Um povo que lotou a Praia de Copacabana pela certeza da presença de Deus entre nós. No meu coração, vai viver para sempre a potência do Praia Fidei.


 
 

Credits / © Sociedade Litterae Communionis Av. Nª Sra de Copacabana 420, Sbl 208, Copacabana, Rio de Janeiro - RJ
© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón

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