Tempos de horror
De que horrores o ser humano é capaz! Começamos 2015 impactados por 12 pessoas mortas por causa de charges que nos parecem pueris e inofensivas. Poucos notaram, mas cerca de 2 mil pessoas foram mortas num ataque do Boko Haram a uma pequena cidade nigeriana que foi praticamente destruída. Do outro lado, em meio a justas manifestações de pesar, protesto e afirmação do valor da vida e da pessoa, assistimos a espantosas demonstrações de insensibilidade para com o outro e de negação de qualquer valor que ajude a compreender esse valor da vida e da pessoa. Intelectuais insuspeitos, chargistas e outras personalidades vieram a público dizer que, em nome da liberdade que se vive no Ocidente, tinham o direito de fazer e dizer o que quisessem, e quem se sentisse ofendido por aquilo que não viesse lhes incomodar. Sem dúvida essas pessoas não incluíam entre seus direitos o de matar a quem se lhes opusesse, mas sua posição cultural mostra uma raiz de insensibilidade, uma espécie de autismo existencial na relação com o outro e com a realidade.
Na verdade, o reconhecimento da existência do outro, uma real abertura ao diferente, um respeito incondicional à sua dignidade e às suas crenças só são possíveis numa postura de amor a este outro. Mas o ser humano não pode dar o que não tem. O amor que damos é um reflexo do amor que percebemos receber. Na sua história, a cultura ocidental pensou que o reconhecimento do valor da pessoa nascia de filosofias antropocêntricas ou de contratos sociais. Não percebeu que tudo isso é o desenvolvimento da experiência de se descobrir amado por Cristo, pelo Pastor que deixa todas as suas ovelhas e vai em busca daquela perdida (que deve ser uma fujona problemática), tamanha é sua importância.
O diálogo necessário neste momento da história não pode acontecer sem que nos encontremos no reconhecimento mútuo daquelas exigências de liberdade, beleza, verdade, justiça, realização que estão em todos os seres humanos. É o que Dom Giussani denominava “experiência elementar”, e lembrava estar na origem de nosso senso religioso. Só a pessoa realmente religiosa, isto é, aberta à sua experiência elementar e à dos demais, pode ser um verdadeiro artífice da paz. Sem essa abertura, nos tornamos escravos da idolatria que gera ódio e divisão – veneramos um falso deus que pede sacrifícios humanos, veneramos a nós mesmos, afundando em uma autossuficiência que não consegue dar sentido e felicidade à vida.
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© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón