Jovens colegiais provenientes de todo o país se reuniram em Guapimirim, no Estado do Rio de Janeiro para um momento de férias. Entre 18 a 21 de julho, a alegria dos jogos, a surpresa dos testemunhos, a festa, a vida
Um novo início. Assim podemos nomear o momento que o grupo dos colegiais de Comunhão e Libertação do Brasil está vivendo, uma vez que, devido à Jornada Mundial da Juventude e à Copa do Mundo, desde 2012 não havia um gesto nacional com eles. Por isso, todos os estudantes, à exceção de dois de São Paulo, estavam pela primeira vez participando desse gesto. Esse foi o motivo pelo qual a professora Sêmea Assaf, responsável nacional pelos educadores e pelos colegiais, escolheu o verso de Vinícius de Morais para tematizar nossa aventura: A vida é a arte do encontro. “Viemos aqui pra quê?” , provocou- nos ela. “Como faço para viver verdadeiramente? O papa Francisco disse que ‘temos jovens que vivem tudo, mas não choram diante da realidade...’. Como é viver a vida verdadeiramente? Eu choro? Quem sou eu? Muitas vezes tenho medo de mostrar quem sou de verdade. Posso passar para os outros uma imagem de mim, ou posso ser eu mesma”. Essas foram as questões que nortearam os quatro dias, vividos com muita intensidade pelos jovens e pelos educadores.
A tônica do encontro foi a obediência, apesar de esse tema ter sido enfrentado somente no domingo à tarde, numa roda de conversa com o nosso responsável nacional, Marco Montrasi (Bracco). Impressionou a todos a maneira simples, objetiva e verdadeiramente obediente, com que os meninos seguiram as indicações: o silêncio nos quartos à meia noite, as tarefas da gincana disputadíssima, o silêncio na caminhada. Tudo vivido dentro de uma liberdade que nos educou. Isto porque, quando se trata de adolescentes, a tendência é a transgressão. No entanto, não foi uma obediência cega, mas cheia de razões, conforme testemunham Lorena e Rodrigo, de Brasília, respectivamente: “Gostei do fato de ter horários para seguir. No início pensei em não seguir, porque não sou acostumada a ter uma organização assim. Mas, depois, procurando seguir aquilo que era indicado, percebi que pude aproveitar mais o tempo, que fiz muito mais coisas do que imaginava”. “O que mais me marcou foi uma ordem e uma disciplina que vi aqui e que eu não conhecia. E aprendi com isso”.
Hamilton, de Salvador, comentou que se tivesse parado nas imagens que os colegas colocaram em sua cabeça, teria perdido “a melhor parte”. “Pensei que a caminhada seria uma baderna, que todo mundo iria falar muito, inclusive eu. Fui surpreendido pelo silêncio, que me impressionou. O que mais me marcou foi a unidade entre nós. Juntos, vendemos a cesta de chocolates para me ajudar com os gastos das férias. Meus amigos da escola, disseram-me que eu não seria acolhido, porque sou negro, pobre e que paulista não gosta de baiano. E o que vivi aqui foi o contrário disso. Fui totalmente acolhido aqui; fui acolhido assim como sou”.
Além de Hamilton, muitos tiveram que trabalhar para poderem participar das férias. Lucas, do Rio de Janeiro, ficou impressionado com isso: “Fiquei marcado com os esforços que as pessoas tiveram que fazer para estar aqui; vi uma união também ”.
A vitória da gincana foi da equipe vermelha, denominada por seus participantes de Hemácia. De fato, o grupo deu o sangue em todas as disputas, mas a beleza foi vê-los se lançar nas brincadeiras mesmo não havendo um prêmio ao final. As equipes branca (Encontrão), verde e azul (Smurfs), comemoraram suas classificações como se fossem os primeiros, porque, como afirma Laryssa (Brasília): “Vi que o fato de ter dividido as pessoas para as equipes da gincana nos ajudou a não ficarmos presos ao grupo da própria cidade e ajudou a conhecer outras pessoas”. Amigos em grupos diferentes, namorados em equipes diferentes..., contudo, nada tirou a vontade de vencer. Falando das brincadeiras, Sêmea explicou que “a maneira como nos lançamos no jogo evidencia a maneira como nos lançamos na vida. Por isso, observem-se em ação”.
O despertar por um encontro. No encontro com Bracco, as palavras obediência, liberdade e felicidade, nortearam toda a conversa. Sentados no gramado, embora relaxados, não deixaram de comparar a experiência que faziam de serem “si mesmos” – como propôs Sêmea –, a dificuldade que têm na escola, onde “nada me toca o coração”, declarou Letícia (SP).
Com essa provocação, Bracco respondeu: “Quando eu tinha a idade de vocês, tudo me dava tédio, até o cheiro da comida de minha mãe. Eu ia atrás das meninas e de tantas outras coisas, mas nada me tirava o tédio. Porém, um dia, ouvi uma pessoa falando de João e André (os primeiros que encontraram Jesus). Falava deles de uma forma que era como se eu estivesse lá, junto com eles; como se eles tivessem a mesma busca que eu. As palavras daquele homem que falava começaram a “pular” dentro de mim. Voltei para casa com o desejo de saber mais sobre Dom Giussani, que falava assim. É como quando a gente se apaixona por uma menina: uma correspondência com aquilo que o coração espera. Então, comecei a ir atrás daquelas pessoas que viviam assim. Hoje, a minha busca continua, mas é uma busca que me faz acordar de manhã diferente; não tem mais o tédio. Espero que vocês tenham essa falta que eu tenho. E quando fazem um encontro como esse, vão voltar para casa e perceberão que têm ainda uma falta, mas já sabem que têm que procurar, porque tem alguém que os espera. Tem sempre pessoas que nos fascinam; então vamos atrás dessas pessoas que já vivem assim”.
Na noite de domingo, os adolescentes puderam conhecer quem é Dom Giussani, o fundador de CL que morreu em 2005, de quem Bracco nos falou, e como foi aquele encontro de João e André com Jesus. A mostra “Da minha vida a vossa”, sobre Luigi Giussani, foi apresentada maravilhosamente pelos colegiais de Petrópolis, que confrontaram cada painel com a sua experiência, como explicou Luiza (Petrópolis): “O Movimento começou com Dom Giussani dando a sua vida a Cristo, por isso, no liceu Berchet, começou a fazer os encontros (Raio) com os alunos. Então tudo começou com a vida dele, e agora nós estamos aqui, nas férias, e, eu, por exemplo, já estou há um tempo com a Inês, fazendo Escola de Comunidade”.
A escolha de alguns. A assembleia de fechamento das férias aconteceu na terça pela manhã e todos se sentiram provocados pela pergunta de Cecília (SP): “Eu tenho uma professora que não acredita em Deus, que vive uma falta grande. Por que eu estou aqui e ela não?”. Sêmea, então, nos fez pensar no método de Deus: “Jesus se manifestou para muitos, chamou alguns, preferiu alguns para chegar aos outros. O que vai provocar a sua professora é a forma com a qual você vive o estudo e se relaciona com os outros”. Letícia (SP) tinha o mesmo grito: “Fiquei provocada pelo que o Bracco falou sobre a obediência, de saber qual é o desejo do meu coração, o que é certo e o que não é. Aqui, pude aprender o que é uma experiência verdadeira e qual é a importância de ficar perto das pessoas adultas que são referências para nós, como o Ronaldo, a Mônica e o Iverson [Educadores de SP]. Porque é difícil viver dessa forma sozinhos. Também fico provocada com o fato de que, eu estou aqui contente e, num lugar perdido da África, tem pessoas que não conhecem CL. Eu não consigo aceitar isso, eu choro por causa disso, eu sofro com isso”.
E Inês – educadora de Petrópolis – contestou: “É bonito isso que você está nos dizendo e devemos, sim, nos comover com as dores do mundo, Letícia, mas o Papa Francisco está nos dizendo para irmos à periferia. E a periferia é também a sala de aula. Precisamos fazer companhia para as pessoas. Viver assim, com um incômodo, dá trabalho, mas temos que olhar para isso. A Caritativa é um gesto que nos ajuda a viver isso. É preciso observar aquilo que me leva à verdade. Se eu não tivesse encontrado o Movimento, seguido e obedecido, não saberia olhar para as pessoas com essa abertura. E qual é a fonte onde bebo para continuar a seguir? São os instrumentos que o carisma nos oferece: Escola de Comunidade, Caritativa, Fundo Comum e a companhia; é preciso colar nos amigos”
Um caminho que continua. Assim, voltamos para casa – tendo aprendido que obedecer é seguir alguém que ama a minha liberdade, como experimentamos nesses dias e conforme nos disse Bracco: “É verdade que podemos ter conceitos diferentes de liberdade, mas, e quando você faz alguma coisa que não gostaria e, no final, você respira, isso lhe liberta? Assim, você descobre novos conceitos, como, por exemplo, que ser livre não é quando você escolhe como viver cada coisa; essa é uma liberdade parcial. Porque não é verdade que ser livre é não ter vínculo com alguém! Assim, obedecer é conhecer a estrada que lhe indica algo que lhe faz feliz”.
Essa foi a experiência feita por Clara Letícia (Belo Horizonte): “As férias dos colegiais ocorreram de uma forma inesperada. Primeiramente, nem pensava em ir, pois estava afastava do Movimento e nem tinha muitos amigos lá, porém por vários fatores, como a minha fé cristã e com a ligação da Rita (Educadora do Rio), repensei minha escolha e resolvi ir. Resolvi, então, me entregar completamente e as consequências disso foram incríveis. Assim, percebi que precisava de uma ajuda para voltar a ter esse desejo que eu via em muitas outras pessoas”.
Agora, em suas cidades, educadores e colegiais são convidados a se lançarem numa amizade sem fim. A Escola de Comunidade é o lugar em que a aventura das férias pode continuar...
Abaixo, algumas cartas com depoimentos de jovens que participaram deste momento:
As férias dos colegiais foram a maior surpresa e alegria que já experimentei no Movimento, sendo filha dele, tendo nascido nele. Eu estava com um grande receio de ir às férias, pois achava que ficaria excluída pelo meu jeito diferente de ser, mas foi exatamente o contrário. Quando cheguei, foi como uma explosão de amizade, de pessoas querendo ser elas mesmas e abertas para tudo, para a experiência que queriam fazer ali. Em um dos cartazes da exposição da vida de Don Giussani, que os meninos de Petrópolis fizeram, o título era "viver intensamente o real"; acho que, nessas férias, eu vivi intensamente o real. Eu disse para mim mesma, brincando, que ia ficar com a fitinha verde da minha equipe nas brincadeiras para me lembrar da esperança (verde é a cor da esperança) que eu tinha de viver sempre assim, como eu vivi nas férias. Mas depois falei comigo assim: o meu coração já tem esse desejo, já tem esse infinito, ele já é infinito e que eu não preciso de nada além dele para me lembrar do desejo de viver verdadeiramente.
Clarissa, Belo Horizonte (MG)
As férias dos colegiais foram uma das experiências mais marcantes do Movimento que já tive. Nos outros acontecimentos que envolviam o país inteiro, não estava de coração aberto para viver por completo e, assim, se tornava uma coisa banal. Mas antes de ir para as férias, percebi que precisava aceitar as coisas, dizer sim. Este foi o desafio que levei para lá. Surpreendendo a mim mesma, consegui viver tão intensamente que isso despertou em mim um desejo de querer sempre mais. E a partir disso, consegui me abrir e mostrar para os outros o que eu sou. Como consequência, fiz amizades que espero levar para a vida toda.
Ana Rita, Belo Horizonte (MG)
Nas férias, ouvi dizer sobre o não ter medo de ser si mesmo, que ali era o local onde poderíamos ser nós mesmos. Ao ouvir aquilo, pensava a princípio que aquilo não dizia nada a mim, mas, ao transcorrer, fui me observando tímida e vendo que tinha pontos em mim a serem olhados. Fui me abrindo e oferecendo a Jesus o meu jeito, minha natureza, e lá, com todos, fui me percebendo no meu espaço, com os meus, graças a Presença d'Ele, do Senhor que movimentava e fazia todas essas coisas em mim e fora de mim. Sentia que Ele fazia tudo na gratuidade para nós, que não precisava muito esforço, apenas uma atenção e uma docilidade às propostas feitas. Vi Cristo nos meninos, na forma como brincavam e se acolhiam e me dizia: Esta é a família de Deus, isso é a verdade para todos! A amizade e as conversas com alguns amigos Memores Domini fez muita diferença na forma como olho e olhava Cristo comigo. Saí das férias com uma esperança, uma graça, uma abertura e atenção a um novo de Cristo para minha vida.
Isabella, Salvador (BA)
Eu saí de casa desanimada, mas chegando às férias gostei muito. No ano passado, eu sempre perguntava para o meu pai: “eu já sou colegial?, quando é que eu poderei participar das férias dos colegiais?”. Fiquei muito impressionada com a ajuda que me deram quando prendi o pé em uma pedra durante a caminhada. Também a questão dos horários me marcou, porque sou a pessoa mais desleixada e desorganizada que existe. E na primeira manhã nas férias fui a última a acordar. Depois vi que acordar aqui às 8 horas da manhã é bacana, porque, mesmo acordando cedo, acordo sorrindo, contente. Em casa, acordo ao meio dia, porém triste e de mal humor.
Laura, Brasília (DF)
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