O ÚLTIMO PRESENTE PARA MARCO, SEM-TETO
Há alguns anos, na sala de acolhimento da minha paróquia, conheci Marco, um sem-teto. Ele se apresenta como um amigo: olhar gentil, agradecido por ser ouvido, visto como um ser humano. Depois de um tempo, eu o reencontro no centro comercial e o abraço: ele quase se retrai, porque há algum tempo que não troca de roupa. “Faz muito tempo que não te vejo. Você veio se encontrar comigo no centro!”, eu digo e o seguro. Desde esse dia, ele volta com frequência, mesmo que seja só para me cumprimentar e dizer: “Estou aqui de novo”. Convido-o para ir à minha casa para comer uma pizza: ele chega no horário combinado, tinha tomado banho e trocado de roupa. Come a pizza, conta algumas mentiras, dá risada e vai embora. No começo de novembro, chegou a notícia de que ele morreu. Foi encontrado morto debaixo de uma coberta de papelão. Telefono para o necrotério: “Gostaria de saber como encontrá-lo, para colocar umas flores sobre o seu túmulo”. O funcionário me pergunta quem eu sou e por que estou interessada nele. Respondo: “Eu o conheço, muitos aqui o conhecem e gostariam de participar do funeral”. Alguns dias depois, me chamam à delegacia e um policial me diz que foi ele quem o encontrou e que estão fazendo uma investigação para conhecer a identidade dele; se alguém soubesse alguma coisa, talvez se pudesse encontrar algum familiar para o reconhecimento. Entre os papéis do centro de acolhimento, encontramos o número do telefone de um amigo dele e o chamamos: ele nos dá um nome, e eu o comunico ao policial. Alguns dias depois, estou falando justamente de Marco com um senhor da paróquia e o empregado do necrotério me chama para me dizer que, tendo um nome e sobrenome, agora é finalmente possível celebrar o funeral, mas há uma taxa a ser paga. O homem com quem estou conversando ouve tudo, se despede apressadamente porque diz que tem um compromisso urgente. Depois de uma hora, batem à porta de casa: abro e é aquele senhor, que me entrega um envelope dizendo: “É o dinheiro para o funeral”. Eu jamais teria imaginado que pelo simples desejo de levar flores a um túmulo, Deus me fez reconhecer que se serve da nossa inadequação para mostrar a Sua face.
Rita, Milão (Itália)
UM OLHAR QUE REVOLUCIONA A VIDA TODA
Quando eu e minha família sentamos para decidir onde passar quinze dias de férias, o Rio de Janeiro, que é um dos nossos lugares preferidos, desta vez só foi escolhido por causa do Rio Encontros, não obstante o enorme medo que estávamos sentindo, considerando a onda de insegurança e violência na cidade. Porém, a atrativa pela oportunidade de participar do evento venceu, graças a Deus e ao amigo Carlos que não nos deixou desanimar. Então fomos ao Rio de Janeiro, cidade maravilhosa de verdade. Fomos às praias, aos museus, teatros, mirantes, aos restaurantes, mas fomos sobretudo ao encontro de amigos de uma vida toda, seja do Rio, Belo Horizonte, São Paulo e Brasília, e até amigos de Manaus que estavam lá como voluntários. Viver o Rio Encontros de verdade me renovou as esperanças. Ouvi as experiências das pessoas que constroem as APAC’s e isso foi excepcional. Eu me comovi com a dedicação e amor do diretor executivo Valdeci e chorei junto com o ex-recuperando Roberto. Pude ver a mudança do outro, ver que o que reconstrói a vida é ser olhado como pessoas, é ser amados, que é essa a grande revolução do mundo e a resposta para tantos problemas que parecem sem solução num mundo tão desfigurado e tão desesperado como tenho observado. Fiquei também fascinada ouvindo a Rose, de Uganda, por quanta inteligência e sensibilidade o encontro com Cristo fez surgir nela. Ao saber da experiência da escola que ao acolher os piores alunos eles se tornam os melhores alunos, eu entendi que o método é o mesmíssimo da APAC: é o olhar a pessoa, é o amar incondicionalmente a pessoa. Que sintonia entre todas as experiências relatadas! É a vida que explode no seu melhor a partir de pessoas tocadas e fascinadas pelo encontro com Cristo. Enfim, teria muito a dizer, pois essas minhas férias não poderiam ter sido melhores. Ficamos gratos e felizes por ter vivido dias tão bonitos, tão intensos, tão cheios de significados para a vida. Agradeço pelo empenho de todos os amigos que tornaram o Rio Encontro possível, que certamente é uma bela proposta para todos nós. Parabéns para o Rio Encontros!
Neide, Manaus (AM)
ESCOLA DE COMUNIDADE
ASSIM O OLHAR SE ALARGA
Caro padre Julián, ao deixar o Quênia para nos transferirmos para Genebra, o pedido mais agudo que eu tinha a fazer era que o Senhor continuasse a falar comigo. Isso foi há dois anos e até me espanto com o passar do tempo e com o que o Senhor fez para me dar uma resposta. Temos quatro filhos e esperamos uma filha para abril. A minha vida é muito simples, nem posso tomar grandes iniciativas. A primeira grande graça veio da possibilidade de seguir a sua Escola de Comunidade através de videoconferência. Senti isso como um presente. É uma belíssima companhia, verdadeira, profunda, recíproca. A segunda graça amadureceu com o tempo. Quando eu ouvi você dizer, logo no começo, que “o outro é um bem”, me senti provocada. Eu dizia para mim mesma que se essa hipótese se mostrasse verdadeira, eu ganharia muito. Em setembro, foi pedido ao meu marido Tommaso que desse início a um novo grupo de Escola de Comunidade, e eu decidi permanecer com ele para caminharmos juntos. A dificuldade é que, ao mudar de grupo, eu tinha que começar tudo de novo. Mas foi exatamente nesse lugar que eu comecei a usufruir dos frutos de um alargamento do olhar, fruto daquilo que você testemunhou para nós. Comecei a apreciar mais as palestras, porque, em todas, eu via os traços do Mistério. Através do que os outros contam, eu tenho a oportunidade de verificar a minha fé, porque o Senhor tem traços inconfundíveis, traz uma libertação inconfundível, suscita uma nostalgia inconfundível. A cada passo, peço ao Senhor que me ajude a aprofundar a minha pertença ao carisma, que assumi integralmente e ao qual sou muito grata, pela novidade que introduz na minha vida.
Maria, Genebra (Suíça)
SENTIDO DA VIDA, INCLUSIVE NA PRISÃO
Durante a Escola de Comunidade na prisão de Como (Itália), um detento conta a sua história.
Durante quase toda a minha vida, estive preso; sim, porque fora da prisão foram poucos anos. Na última detenção, cheguei ao ponto de não querer mais viver, não sabia o que fazer, não queria trabalhar, vivi como um robô, de modo automático, eu nunca soube como organizar a minha vida, nem dentro nem fora do presídio. Em junho, os agentes me convidaram para um encontro no salão. Eu nunca me interessei por isso, mas depois fiquei curioso para conhecer esse testemunho, sobretudo porque era fora da cela. Desço e escuto Stefania, voluntária no Equador. Quanto mais a escutava, mais alguma coisa se movia dentro de mim, uma espécie de metamorfose, uma transformação, eu me sentia atraído pelas palavras dela. Uma vez, ela falou de um homem que estava morrendo, vítima do terremoto, e disse aos seus parentes: “Não se preocupem, chorar não ajuda, eu sei como vivi e também sei por que estou morrendo”. Depois de ter ouvido essas palavras, comecei a pensar, a analisar o sentido da minha vida, por que ou por quem morrer. A partir daquele momento, comecei a relembrar todas as coisas ruins que eu cometi e comecei a sentir dentro de mim uma inquietação profunda. Entendi que até aquele momento eu sempre havia procurado me justificar pelas ações e escolhas que fiz, mas que tudo era mentira para mim mesmo e para os outros. Agora compreendo que não há justificativa que fique em pé. Depois do encontro, continuou a vida diária na prisão, mas eu me sentia diferente e desejoso de não viver mais como antes. Depois de uns dez dias do encontro com Stefania, meu coração começou a procurar Deus, comecei a me aproximar d’Ele, comecei a tratar com amor aqueles que estavam comigo. Não sabia se era capaz. Pensei que aquele olhar que encontrei em Stefania era a coisa que eu precisava; procurei, perguntei e me foi indicado um lugar: a sala de acolhimento. Preparei uma perguntinha e lá encontrei Patrizia, e ali estava o olhar que eu estava procurando. Fui aceito, comecei a seguir esse caminho, desejoso de aprender a viver com Deus cada minuto, cada dia, no cotidiano. Depois de dois meses, meu advogado me disse que eu estava pronto para sair, mas eu disse não. Pedi ao meu advogado que rasgasse os papéis. Eu desejava prosseguir o meu trajeto no centro de acolhimento. Intuí que isso era o mais razoável, eu não estava pronto para sair, eu precisava dar um nome a essa minha transformação, e agora posso dizer que fiz a escolha certa. Comecei a ler um livro de Dom Giussani, e entendo que esse homem fala ao meu coração. Patrizia me prometeu trazer alguns livros de Giussani em língua russa. Não são discursos que eu não conseguiria entender, mas um abraço, um olhar bondoso que me leva a começar a dizer por que estou vivo e qual o sentido da minha vida. Agora posso dizer que na vida nada acontece por acaso e que cada erro e cada ilusão e cada escolha feita, as quais me levaram à prisão, foram a ocasião para um encontro, para o encontro da minha vida. Graças a isso, Deus me colocou no caminho certo e me fez conhecer primeiro Stefania, depois Patrizia, e todos os jovens do centro de acolhimento e, por isso, agora posso dizer que, sim, estou preso e, apesar de tudo, sou feliz e tenho esperança no futuro. Aquele olhar de Stefania, aquele olhar de Patrizia, agora, são o dom mais belo que Deus me deu este ano.
Sasha
OS PLANOS DE DEUS CARREGAM EM SI UM GRANDE BEM
A felicidade é possível para quem experimenta adversidades na vida? Parto dessa pergunta, pois através dela tem-se reafirmado em mim uma certeza, que mesmo experimentando a tristeza e a dor, através da capacidade de resiliência que nasce pela fé nessa Presença que nos salva, é possível superar a dor e manter vivo o desejo de felicidade e de vida. A minha história não foi planejada por mim. O meu desejo desde pequena era encontrar um grande amor, ter um casamento perfeito, ser mãe, ter filhos saudáveis, ser realizada no meu trabalho, viver feliz em companhia da minha família e dos meus amigos. Mas os planos de Deus foram um pouco diferentes: tive a felicidade de experimentar amor através da realidade que me foi dada para viver com todas as suas imperfeições e dificuldades. Eu e meu esposo acolhemos um anjo especial em nossas vidas, nossa filha Alice, que aos cinco meses de vida foi diagnosticada com uma doença rara, grave e neurodegenerativa, a Doença de Niemann-Pick tipo C, com expectativa de viver apenas até os cinco anos. Experimentar a dor do adoecimento e agravamento do quadro de Alice foi muito difícil para nós; mas acolher a dor e amá-la à semelhança de Cristo, como Cristo amou a própria dor, foi fundamental para nos mover a cumprir uma grande missão de amor: a partir do amor por Alice, nasceu mais vivo em nós o desejo de vida, frutificando a missão de luta pela vida de Alice e pela vida de tantas outras pessoas portadoras da mesma síndrome, nascendo a partir dessa experiência uma Associação Nacional de Famílias da Doença de Niemann Pick. Através do empenho em buscar todas as alternativas de tratamento para Alice, e pela graça de Deus, sua expectativa de vida foi aumentada; comemoramos vários aniversários da nossa pequena. Experimentamos também a felicidade de acolher nossa segunda filha, Maria Júlia, através da adoção. Porém, a imprevisibilidade da vida nos trouxe uma infeliz surpresa: a morte precoce de meu esposo aos 45 anos de idade em julho de 2015. Vivi uma fase muito difícil e tive que encontrar mais força em Deus para superar essa dor e continuar enfrentando os desafios da vida sem meu companheiro. Passado 1 ano e 3 meses do falecimento de Júlio o quadro de Alice agravou e ela faleceu aos 12 anos, em outubro de 2016, no ano da Misericórdia. Lembro até hoje dos dias que passei na UTI com Alice e Júlio, de todo apoio que recebi da família e da companhia dos amigos. Para quem experimenta perdas tão significativas, a aceitação da realidade e a superação do sofrimento podem se consolidar através de uma constatação: não há perdas, pois a vida não nos pertence; mas a vida pode ganhar significado quando vivida em plenitude e isso nos aproxima do céu. Hoje carrego comigo uma convicção: que os planos de Deus para nós, por mais difíceis que possam parecer, carregam em si um grande bem, e o que Ele espera de nós é exatamente isso, viver o cêntuplo e experimentar esse grande bem aqui e agora. De fato, não se pode negar que Cristo se apresenta através de realidades como essa que experimento e que comunica o Seu Amor e Misericórdia por nós na medida em que se utiliza da nossa frágil humanidade para testemunhar e fazer frutificar Seu amor gratuito.
Adriana, Salvador (BA)
NEW YORK ENCOUNTER
A PRESENÇA DE VOCÊS ME CONSTITUI
Caro padre José Medina [responsável por CL nos EUA], desde que saí do Metropolitan Pavillion, onde se desenvolvia o New York Encounter, não posso deixar de pensar no que vi nesses dias. Você, no início, me acolheu com um entusiasmo incrível; que me ajudou a preparar as fotos e fixá-las nas paredes, e me acompanhou com a sua atenção nessa tarefa. Naqueles dias, fiquei impressionada com a maneira como me olhavam e me senti compreendida em todos os momentos que vivi, inclusive quando eu estava esgotada. E eu vi a mesma coisa acontecer à minha volta. Um artista quase chorava ao ver tantas pessoas interessadas: “Para mim? Vocês têm perguntas para mim?”. Ou um amigo que me disse: “Sabe, muitas vezes fui embora sem entender uma palavra daquilo que você estava falando, mas hoje, na hora do almoço, encontrei alguém que tinha o mesmo problema, e vim a este encontro, que de fato tinha muitíssimas coisas a dizer à minha vida de hoje...”. Depois de muitos anos, me interessei pela Escola de comunidade. Carrón nos perguntou: “Ainda cremos na capacidade da fé de atrair aqueles que encontramos?”. Sim, o que devo dizer? Não estarei na assembleia de amanhã, acabei de chegar a casa e meu marido ainda está trabalhando, assim acabei ficando sozinha. Mas estou muito feliz agora! Como a senhora naquele vídeo: “Em cada coisa há uma fissura, e é por aí que entra a luz”; ela estava feliz por ver lugares belíssimos, pelo simples fato de eles existirem... Eu estou aqui sozinha, mas a presença de vocês me constitui agora, tal como sou.
Giuditta
VIAGEM DE TRABALHO A BUCARESTE
Massimo escreveu este email aos amigos da comunidade da Romênia, que se encontravam pela primeira vez em Bucareste, durante um dia de trabalho.
Fiquei muito comovido por tantas pessoas estarem interessadas em conhecer um italiano qualquer e vocês me convidarem para o jantar. Eu nunca encontrei um lugar como este no mundo, sobretudo entre pessoas de nacionalidades diferentes. A certa altura, durante o jantar, enquanto todos riam, eu os observava e tive uma percepção clara. Era Jesus que quis me fazer companhia, durante a minha passagem, através de vocês. E isso não me fez melhor ou mais coerente, e sim mais alegre. Para mim, a Romênia era uma nação como outras, onde eu precisava estar para vender algumas coisas. Agora, por onde vou levo comigo os vossos rostos. "Vocês se tornaram, para mim, pessoas queridas", como escrevia são Paulo. Que graça ver que o carisma do movimento é capaz de encantar até pessoas de outras confissões. Vocês são, de fato, um testemunho muito importante; vocês mostram como é a universalidade vivida da Igreja na história do movimento.
Massimo, La Spezia
Credits /
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© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón