Passos N.178, Março 2016

EM FOCO

A misericórdia e a "casa comum"

A medida que o Jubileu Extraordinário da Misericórdia avança, vamos descobrindo a beleza e a grandeza deste amor misericordioso por nós. Olhando para o Papa Francisco, vamos nos dando conta de como a consciência da misericórdia orienta sua vida e se torna um critério decisivo ao julgar a realidade. Em 2015, ele sacudiu o mundo com sua encíclica Laudato si’ (Louvado seja) que, surpreendentemente para nossa cultura, também é uma reflexão que se tornou possível à luz da misericórdia.

A natureza nem sempre nos parece dar motivos para louvar a Deus. Enchentes e secas, terremotos e furacões, a inclemência do clima e as doenças não parecem ajudar nesta direção. As catástrofes provocadas pelo homem, como o rompimento da barragem da Samarco em Minas Gerais e o medo do mosquito Aedes aegypti com proliferações mal controladas pelos órgãos de saúde e pela população, tendem a nos provocar mais raiva de governos e poderosos do que louvor a Deus.

Testemunhando a misericórdia em sua vida, o Papa tem nos mostrado o segredo oculto de seu olhar pela natureza, que combina louvor, consciência tanto dos fenômenos naturais quanto das mazelas humanas, responsabilidade e empenho por mudanças. Como explicou em sua entrevista a Andrea Tornielli (O nome de Deus é Misericórdia. São Paulo: Planeta, 2016), seu lema "Miserando atqve eligendo" pode ser traduzido como “Tendo misericórdia, o escolheu”. É o testemunho de um homem que não foge da consciência dos próprios pecados, da própria limitação, mas não se detém em seus limites, pois acima disto vê o amor de Deus por ele e, consequentemente, por todos os seres humanos e toda a criação.

Por isso pode escrever, na Laudato si’ (nº 77): “A criação pertence à ordem do amor. O amor de Deus é a razão fundamental de toda a criação. [...] Cada criatura é objeto da ternura do Pai que lhe atribui um lugar no mundo. Até a vida efêmera do ser mais insignificante é objeto do seu amor e, naqueles poucos segundos de existência, Ele envolve-o com o seu carinho”.

A Campanha da Fraternidade Ecumênica de 2016, cujo tema é “Casa comum, nossa responsabilidade”, nos dá uma nova oportunidade de rever nossa relação com a “casa comum”, à luz desta misericórdia que nos apresenta toda a criação como dom de um Deus carinhoso que nos ama e perdoa, mas também nos pede o empenho responsável para sua conservação e para a construção do bem comum.