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Passos N.101, Fevereiro 2009

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A história

A dedicatória de Francesco

Cabelos brancos e rosto sombrio. Francesco, naquele sábado, estava assim. Culpa de quem sabe que pensamentos que lhe passavam pela cabeça, enquanto atravessava a porta de vidro arrastando um pouco o passo. Imaginem, então, quando vê os jovens que vêm ao seu encontro, com um colete amarelo e um panfleto nas mãos. Dois rostos desconhecidos. Sorriam. Ele estava ali, apalpando os bolsos, procurando uma moeda, e eles começaram a falar sobre os pobres, as sacolas, a coleta... Francesco nunca os tinha visto antes: “Eu tenho 90 anos e sou aposentado. O que vocês querem de mim?”. Começou a sair, empurrando o carrinho, para fazer as compras. E muitos cumprimentos aos dois chatos não foram ditos, pois só saíam resmungos de sua garganta.
Mas durou pouco: apenas três passos. Foi quando ouviu outra voz sobre seus ombros. “Bom dia. Eu ouvi o que o senhor disse quando entrava... Em suma, queria lhe parabenizar pelos seus noventa anos”. Era um homem, dessa vez. O mesmo colete amarelo e o mesmo sorriso.

UM INSTANTE. UM OLHAR. E na vida de Francesco surge algo imprevisível. Ao invés de se defender, faz uma pergunta estranha: “Quanto é três vezes seis?”. O outro o olha, perplexo: “Dezoito. Por quê?”. “Eu nasci no dia 3 de junho de 1918 (03/06/18). Às dez da manhã, quando os funcionários públicos tomam café”. Começa a falar sobre si. Sobre sua vida. Sobre a família. Os momentos felizes e tristes. “Eu fiquei ali, escutando-o: ele decidiu gastar um pouco de tempo comigo, e eu com ele”, conta Luca, aquele dos “cumprimentos”. “No fim, ofereço de novo a sacola da Coleta de Alimentos, convidando-o a doar algo como gesto de caridade para quem, como ele, está em dificuldade”. Francesco sorri, empurra o carrinho e desaparece entre as gôndolas.
Nós o vemos na saída, com sua doação nas mãos. Vinte latas de feijão e vinte de carne. Procura Luca para entregar-lhe pessoalmente. E diz: “Tenho em casa uma imagem de Nossa Senhora de Lourdes que é importante para mim. Se você prometer tomar conta dela, eu lhe dou”. Imaginem a cara de Luca. “La fora, chovia, fazia frio. Perguntei se ele morava perto. Disse que sim. Eu aceitei”.

DEPOIS DE MEIA-HORA, Francesco voltou. Tira da bolsa molhada uma pequena imagem colada em um cartão. Belíssima. Atrás, uma frase batida a máquina: “Esta Nossa Senhora é a imagem de Deus que se fez Pai Nosso, porque quer nos devolver a liberdade de filhos que o escutam, obedecendo”. E uma dedicatória, escrita a mão: “Para Luca da Coleta, de Francesco”. Um abraço, um beijo, e foi embora.
“Chorei, comovido”, diz hoje Luca, em uma carta: “E contei o que aconteceu a todos os voluntários do meu turno. Porque Ele, antes de se apresentar, não me pergunta se estou pronto ou não para reconhecê-Lo. Apresenta-se, quando quer. E basta”.

 
 

Credits / © Sociedade Litterae Communionis Av. Nª Sra de Copacabana 420, Sbl 208, Copacabana, Rio de Janeiro - RJ
© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón

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