Não é virtude muito comum a gratidão. Certo, ela pode aparecer por causa de um gesto inesperado, por um presente recebido - um fato. Mas, quase sempre, evapora rapidamente. Difícil vê-la durar. Difícil, sobretudo, tornar-se a inclinação com a qual se levanta de manhã e as preocupações cotidianas começam a se mostrar. Ainda mais quando o clima é tenso e ruim. E não é que hoje em dia haja muita coisa que nos deixe serenos, com todas as batalhas que a realidade nos apresenta e das quais vocês encontram exemplos também nesta edição de Passos.
No entanto, se há uma palavra que vemos aparecer em nossa volta continuamente, nas últimas semanas, é exatamente esta: gratidão. Dita, mas, sobretudo, vivida. Basta nos depararmos com certos rostos comovidos depois de ter assistido a uma das missas que lembraram, em todo o mundo, o fundador de CL, dez anos depois da subida ao Céu de Luigi Giussani. Ou, ainda, a participação em um momento histórico para nós, como foi a audiência de 7 de março com o Papa Francisco, na Praça São Pedro. O sentimento mais difuso é exatamente este: gratidão. Não de um, ou de alguns: de um povo. Uma gratidão que “cresce com o passar do tempo”, como disse padre Julián Carrón em uma entrevista, porque quanto mais caminhamos, mais percebemos o tesouro que temos nas mãos.
E, como em todas as coisas que nos dizem respeito de maneira próxima, a experiência não mente. Descobrimo-nos gratos, e não depende de nós. Descobrimo-nos gratos por algo que existe, que é vivo, “cresce com o tempo” e nos fala, hoje. Não é pelo passado.
É preciso olhá-la bem, essa estranha e alegre gratidão que carregamos e que tem uma força tal a ponto de desafiar também o peso do presente, dos tantos dramas atuais. É preciso olhá-la porque não é algo sentimental. Carrega tudo, ainda por descobrir. Contém uma dinâmica tão potente que, quando a percebemos, ajuda a viver.
É grato um coração que espera e que recebe uma graça, agora. E se a gratidão resiste ao choque tão difícil da realidade, isso significa que essa graça é tão preciosa que é decisiva para a vida. É isto o que está acontecendo nestes dias: corações gratos pelo encontro com Papa Francisco na Praça São Pedro, no dia 7 de março. Éramos um povo de 80 mil pessoas reunidas em Roma e milhares de outras espalhadas pelo mundo. Todos mendicantes. Gratos porque a Igreja existe. O Papa existe. E a vida é possível.
Um fato do gênero não precisa de explicações. Assim como, às palavras do Papa, certamente não adianta acrescentar comentários, interpretações, tentativas de fazer “bater as contas” quanto ao risco da autorreferencialidade, quanto ao carisma “que não se deve petrificar” ou à liberdade que não se deve perder, e assim por diante. Seria como colocar uma comporta em uma nascente, em uma torrente de perguntas abertas e frescas. A nós, interessa outra coisa. Queremos aceitar, juntos, esse desafio. Antes de mais nada, olhar para aquilo que aconteceu. Voltar a olhar, para não perder a memória daquele encontro. E percorrer juntos o novo caminho que pede a cada um de nós, pessoalmente.
Por isso, a revista que você está folheando não e uma homenagem ao passado: é um convite para olhar um Fato presente. Algo que julga tudo: as manifestações, as guerras, a cultura... Alguém que ilumina a vida. Porque venceu a morte. Boa Páscoa.
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© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón