Uma Babel de línguas nos levou a conversar até por meio de gestos. A maioria não se conhecia dentre cristãos e não cristãos, que chegaram aqui das mais variadas maneiras. A impensável unidade vivida nos Exercícios da Fraternidade na China: “Uma intensidade de alegria jamais vista”
Sábado de manhã, oração das Laudes. A assembleia está um pouco hesitante. Todos, com os olhos fixos no livreto, tentam acompanhar a oração, mas para alguns a leitura dos Salmos é uma novidade total, para outros o reto tom, nunca escutado antes, é difícil de seguir. É o primeiro dia dos Exercícios da Fraternidade na China. Cinquenta pessoas de várias nacionalidades, diferentes idades, que chegaram na noite anterior vindas de todas as partes do país e que no trabalho, na universidade, através de um amigo ou do namorado, encontraram uma novidade de vida inesperada. A ponto de comunicá-la a amigos e parentes e convidá-los para os Exercícios. Cada um tem uma história diferente. Um não é cristão, outro, ao contrário, vive a experiência do Movimento há anos e se mudou, por motivo de trabalho, para o País do Dragão.
Depois das Laudes, a primeira meditação, em chinês, que fala da história do “sim de Pedro”, torna concreto o título destes Exercícios: “Eu te amei com amor eterno, tive piedade do teu nada”. O silêncio é profundo. Ouve-se apenas um leve murmúrio nos cantos da sala por causa da tradução simultânea em italiano e espanhol, e de última hora, também em inglês por causa de amigos que chegaram no último minuto.
O almoço é uma Babel de línguas onde, porém, todos tentam se comunicar para se conhecerem e, se não encontram palavras, usam gestos para isso. Não se sentem estranhos, algo aconteceu, tanto que alguém diz: “Sinto-me em casa, em família, no entanto nunca tinha visto antes a maior parte dessas pessoas”. Há algo a ser descoberto.
Futura esposa. À tarde, depois do silêncio, há um tempo para aprender os cantos e o reto tom. É um gesto que anima e une, ajudando a dar um passo a mais. Depois, no testemunho que padre Julián Carrón leu em Rímini, de um presidiário, a Misericórdia se torna abraço. É o motor que move a vida. E continua à noite, quando Piero e Madalena, italianos que moram na China por causa do trabalho, contam o que quer dizer concretamente apoiar-se na amizade em Cristo com sua família e os que estão perto deles. Com os professores dos filhos e com os vizinhos. Madalena conta sobre uma mãe budista que vivia com o companheiro há anos e decidiu se casar dizendo-lhe: “Quero ter a mesma seriedade que vocês têm no seu relacionamento de marido e mulher”. Pediu que ela escolhesse um texto para ler durante a cerimônia civil. Madalena escolheu um trecho do Papa sobre o amor. Alguns dias antes do casamento, surge uma dúvida: talvez seja muito “católico”, e o lê para a futura esposa. Esta começa a chorar e diz: “Não poderia ouvir nada mais bonito no dia do meu casamento. Você precisa me ajudar na busca da minha espiritualidade, preciso de alguém que me acompanhe porque eu procuro Deus e vejo em você uma companhia para a minha busca”.
O tempo não é suficiente. No domingo de manhã, as Laudes e, depois, a missa, são muito diferentes do dia anterior. Algo aconteceu. A Assembleia da tarde é a testemunha mais clara disso. Xiao Mei contou sobre uma colega, Wang Min, com quem logo sentiu uma grande afinidade e não apenas em relação ao trabalho. Até que esta lhe disse que era católica e acrescentou: “Depois do Batismo senti-me um pouco abandonada, mas encontrei um lugar onde vivo e sou acompanhada na minha fé. Venha conhecer”. E a convidou para a Escola de Comunidade. Xiao Mei foi e imediatamente aconteceu um novo início que não pôde manter para si e, assim, convidou uma amiga e a mãe para estes Exercícios. A mãe veio porque via a filha voltar dos encontros de Escola de Comunidade muito feliz e queria entender por quê. Quando chegou, vendo pessoas de nacionalidade, idade e cultura tão diferentes ela, uma camponesa do norte da China, temeu sentir-se deslocada. No entanto: “Desde que me batizei, pouco depois de minha filha, percebi que a minha vida é mais rica, e faço mais experiência disto agora do que nos meus sessenta anos de vida. Nestes dias, dei-me conta de que na realidade temos uma linguagem superior à da palavra: a do olhar. E sinto que, agora, estou exatamente onde devo estar”.
Pedro e Rosa mudaram-se da América Central para a China para estarem com a filha. Não são mais tão jovens: o chinês é uma língua desconhecida e sabem poucas palavras em inglês. Sentiam-se sozinhos e estrangeiros, sobretudo quando a filha precisou passar um longo período no país de origem e eles ficaram ali. Depois, na missa, conheceram um padre e começaram uma amizade com ele. “Ele nos convidou para a Escola de Comunidade e sempre tinha o cuidado de que houvesse um tradutor. Vivemos uma experiência de fé e de companhia que nunca tínhamos vivido”.
Também está presente nestes Exercícios uma pessoa que, ao contrário, foi à Escola de Comunidade para agradar o namorado. “Estava relutante”, conta Yue Liang: “Nunca gostei de reuniões. Mas, ali, conheci Piero e Madalena e sua família. Eram realmente felizes. Eram diferentes dos meus colegas com os quais, no fundo, me sentia bem. Uma intensidade de alegria jamais vista, e que eu não queria perder”. Não desiste e volta, mesmo sem o namorado. “Sentia toda a dramaticidade da escolha que estava para fazer: casar-me e compartilhar a minha vida com ele. E no diálogo com esses amigos vi o que meu coração, talvez de modo confuso, desejava: construir um lugar de paz e de alegria. Se não, por que vale a pena se casar?”.
Os testemunhos continuam. Mas o tempo não é suficiente para todos. Depois de uma hora e quarenta é preciso encerrar e a Assembleia termina com a projeção do testemunho de Agostino Jiang na apresentação do livro do Papa O nome de Deus é misericórdia. É um ex-detento chinês que se converteu na prisão de Pádua, na Itália.
Os passos de Li Wen. Quem não consegue falar, escreve seu testemunho. Como fez Li Wen, uma amiga ateia. Na primeira vez, foi à Escola de Comunidade por insistência de um caro amigo. Porém, a impressão foi negativa: pareceu-lhe uma sessão de terapia em grupo. E ela, que não tinha problemas, certamente não precisava disso.
Porém, depois voltou porque – escreve – “fiquei curiosa em entender por que insistia. Com o tempo, fui me sentindo cada vez mais à vontade. As pessoas compartilhavam suas dificuldades cotidianas e não me parecia mais uma coisa ridícula ou embaraçosa, pelo contrário, parecia-me maravilhoso ter essa preocupação e cuidado consigo. Entendi que a religiosidade é algo misterioso, que não é fácil explicar. Gostei quando ontem, durante a meditação, foi dito que Misericórdia é Mistério. São conceitos que encontrei somente aqui e tenho muito interesse em conhecer e assimilar. Quanto mais entro nessa religiosidade mais entendo minha humanidade. Compreendo que através de uma alegria nova Deus está me ajudando a caminhar e faz com que seja mais simples para mim enfrentar a realidade cotidiana. Aprendi que Deus é bom e é companheiro da minha alma. A Escola de Comunidade é uma coisa boa para mim, não só por causa dos amigos excepcionais que encontro, mas porque sinto e conheço mais a minha humanidade”.
No encerramento do retiro, as pessoas se despedem como se já se conhecessem há muito tempo e não há apenas dois dias. Ou, mais simplesmente, pessoas que viram algo grande para ser compartilhado para sempre.
APROFUNDAMENTOS
> “Como os Atos dos Apóstolos”. Reportagem sobre a comunidade de CL na China
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