“Eu sou de Jesus”, repetia sempre. Um jovem seminarista italiano, morto por guerrilheiros aos 14 anos, é beatificado no dia 5 de outubro, em Modena. Seu desejo era se tornar “sacerdote e missionário” e desde que a vestiu, nunca mais tirou a batina até o dia do seu martírio. Antes de ser morto, pediu um tempo para rezar por seus pais. “Não sei se vou morrer jovem ou velho”, dizia. “O importante é ir para o Céu”
Tenho uma nítida lembrança daquele dia, em julho de 2001, quando pela primeira vez subi até San Valentino, em Reggio Emilia, uma pequena vila onde Rolando Rivi viveu e onde foi sepultado e é venerado. Do alto da colina tem-se uma visão do vale do rio Secchia, na fronteira entre as províncias de Reggio e Modena. Nesse dia comecei a conhecer Rolando e um fato me impressionou: ele era um jovem apaixonado por Jesus; esse amor transformou o jovem; centrou nesse amor o seu projeto de vida; pela intensidade desse amor – porque publicamente proclamava que queria ser todo e só de Jesus (“Eu sou de Jesus”, dizia) – foi sequestrado, torturado e assassinado. Por esse amor, foi beatificado.
Rolando nasceu em 7 de janeiro de 1931, numa família de camponeses. Era de uma fé simples e concreta, sugada com o leite materno, mas que depois amadureceu, num “sim” pessoal, graças ao encontro com o padre Olinto Marzocchini, pároco de San Valentino desde 1934. Crescendo, Rolando começou a se interrogar sobre o que queria ser quando crescesse. Ficou fascinado com esse sacerdote que explicava a todos o significado das coisas; que se entregava sem limites pelo bem de todas as pessoas. Gostaria de ser como ele quando crescesse. No coração de Rolando, quando está por terminar a escola fundamental, amadurece assim a vocação para o sacerdócio.
Com 11 anos entra no seminário menor de Marola (RE). É outubro de 1942 e a Itália, seguindo os ilusórios sonhos de grandeza do regime fascista, há dois anos está em guerra ao lado da Alemanha nazista. A vida de estudo e oração no seminário, apesar de tudo, prossegue regularmente.
Rolando carrega no coração um desejo: tornar-se, como dizia, “sacerdote e missionário”, para levar a beleza encontrada em Cristo a todos os homens, inclusive aos mais pobres e mais distantes. Desde o primeiro dia de seminário veste a batina, que não mais deixará até o dia do seu martírio. O jovem fogo de vida que arde dentro dele tem agora um grande objetivo: a amizade com Jesus. Ele sempre foi “o mais atirado nos jogos”, mas se tornou também “o mais concentrado na oração”, como conta um seu professor no seminário. “Não sei se vou morrer jovem ou velho. O importante é ir para o Paraíso, estar com Jesus”, escreve um dia em seu caderno.
Em 1943, cai o fascismo. Os alemães, como aliados, tornam-se inimigos e ocupam grande parte do país. Muitos, porém, se opõem ao invasor estrangeiro, movidos por um real desejo de liberdade. Nascem, assim, grupos armados de guerrilheiros. Entre 1944 e 1945, a guerra se abate com particular violência também na região onde vive Rolando: bombardeios, chacinas, destruição, sangue. Os nazistas irrompem no seminário de Marola e o ocupam, fazendo dele uma base militar. Rolando, como os demais seminaristas, volta para casa, em San Valentino, mas na vila encontra uma situação profundamente mudada.
Em algumas formações guerrilheiras, de fato, difundiu-se a ideologia comunista, com o projeto de fazer, com o fim da guerra já iminente, não a paz, mas o início de uma revolução violenta a fim de instaurar na Itália a ditadura do proletariado e cancelar Cristo da história do homem. Por isso, os sacerdotes e os seminaristas são considerados inimigos que precisam ser abatidos.
O ÚLTIMO INSTANTE. Apesar do perigo, Rolando continua a dar seu testemunho de fé: reúne os outros jovens, organiza jogos para eles, leva-os à igreja, sempre vestindo a batina. Quando a mãe, chegando da Missa matinal, lhe diz “Tire a batina”, ele responde: “Mamãe, não posso. É o sinal de que sou de Jesus”.
Em 10 de abril de 1945, alguns guerrilheiros o prendem e o levam para um casebre próximo a Modena, o agridem e o humilham. Dia 13 de abril de 1945, uma sexta-feira, às três da tarde, na mesma hora da morte do Senhor, seus perseguidores tiram-no do chiqueiro, onde estava preso, arrancam à força sua tão amada batina e o arrastam para a floresta.
Muitas vezes penso no medo que como uma lâmina se insinuou no coração dessa criança, e inutilmente pede piedade enquanto os guerrilheiros puxam a faca para torturá-lo e a pistola para matá-lo. No entanto, mesmo num momento como esse Rolando reafirma a Quem pertence a sua vida. Como contaram as testemunhas, nesse último instante ele pede um tempo para rezar por seu pai e sua mãe. Enquanto reza, de joelhos, eles atiram: uma bala na cabeça e outra no coração.
Na escuridão daquela floresta, tudo parece terminado, mas a partir da semente lançada na terra brotam graças inesperadas. A lembrança e a devoção por esse jovenzinho permanece viva entre os familiares, os amigos e todas as pessoas que o tinham conhecido. Até que, em 2001, um seminarista inglês lê no Osservatore Romano um artigo contando a história de Rolando e fica particularmente impressionado. Quando o filho recém-nascido de um jovem casal de amigos fica doente de leucemia e os médicos não veem como salvá-lo, o seminarista escreve ao pároco de San Valentino e pede uma relíquia do jovem mártir. A relíquia, acompanhada de um coro de preces, é colocada sob o travesseiro do menino, no hospital, e ele, surpreendentemente, fica curado.
A notícia da grande graça recebida, que chegou por fax ao pároco de San Valentino, se espalha e rompe o silêncio de mais de 50 anos que cobria o sangue dos cristãos derramado na região emiliana, no chamado “triângulo da morte”, no final da Segunda Guerra Mundial.
NECESSIDADE DE TESTEMUNHAS. Movido por essa notícia, fui a San Valentino e descobri o “tesouro oculto” do testemunho de fé de Rolando. Com um grupo de amigos criamos o Comitê Amigos de Rolando Rivi e tornamos possível, em 2005, junto à diocese de Modena, a causa de sua beatificação.
Dia 27 de março de 2013, o Papa Francisco, entre os primeiros atos do seu pontificado, reconheceu Rolando como mártir da fé, abrindo as portas para a beatificação.
Não é o fim da caminhada, mas um novo início. No encontro com as associações leigas e os movimentos, dia 18 de maio de 2013, Papa Francisco disse: “A comunicação da fé só pode ser feita através do testemunho, e esse é o amor. (...) Quem leva a Igreja para frente são os Santos, pois são eles que dão esse testemunho. (...) o mundo de hoje necessita muito de testemunhas”. Rolando é uma das testemunhas da fé de que nós, a Igreja, e o mundo tanto necessita, para que olhando para ele o nosso coração aprenda a amar Jesus e fazê-Lo amado, como ele O amou e fez amar.
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