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Passos N.187, Dezembro 2016

VIDA DE CL | FÉRIAS

A Beleza por trás da beleza

por Carol Prates | Fotos de Cesare Simioni

A exuberância da Chapada Diamantina. Lugar privilegiado para se perguntar sobre o Criador daquelas paisagens únicas. E daquela amizade imprevista


Durante quatro dias, a cidade de Mucugê, na Chapada Diamantina, no coração da Bahia, acolheu as férias regionais do movimento de Comunhão e Libertação do Nordeste.
Cachoeiras, céu incrivelmente estrelado e um hotel longe de qualquer paisagem remotamente urbana. A Chapada Diamantina, no coração da Bahia, ou melhor, a pequena e histórica cidade de Mucugê, foi o cenário escolhido pelo Movimento de Comunhão e Libertação do Nordeste para realizar as férias anuais, na semana de 20 a 23 de Outubro.
A aventura começou muito cedo para a maioria de nós. As opções eram sair de Salvador às seis da manhã e seguir numa viagem de, aproximadamente, sete horas de ônibus até Mucugê, ou ir de carro, o que encurtaria a viagem, mas talvez fosse necessário um guia que conhecesse a zona a partir de certo ponto da viagem. Em ambos os casos, o cenário era o mesmo: após cruzar as fronteiras de Salvador, o chão de terra batida começa a se tornar recorrente, até não termos à nossa frente nada além de extensos campos, que, em alguns momentos, tornavam-se oásis, desvendando as belezas de uma vegetação de transição entre o cerrado e caatinga nordestina. Enquanto alternávamos entre momentos de sono e de admiração, Padre Emílio Bellami, responsável pelo ônibus, tentava nos manter bem acordados, lembrando que o gesto já havia começado ali, naquela viagem. Era frequente ouvi-lo dizer “Isso não é um ônibus, é uma casa de repouso, vocês só dormem!”. E assim transcorremos as sete longas horas de viagem, entre brincadeiras do Padre Emilio, cantos e terço.
Chegamos a Mucugê quase na hora do almoço. Quando saímos do ônibus, alguns amigos que já estavam lá vieram nos cumprimentar e a sensação foi a de estarmos realmente isolados do resto do mundo. Não havia nada ao nosso redor além de terra, vegetação, insetos. Mas logo ao entardecer, percebemos que também havia um pôr-do-sol como talvez muitos de nós nunca tenham visto. Lembro-me de uma amiga que, ao contemplar como se coloria o céu com o sol que descia, disse: “não podemos fazer a abertura das férias agora, não podemos perder esse espetáculo!”. Mas, para a sorte da minha amiga, a abertura começou pontualmente com a missa, seguida de uma conversa com o responsável de CL em Salvador, Otoney Alcantara, e o responsável nacional, Marco Montrasi. Uma conversa que lançou um desafio: como as férias podem se tornar ocasião para nós de reconhecimento da vitória de Cristo, de modo que, quando voltarmos para casa, a incerteza não volte a vencer? Se é verdade que Cristo nos dá situações nas quais possamos verificar se Ele existe mesmo, então nas férias não deveria ser diferente.
Na sexta-feira, acordamos cedo porque tínhamos um longo dia pela frente e mais um desafio a enfrentar: deveríamos vencer uma trilha de 3 km para encontrar a famosa Cachoeira do Buracão, na cidade de Ibicoara, tida como uma das mais belas, senão a mais bela, do Brasil. Foi preciso mais de uma hora e dois meios de transportes para que percorrêssemos os 29 km e chegássemos ao início da trilha. Entre nós, muitos desbravadores, em especial as crianças, mas também muitos com medo de não completar o caminho. Certos da nossa amizade e com nossos lanchinhos em mãos, começamos o longo caminho. A paisagem variada nos deixava cada vez mais curiosos e entusiasmados. Pausas para selfies e fotos de grupo eram frequentes. Conversas surgiam; ninguém caminhava só. Essa cumplicidade foi essencial para que conseguíssemos atravessar os pontos mais difíceis, com desníveis consideráveis, sob um sol que não parecia dar trégua.
Se estávamos procurando uma oportunidade para sairmos de nós mesmo e de nossos esquemas quotidianos, ali estava ela, sob forma de trilha, árdua e extenuante, cujo enfrentamento nos levaria a descobrir a beleza de um dos cenários mais procurados daquela região. Ao fim da trilha, porém, uma surpresa: teríamos de seguir a nado até a cachoeira. Os guias nos forneceram coletes para não afundarmos. Os que não puderam nadar, tiveram que passar por trechos íngremes, e até mesmo caminhar por cima do riacho, numa situação que lembrava as pegadinhas do programa Domingão do Faustão. Foi belo notar que, em nenhum momento, estivemos sozinhos nessa empreitada. Em nenhum momento, deixamos de olhar uns para os outros, de nos pertencermos, até conseguirmos, juntos, alcançar a cachoeira. Eram 85 metros de queda e um canyon sinuoso pelo qual passamos a nado. Sentíamo-nos dentro de um filme ou documentário, verdadeiros desbravadores de paisagens selvagens guardadas por séculos, a esperar por nós. Já de volta ao início da trilha, cansados e molhados, almoçamos e participamos da missa.
Observar as estrelas foi nossa atividade noturna. Já recuperados da longa caminhada, essa nova etapa nos pedia silêncio e concentração. As crianças não viam a hora de aprender os nomes de constelações, estrelas, planetas, buracos negros, e entender melhor sobre os movimentos que a Terra realiza. Depois de uma breve introdução teórica, foi a nossa vez de olhar para o céu e brincar de ‘ligar os pontos’ para formas algumas constelações. Ao final, choviam perguntas e curiosidades, momento que viu os pequenos como os grandes protagonistas. Impossível não se render à grandiosidade de um céu visto sem qualquer iluminação natural, o que tornava ainda mais brilhante uma quantidade infinita de corpos celestes cuja existência nos era totalmente desconhecida.
Sábado pela manhã partimos em expedição, buscando outras cachoeiras dentro do Parque Nacional da Chapada Diamantina. Mucugê abrange mais da metade do Parque, que se estende ainda por outras seis cidades. Lá, conhecemos um pouco sobre a história da cidade, que está diretamente ligada à extração de diamantes. No século XIX, estes eram abundantes e estavam espalhados por todos os lados, dando origem a um ciclo desenfreado de extração. Dentro do Parque também pudemos entrar em contato com o Projeto Sempre Vivas, que tem por objetivo preservar esta espécie de flor, cuja característica principal é manter-se igual mesmo depois de arrancada; é como se não morresse. Por estarem quase em extinção (a coleta ilegal para venda no mercado externo, em especial, o europeu, ainda existe), elas são reproduzidas in vitro.
“Do Amor ninguém foge”: essa frase, impressa no banner que ocupava a frente do salão do hotel, serviu de tema para as reflexões da tarde de sábado. Fabrizio Pellicelli, presidente de AVSI Brasil e Peru, e Padre Emilio Bellami falaram sobre a experiência das APAC (Associação de Proteção e Assistência aos Condenados), modelo de sistema penitenciário pautado na valorização humana e na recuperação dos detentos. Não há a presença de agentes penitenciários ou policiais, pois são os próprios presos a deterem as chaves da prisão. A religião, a família e o voluntariado por parte da comunidade local são alguns dos elementos fundamentais deste modelo. Após o jantar, fingimo-nos todos atores e fomos chamados a interpretar cenas de filmes como Star Wars e Meu Malvado Favorito, vestindo-nos a caráter e usando os materiais e roupas que tínhamos trazido de casa. Não foi fácil, mas conseguimos reproduzir até os sabres de luz! Fomos minions, jedis, vingadores e nem mesmo Frodo escapou à nossa genialidade. Foram quatro grupos e quatro cenas, muitas trapalhadas e infinitas risadas.
Eis que chegamos ao último dia da nossa aventura humana. Domingo pela manhã, assembleia com Marco e Otoney. O que significaram esses dias? Como fizemos experiência de Cristo? Como fazer com que essa Beleza continue no dia seguinte, quando tivermos voltado à nossa rotina, ao trabalho, às tarefas diárias? Começam a chover testemunhos; ressalta-se a importância da companhia na verificação da fé de cada um, levando a sério nossos momentos de nostalgia. Em especial, os casais com filhos contaram de como se sentiram deslocados no início, por não poderem participar da primeira trilha. Mas, quando foram propostas alternativas, sentiram-se olhados e amados em suas necessidades. Como disse Otoney, concluindo a assembleia, as férias foram pensadas para ser a casa de cada um, e, de fato, foram a casa onde cada um pôde viver a presença de Cristo.
Logo após, pausa para um rápido almoço. Voltando à formação inicial, embarcamos em nosso ônibus, enquanto outros amigos voltaram de carro. Mais sete horas até Salvador. Posso dizer que já não éramos os mesmos: novos laços surgiram; já não éramos estranhos. A “casa de repouso” já não existia: as crianças cantavam, nós conversávamos e o sol que se punha, sem dar trégua, era sinal da Beleza que nos acompanhava. Quatro dias juntos. Quatro dias dormindo, comendo, cantando, caminhando e chorando juntos, verificando em cada olhar a busca pela Certeza que sustenta vida. Não podíamos mais ficar quietos. Eu sinceramente espero que nunca fiquemos!

 
 

Credits / © Sociedade Litterae Communionis Av. Nª Sra de Copacabana 420, Sbl 208, Copacabana, Rio de Janeiro - RJ
© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón

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