Uma página do livro O caminho para a verdade é uma experiência, de Luigi Giussani. Para refletir sobre “a responsabilidade sem escapatória” a que todo cristão é chamado
A descoberta de Cristo como centro de tudo elimina o medo e faz o homem sentir uma capacidade de contato dominador com tudo: “Tudo é vosso, mas vós sois de Cristo e Cristo é de Deus”. Mais precisamente, esta nova cultura obriga a uma concepção densa da vida, como uma atividade sem descanso e uma responsabilidade sem escapatória. Tal atividade é um verdadeiro “serviço” de todos os instantes, de todas as palavras (“quer comais, quer bebais...”): serviço ao Reino, isto é, àquele desígnio do cosmos pelo qual Cristo é senhor de toda realidade. A existência de cada um tem um sentido – isto é, verdadeiramente existe – somente enquanto é uma função do Seu reino.
O lugar em que o encontro entre Deus e cada homem acontece de modo completo é Cristo: a vocação de cada homem é um acontecimento que ocorre no âmbito da realidade pessoal e misteriosa de Cristo: “Vós fostes chamados em Cristo Jesus...”
Reconhecer a própria vocação, ordenar a vida seguindo o seu chamado, conceber a existência como um serviço ao todo: eis o empenho vital do próprio ser ao qual lucidamente obriga o Espírito de Cristo, dando a força para começar e para ser fiel.
A concepção moderna da vida nunca se mostra tão distante do Espírito de Cristo como neste ponto. O critério com o qual a mentalidade de hoje habitua a olhar o futuro tem como centro o proveito, o gosto ou a facilidade do indivíduo. O caminho a escolher, a pessoa a amar, a profissão a desempenhar, a faculdade em que se matricular, tudo é determinado de modo a erigir como critério absoluto à utilidade particular do indivíduo. E isto parece tão óbvio e normal que a subversão causada pelo chamado se mostra, mesmo a muitas pessoas de bem, um desafio ao bom senso, um fanatismo, um exagero. São acusações repetidas até por educadores que se sentem cristãos, ou por pais preocupados com o sucesso humano dos filhos: os juízos nas situações privadas e públicas, os conselhos para bem viver, as advertências ou repreensões, tudo é ditado por um ponto de vista do qual estão totalmente ausentes a devoção ao todo e a preocupação com o Reino, e a realidade de Cristo é exilada. “O que o todo poderá me dar? Como obter o maior proveito possível do todo?”: estes são os critérios imanentes à sabedoria mais difundida e ao bom senso mais reconhecido.
A mentalidade cristã, ao contrário, derruba essas perguntas, as contradiz e as mortifica e agiganta o imperativo exatamente oposto: “Como eu poderei doar-me, com aquilo que sou, servir mais ao todo, ao Reino, a Cristo?” Este é o único critério educativo da personalidade humana redimida pela luz e pela força do Espírito de Cristo.
A profunda disponibilidade de toda a própria vida no serviço ao todo é de extrema importância exatamente também para compreender qual a função que se é chamado a desempenhar, qual a vocação pessoal. O que deverei fazer, o que devo ser, a minha vocação, não se apresenta normalmente como uma ordem precisa, mas antes como uma sugestão, um convite. A vocação, que é o significado da minha vida, apresenta-se a mim como possibilidade vislumbrada, e não como inevitabilidade inequívoca. Isto, aliás, é tanto mais verdadeiro quanto mais fundamental e importante é a tarefa a ser realizada. A consciência, em seu aspecto mais puro e fascinante, é a sugestão mais discreta: é a inspiração. Deste modo, eu decido minha estatura pessoal aderindo positivamente a possibilidades extremamente frágeis.
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