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Passos N.168, Abril 2015

DESTAQUE - AUDIÊNCIA 7 DE MARÇO

Aconteceu

por Alessandra Stoppa

A espera, os cantos, a festa. E, inesperadamente, o irromper de uma presença que derruba todas as imagens. Deixando cada um dos oitenta mil presentes na Praça com uma pergunta sobre o que havia acontecido ali


A cantora entoava o canto em inglês, I wonder as I wander... out under the sky…, e, de repente, as vozes e as notas ficam suspensas. Tudo para e os olhos de oitenta mil pessoas se voltam para a imagem que apareceu inesperadamente nos telões. Está aqui! Todos o esperavam, mas o Papa chegou meia hora antes do previsto e é uma surpresa que transforma a Praça. Diante do sagrado, todos ficam em pé nas cadeiras, o maravilhamento toma a multidão como uma onda e até na rua da Conciliação uma única voz entoa com força: Ho um amico grande grande!... É a explosão de um povo por causa de um homem. Um único homem, que é como eu e você, mas o fato de existir faz sentir que tudo é verdadeiro, que a fé é verdadeira e é verdadeira a vida, cada manhã, trabalhar, estudar, sofrer, educar os filhos, amar.

Zaqueu. A primeira audiência do Movimento Comunhão e Libertação com o Papa Francisco pode ser sintetizada neste momento. A carta que padre Carrón enviou ao Movimento como preparação para a ida a Roma explica o que está acontecendo diante dos nossos olhos: tudo tem “consistência no vínculo com a fragilidade de uma única pessoa”. Como Zaqueu, várias pessoas subiram em postes no meio da praça enquanto o papamóvel fazia um longo percurso entre milhares de mãos estendidas à sua passagem. “Não fui deixada só”, pensa Barbara, de 26 anos, enquanto a multidão aplaude, canta, agita os livretos: “Cheguei aqui irritada por várias coisas, mas tudo mudou quando o vi”.
“O acontecimento de Cristo alcançou também a nós, pobres coitados. Chega para preencher a ânfora vazia do nosso coração. Peçamos que encontre em nós a mesma acolhida que encontrou em Nossa Senhora”. As palavras de Carrón no início do gesto acompanharam a espera das pessoas que, desde muito cedo, tinham lotado a praça, vindas de todas as partes do mundo (47 países) e com diversos meios de transporte. Depois, a oração das Laudes, o vídeo e as palavras de Giussani, os cantos de uma beleza luminosa, como o clima daquele dia, da Ave Maria em chinês à Zamba argentina dedicada a padre Francisco. “Não há outro Cristo a não ser aquele que aconteceu a Maria”, continuou o responsável do Movimento: “Desde aquele momento não há outra Maria a não ser aquela definida pelo chamado de Cristo”. É a mesma coisa que acontece agora diante da presença do Papa, do pedido urgente de Carrón, da comoção de todos pela vida de Giussani, pelo caminho “profundamente humano” que esse homem percorreu para si e para dá-lo a todos, e pela proximidade, pela identificação do Santo Padre com aquilo que o Movimento vive.
“O lugar privilegiado do encontro é o meu pecado”, disse em seu discurso: “Só quem foi acariciado pela misericórdia, conhece verdadeiramente o Senhor”, conhece aquilo que nos foi doado novamente, aqui, com ele. O perdão de hoje. Disse que sempre ficava parado diante do quadro Vocação de Mateus, de Caravaggio. O mesmo olhar de Jesus, que chega como o Papa na Praça, enquanto você ainda segura o dinheiro em uma das mãos, segura aquilo que não consegue dar, enquanto erra ou enquanto tenta acertar, ou enquanto sequer tenta. “Ele vem e nos convida”. Vem e nos escolhe, agora, para segui-lo. “Quando nós chegamos, Ele já estava esperando!”, diz, forte, o Papa. Jesus é a amendoeira que floresce antes e, segui-lo, faz a vida florescer.
Depois de dizer que Giussani fez bem “a mim e à minha vida sacerdotal”, o foco é sobre o encontro: “Tudo, na nossa vida, começa com um encontro”. O encontro com o carpinteiro de Nazaré, “um homem como todos e, ao mesmo tempo, diferente”. Fala sobre como os primeiros discípulos se sentiram olhados, “profundamente conhecidos” e como isso os fez sentir-se “imediatamente ligados a ele”. O sim de Pedro, e o nosso, nasce somente disso: “A moral cristã é uma resposta comovida”.

Única tarefa. A ajuda pedida por Carrón como um filho “para que não deixemos esmorecer o frescor do carisma” encontra a orientação segura de Francisco: o Papa não dá por óbvia a vitalidade que “o carisma originário não perdeu” e provoca o caminho do movimento, da vida pessoal: “Sejam livres!”. Dos fechamentos, do próprio pertencer, dos hábitos, das decisões já tomadas. Das cinzas, quaisquer que sejam, às quais todos são apegados. “Aprendam de todos”, escutem quantos não são como vocês: “O cristianismo é princípio de redenção, que assume o novo, salvando-o”, dirá no fim, citando Giussani. Francisco pede com forçapara sairmos de nós, para nos descentrarmos: “No centro, há apenas um: o Senhor”. Há o amor, isto é, “aquilo que vem de Deus”. E a tarefa é apenas uma: “Adotar integralmente a lógica de Deus”, essa misericórdia que tem por nós. Uma misericórdia surpreendente, imprevisível, até “injusta” segundo os nossos critérios: “É Alguém que me conhece, conhece as minhas traições e que, no entanto, me ama, me estima, me abraça, me chama de novo, espera em mim, espera algo de mim”.
Antes de encerrar, pedindo que todos rezem por ele, retoma outra citação de Giussani: “O gênio do Movimento que vi nascer consiste em ter sentido a urgência de proclamar a necessidade de voltar aos aspectos elementares do cristianismo, ou seja, a paixão pela verdade cristã como tal nos seus elementos originais: só isto!”, diz com veemência. Depois, a Bênção e a saudação a alguns responsáveis e amigos do Movimento de todo o mundo e também de tradições e credos diversos. O Papa abraça um grupo de presos e acaricia, abençoa e beija uma menina com uma predileção única, tão única a ponto de tocar as necessidades de todos. Enquanto isso, o povo se encaminha lentamente para a saída da Praça, ainda atordoados pelo bem inesperado: “Mas, o que aconteceu?”, diz Lucia com poucas palavras e um sorriso radiante.

Novo início. No coração, grandes perguntas, que não podem esperar e são compartilhadas com os amigos enquanto a colunata se esvazia. Despedidas e abraços, as últimas fotos e o pensamento nas palavras do Papa que ferem e abrem o desejo de André por um caminho que começa, que recomeça: “Ele nos disse tantas coisas, quero entrar nelas. Quero vivê-las”. Para Alberto, foi a primeira vez, o primeiro encontro com o Papa. Tem 45 anos e chorou o tempo todo como uma criança, atrás dos óculos escuros. Por quê? Giussani respondeu, em um dos vídeos, falando do encontro de João e André com Jesus: “Meninos, isso, sem muitas sutilezas, aconteceu”.

 
 

Credits / © Sociedade Litterae Communionis Av. Nª Sra de Copacabana 420, Sbl 208, Copacabana, Rio de Janeiro - RJ
© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón

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