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Passos N.166, Janeiro 2015

RUBRICAS

As cartas

UMA PRESENÇA QUE SE FAZ CARNE
Minha mãe veio morar comigo há quatro anos e meio. Tem 89 anos agora e apresenta uma perda cognitiva progressiva e início de Alzheimer. Desde o início, sabia que o Senhor tinha me dado um grande presente, pois cuidei da minha sogra por seis anos e meio e pude aprender a reconhecê-Lo nessa experiência. Como diz no texto do início do ano, é um caminho. Crescemos em amor e Graça! A cada nova exigência Nossa Senhora se faz presente, como aprendi a rezar com minha mãe. Desde as pessoas que vieram trabalhar em casa para ajudar, até meu coração que se tornava sereno em situações difíceis, quando não sabia como agir e, de repente, propor rezar o terço era a alternativa mais plausível para “quebrar o encanto” e tranquilizar minha mãe. Fui aprendendo, concretamente, que meu dia não é meu. Tive que deixar a responsabilidade de várias coisas, pois minha mãe poderia adoecer de repente e teria que socorrê-la. Assim, fui entregando a minha vida nas mãos de um Outro. Nascia uma liberdade como nunca antes. A responsabilidade no trabalho também se intensificou porque não podia deixar nada “para amanhã”. O tempo foi tendo seu “justo valor”! Um milagre! Entendi também que o Senhor me proporcionava um tempo de silêncio, de resguardo. Sempre fui muito ativa no Movimento, e o Senhor me chamava a “decantar”. Permaneci atenta às indicações, como sempre, mas me recolhi. Obedeci. Tinha o juízo do meu coração, critério infalível. A realidade também se impunha com força. Por exemplo, na divulgação de Passos, sempre fui a protagonista aqui na cidade, mas, na campanha do Dia da Revista, disse que participaria, mas não poderia assumir a responsabilidade em primeira pessoa. No domingo combinado, contratei a cuidadora para ficar com minha mãe e eu poder ir às paróquias com o pessoal. No entanto, minha mãe acordou muito mal, tive que correr com ela, agradeci ter a cuidadora para me ajudar, ofereci tudo para o trabalho dos amigos e não fui. Quando meu marido voltou, feliz, contando da venda de todas as revistas, dos encontros realizados, das assinaturas que conseguiram, confesso que tive um aperto no coração. Mas, ao mesmo tempo, vivia uma certeza da Presença que nos carrega de forma tão “carnal” que não podia fazer outra coisa senão agradecer pela preferência do Senhor, por essa História que construímos a cada instante.
Eloisa, Sorocaba (SP)

AQUILO QUE NOS É CARO
Caríssimo Julián, só agora paguei o Fundo Comum – tanto eu como minha mulher estávamos em atraso –, infelizmente precisei alterar a quota mensal reduzindo ambas a um décimo daquilo que, desde nossa inscrição na Fraternidade, sempre demos. Isso porque, já há um ano, estou desempregado e, aos 55 anos de idade não é tão fácil voltar ao mercado de trabalho, sobretudo neste momento de extrema crise. Além disso, também tenho problemas com os efeitos econômicos derivantes do meu trabalho anterior. Antes de tomar essa sofrida decisão, reduzimos e eliminamos todas as despesas supérfluas. Mas, como a situação não mudou e, não sabendo por quanto tempo ainda precisaremos viver com as poucas economias que sobraram, fui obrigado a fazer assim. De qualquer forma, mantivemos a quota, mesmo simbólica, exatamente para nos lembrar que, apesar de tudo, aquilo que nos é caro ainda conseguimos manter.
Carta assinada

AS HORAS PASSADAS AO LADODE STEPHANIE
“A esperança não caminha sozinha. Para esperar, minha menina, é preciso ser muito feliz, é preciso ter obtido, recebido uma grande graça” (Charles Péguy). Uma transferência, duas, três... “Lucy, Stephanie é sua. Quarto 29. O histórico está sobre a mesa”. Nenhuma ajuda, desta vez. A obstetra já foi embora. Começo a folhear as páginas que falam da gravidez, do diabetes, das duas cesárias de emergência que Stephanie fez e de uma interrupção de gravidez, melhor, duas, três, quatro. E a depressão, e a tentativa de suicídio. Todos aqueles dados falam de uma não esperança, de uma não vida, e eu já tinha definido aquela mulher do quarto 29 como uma egoísta, alguém que gosta de brincar com a vida, mas que passou dos limites. É demais. Para mim, tudo isso é demais. “Oi Stephanie, sou Lucy e hoje serei sua enfermeira”. Apresento-me, como faço sempre, mas dentro há uma amargura, uma raiva. Stephanie é um caso complicado. Tem diabetes, e sua glicemia está nas alturas. Entrou em trabalho de parto, mas é muito cedo. É preciso preparar os pulmões da criança e, depois, ela já fez duas cesárias e as contrações precisam ser paradas. Seu caso me pede para ficar ali, para procurar um médico para ela, dar-lhe os remédios, chamar os vários especialistas e explicar a ela o que está acontecendo. Dedico a ela minhas horas, o meu trabalho. E, a um certo ponto, enquanto faço o monitoramento para ver como está o filho que carrega no ventre e que quer nascer apesar de tudo, percebo que estou fazendo isso com amor. Não me esforcei para gostar dela, para tratá-la como todos os outros (ao contrário, o instinto me dizia outra coisa), simplesmente está acontecendo. E aquela frase de Péguy ecoa na minha cabeça. Para esperar, para ser feliz... Uma grande graça. E sorrio para Stephanie porque, ao cuidar dela, descobri que Alguém derrubou a minha medida, o meu preconceito e alargou meu coração.
Lucia, Londres (Inglaterra)

O VÍDEO DOS SESSENTA ANOS
ESTA É A MINHA BELA ESTRADA

Neste ano eu completei 50 anos de vida e sigo o Movimento desde os treze. Graças a essa estrada sou mulher, mãe, filha, professora, amiga. No vídeo dos 60 anos eu me vi descrita quando aparece o começo do dia: em casa, de manhã cedo, tomando o café junto com meu marido e os filhos, que estão na mesma estrada que eu. Depois, a oração do Angelus com meu filho no carro, o rosto dos amigos, o modo com o qual decido sobre as férias, os Exercícios da Fraternidade, quando o caminho é marcado e retomado, o Meeting de Rímini, os lugares distantes no mundo nos quais muitos amigos estiveram... Este é o Movimento. Eu fiquei tão comovida que hoje, antes de qualquer coisa, depois de uma manhã de trabalho na escola e com muitas coisas para fazer, assisti ao vídeo e ele me contou quem eu sou e a quem pertenço; aquilo que farei depois será sinal disso ou pelo menos espero que assim seja. Obrigada, Dom Giussani, que todos os dias sorri para mim na foto que mantenho na sala de jantar, no lugar que mais estamos juntos, porque a sua certeza me conduziu a essa bela estrada e o abraço forte e comovido que você me deu, há tantos anos, sustenta a minha vida diariamente.
Michela, Como (Itália)

“NEM MESMO ESTE PÓ LHE PERTENCE”
Caro Julián, trabalho em uma empresa de limpeza. Com a crise, foram feitas reduções de carga horária. Em particular, o contrato com a Delegacia da minha cidade passou a prever a realização de todas as tarefas em duas horas diárias, ao invés de oito. O que podia fazer era me irritar com quem tinha decidido isso e deixar o local sujo, ou arregaçar as mangas e encontrar uma possibilidade para tornar os locais, pelo menos, habitáveis. Então, no início, intensifiquei meu trabalho porque, para mim, limpar significa tornar belo aquilo que encontro. Os policiais perceberam isso e, por sua vez, começaram a arrumar também. Por exemplo, poliram novamente o chão, colocaram plantas nos escritórios, cortinas nas janelas. Antes da minha chegada, liberam os ambientes para que eu possa limpar melhor e esvaziam os cestos de papel. De onde nasce isso? Lembro- me de um exemplo que Dom Giussani fez a um amigo que se lamentava pelas muitas coisas que tinha para fazer. Disse-lhe, tirando o lenço do bolso e passando-o na mesa: “Nem mesmo esse pó lhe pertence!”. Essa é a razão que me leva a amar o meu trabalho. Quando entro na Delegacia e encontro os policiais, eles são para mim o rosto de Cristo, porque todas as vezes em que vou lá, não é só para terminar o trabalho e poder ir embora, mas para conhecer aquilo que Jesus me propõe. E, portanto, cada dia é uma festa.
Antonella

COMO AS BODAS DE CANÁ
Milagres existem. No final do ano passado, fui pedida em casamento, e logo marcamos a data na igreja: 4 de outubro, dia de São Francisco. A partir do noivado, começou a minha loucura pelo casamento, pois, desde o início, sabíamos que não poderíamos gastar muito. Diante dessa situação, meu pai se ofereceu para pagar o Buffet e emprestou uma casa para que nós pudéssemos morar. Lógico que aceitamos, mas eu ficava preocupada, pois sabia que ele também não tinha muitas condições para isso. O tempo foi passando e eu ficando cada vez mais descrente de que as coisas aconteceriam como sonhei. Em maio, meu pai ficou desempregado e tivemos que restringir as coisas. Confesso que chorei muito e fiquei “brava” com Cristo. Tudo estava dando errado: não achávamos pedreiro para a reforma da casa, meu vestido de noiva não chegava, o dinheiro não dava pra nada, discutia com meu noivo por pouca coisa. Tudo tinha um peso enorme! Faltando pouco tempo para o casamento, comecei a observar minha mãe. Nessa loucura toda, ela rezava todo dia. Então comecei a pedir a Nossa Senhora que me ajudasse a permitir que Deus cuidasse de tudo. E, de fato, Ela me atendeu. Comecei a olhar a realidade que me era dada, me deitei no colo d’Ela e deixei as coisas acontecerem. Logo nossos fornecedores arranjaram preços incríveis, totalmente acessíveis. Meus amigos começaram a nos ajudar e fizeram um chá de casa nova à distância. Achei que fôssemos ganhar pequenos valores, mas todas as vezes em que olhava meu saldo no banco ficava comovida por ver que era exatamente o valor que precisava naquele dia. Enfim, chegou o grande dia, e foi muito, mas muito melhor do que sonhei. Ao entrar na igreja, já fui surpreendida, pois nosso decorador fez mais do que o combinado, e a igreja estava linda, e todas as pessoas queridas estavam lá. Durante o evangelho, eu me comovi, pois tive a certeza de que estávamos vivendo as nossas “Bodas de Caná”, tudo estava sendo dado por Ele de uma forma inexplicável. Cristo realmente cuidou de cada detalhe, da maturidade do nosso sim até a fartura no almoço que oferecemos. Hoje, casada, vivendo na nossa casa nova e olhando toda mobília que nos foi dada, lendo o texto “Não sou quando não estás aqui”, eu me dou conta de que “Cada início é uma ocasião privilegiada para fazer memória do fato de que somos queridos, de que existe Alguém que nos quer agora”. E tenho me sentido querida por Cristo o tempo todo.
Gabriela, São Lourenço (MG)

UMA MARIA QUE BUSCA A LUZ
Recentemente, fui visitar a casa de uma senhora que retirou a filha autista e deficiente mental da instituição onde estava internada havia dezesseis anos para cuidar dela, na quitinete onde mora, num prédio de muitos apartamentos na baixada do Glicério, famosa pela marginalidade, miséria e tráfico de drogas. O Juiz, que depois de aceitar denúncia desta mãe de que sua filha estava sendo maltratada na instituição, agora duvidava que a mãe pudesse, naquela difícil realidade, oferecer mais à moça, e determinou que eu a visitasse para verificar como estava. Lá chegando, a porteira do prédio pediu ao rapaz da zeladoria que me acompanhasse, pois temia que Dona Maria pudesse dar escândalo, pois “é uma mulher esquisita e desconfiada”. Com efeito, chegando ao apartamento, Dona Maria foi logo dizendo que não era cuidadora da filha, era mãe dela, e nenhum estranho entrava na sua casa, pois já haviam levado sua filha duas vezes e não cuidaram bem dela. Dona Maria só cedeu quando falamos que estávamos admirados de como ela protegia bravamente a filha e que éramos amigos do Juiz que tinha mandado entregar a filha de volta para ela. Então, ela abriu a porta, nos fez sentar, ofereceu suco. E contou que nasceu no sertão nordestino, e na sua cidade, quando escurecia, todos iam dormir porque não havia luz, e só havia a penumbra e as estrelas do céu. Dava para ver as luzes da cidade, e ela sonhava um dia morar lá e poder ter luz e não precisar dormir quando o sol se punha. Este foi o primeiro milagre que se lembra de ter alcançado de Deus: um seu irmão, mais velho, que já trabalhava na cidade, mandou dinheiro para ela embarcar para a cidade do Crato. Da penumbra de Barbalha, ela avistava as luzes de Juazeiro do Norte e do Crato, e sonhava morar em Juazeiro, mas no Crato também havia muita luz e estava bom demais para ela. A mãe se segurava e o pai, que nunca chorava, chorou no dia da sua partida. Acha que ele adivinhou o sofrimento que ela viveria. No fim, Dona Maria acabou em São Paulo, sozinha e levando nos braços uma filha portadora de necessidades especiais, morando em albergues. Mostra a foto da filha, com olhar contente e esperto, do tempo em que ficava sempre junto da mãe. Mas a menina era diferente das outras crianças e as assistentes sociais diziam que precisava de tratamento, mas sua mãe não tinha nem onde morar. Só nunca desistia de procurar tratamento para a filha. Até que a levaram para um hospital de loucos no interior, a 171 km de São Paulo, longe da mãe. E a mãe só conseguia visitar quando tinha dinheiro para ir até esta cidade. Cada vez que ia, a menina parecia mais distante e mais triste. Mas gostava de encontrar a mãe. Até que viu, passados dezesseis anos, que a menina, já uma mulher, estava machucada. Deu parte, fizeram exames e constataram que havia sido agredida. Então, insistiu em trazê-la de volta, e conseguiu. Agora não sai mais de casa sem a filha, por medo que a levem de novo. Vai para a escola com a menina e fica lá com ela, até dar a hora de sair. Vai para o posto de saúde, vai fazer compras, vai passear. Sente que a filha, aos poucos, recupera a alegria de viver, e gosta de sair com a mãe, embora tenha se acostumado lá na instituição a só ficar deitada na cama. Como se dedica à filha em tempo integral, só conta com o benefício previdenciário da filha para fazer as compras. E paga a mensalidade e o condomínio da quitinete, que é sua. Só vai poder se aposentar quando fizer 60 anos, daqui a três anos. Aí vai desapertar um pouco mais. Vira para mim e fala solenemente: “Sabia que tem gente que acha que pessoa assim que nem ela (olha para a filha) tinha que morrer, tem gente que olha com raiva para ela, acham que não devia nem ter nascido...”. “Ela não fala, mas eu sei que ela está feliz!” E conclui: “Deus me deu ela para eu aprender a cuidar, como Deus cuida de todos os seus filhos, e primeiro daqueles que mais precisam!” Dona Maria frequenta outra igreja, mas sabendo que preparo jovens para os sacramentos da Igreja Católica, me pede: “Quero que você me apresente ao padre, porque esta minha filha já tem 31 anos e nunca foi batizada. Eu quero dar o Batismo para ela!” E faz um juízo mais claro do que alguns católicos são capazes de fazer: “Eu frequento outra igreja, mas os sacramentos estão na Igreja Católica e só ela é quem pode dar!”.
Toninho, São Paulo (SP)

TENDAS DE NATAL
UM EVENTO DE MUITOS AMIGOS

Neste ano resolvemos inovar o formato das Tendas de Natal, contando também com um maior número de parcerias, que certamente embelezaram nosso evento. Assim, no dia 15 de dezembro, na Pizzaria Zio Totó, da Marechal Deodoro, realizamos uma Grande Noite Italiana. Além da parceria de Rosa e João, os donos da pizzaria, que nos permitiu saborear suas deliciosas pizzas e entrada, contamos com a colaboração de Irene, dona da Gelateria italiana Peccato Divino que preparou deliciosos desserts. O prestigioso grupo musical Del Chiaro (coral e orquestra) executou cantos líricos e também um repertório ligado a tradição musical brasileira, italiana, americana e francesa. Contamos, ainda, com a apresentação da Divina Comédia, de Dante, pelo ator e diretor de teatro José Mauricio Cagno. Outras empresas nos apoiaram também para a elaboração dos convites e para a difusão do evento. A adesão foi ampla de modo que todos os convites foram vendidos, e, além de tudo, foi uma noite marcada por um clima de cordial acolhida, alegria e amizade. Toda a renda foi revertida para a Fundação Avsi, que com os gestos das Tendas no mundo inteiro, está apoiando seis projetos sociais: as creches no Equador; as atividades educativas das escolas no Quênia; a rede de centros nutricionais coordenados pelo CREN de São Paulo; as obras da Custódia da Terra Santa na Síria; e ações de emergência contra o Ebola na Serra Leoa.
Marina, Ribeirão Preto (SP)






 
 

Credits / © Sociedade Litterae Communionis Av. Nª Sra de Copacabana 420, Sbl 208, Copacabana, Rio de Janeiro - RJ
© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón

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