Há muita discussão no mundo, e entre os cristãos. Às vezes chega-se a brigar. Acontecem divisões que duram séculos. Depois algo acontece. E caem barreiras que pareciam intransponíveis, encaixada como estão nos meandros da história e da política. Como aconteceu em Cuba, em fevereiro, com o abraço surpreendente entre Papa Francisco e Kirill, Patriarca de Moscou e de toda a Rússia: em um milênio, nunca havia ocorrido algo assim.
Outros eventos impensáveis se seguiram a este, como o encontro entre Raúl Castro e Barack Obama, que agradeceram ao Papa pelo papel decisivo na retomada de contato entre Cuba e Estados Unidos. Nenhum analista geopolítico poderia prever isso. E, no entanto, aconteceu. E, por isso, colocam perguntas. Uma mais forte: o que tornou isso possível? De onde nascem fatos assim, que origem têm? Como pode florescer – ou reflorescer – uma unidade que parecia impossível para a história?
Não podemos dar respostas prontas. Será necessário dar tempo e espaço. No entanto, ficamos marcados ao perceber que um instante após aquele abraço com Kirill, enquanto o mundo começava a vasculhar a Declaração conjunta que surpreendeu a todos, Francisco exclamou: “Falamos como irmãos, temos o mesmo Batismo”. Eis para onde olha o Papa. O mesmo Batismo: Cristo. O mesmo critério para enfrentar o real: a fé. O encontro nasceu dali, da volta ao Essencial.
Então, a quem nos lê – há anos ou pela primeira vez – não temos outra coisa a propor além do rosto de Cristo. E a vida que nasce quando se tem o olhar fixo n’Ele. Uma vida que interpela, inquieta, comove. Porque esse Presença introduz “um modo subversivo e surpreendente de viver as coisas habituais”, como disse uma vez o próprio Dom Giussani. Uma plenitude que faz respirar sempre, viver em todos os lugares, enfrentar com letícia qualquer situação.
Um exemplo é o que vimos na América Latina. Que diferença faz o cristianismo, que ajuda pode dar à vida em um contexto difícil, duro, talvez mais do que muitos outros? Um contexto que é rico de preocupações, de medo de perder uma tranquilidade que oscila sob os pés, cheio de feridas, dores, dramas. Um contexto no qual a “tranquilidade” quase não existe mais. Quer se trate da violência quotidiana de certas zonas do México, da pobreza iminente que asfixia a Venezuela, da miséria das favelas de Buenos Aires, da difícil situação política no Brasil, a vida que aperta e desafia, sempre. Então, o que podemos aprender olhando para este mundo? O que podemos descobrir do Papa, da fé e de nós mesmos? É uma questão urgente, porque não há fato mais decisivo para a vida do que encontrar alguma coisa – alguém – capaz de abraçá-la toda, em todo o seu drama. Mas é ainda mais urgente agora, devido aos tempos que vivemos.
Pouco antes de finalizar esta edição assistimos ao drama de Bruxelas. Novamente sangue e terror no coração da Europa. Em uma carta ao jornal italiano Corriere della Sera, Julián Carrón, guia de CL, colocou uma pergunta que provoca a todos: “Como poderemos olhar para estes acontecimentos, como homens, sem sucumbir à desorientação ou à raiva? Apenas se não bloquearmos toda a urgência de um significado, de um porquê (...).Quanto mais lancinante é a dor, mais desmedida é a pergunta que sentimos em nós”. Indicando um ponto para onde olhar: a Páscoa, ou seja, a misericórdia de Deus. Ali “Cristo oferece-se como resposta à altura da pergunta desmedida de um porquê e, ao mesmo tempo, comunica-nos aquela energia sem a qual não podemos recompor-nos”. É isso o que podemos aprender. Olhando para aqueles que já vivem assim.
Credits /
© Sociedade Litterae Communionis Av. Nª Sra de Copacabana 420, Sbl 208, Copacabana, Rio de Janeiro - RJ
© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón