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Passos N.97, Setembro 2008

EXPERIÊNCIA - GREATER | O FILME SOBRE O MEETING POINT

Em Kampala, a esperança
toma o lugar do "Final Feliz"

por Maddalena Vicini

Qual é a coisa mais interessante no documentário de Emmanuel Exitu, premiado em Cannes? É a vitória da realidade, com toda a sua carga dramática. É o que nos conta o diretor

O Babelgum Online Film Festival é uma competição que se desenvolve dentro do festival de cinema francês, o Festival de Cannes, e esse ano o presidente do júri era ninguém menos que Spike Lee, um dos mais importantes diretores norte-americanos da atualidade. O grande vencedor da categoria documentário, superando os sessenta concorrentes vindos do mundo todo, foi Greater – Defeating Aids, o documentário sobre Rose e o Meeting Point de Kampala, Uganda, dirigido e produzido por Emmanuel Exitu. É um filme forte, como sabe quem já teve oportunidade de assisti-lo. Mostra, com simplicidade, Rose, Vicky, os órfãos e as outras mulheres acolhidas pelo Meeting Point: dançam, choram, falam de si, da doença e da vitória sobre a Aids. Tudo narrado com uma linguagem sem filtros, onde a situação em que se trabalha impõe o método de trabalho: mostrar sem artifícios aquilo que se está vivendo.
E aqui – prêmio à parte – está o ponto que vale a pena aprofundar. Como nasceu realmente esse filme? De que maneira de olhar a realidade? “Não fui atrás do equívoco da imagem envernizada: deixei-me entrar naquilo que acontecia e em sua abundante concretude e verdade. E não teria conseguido nem uma cena se Rose não se confiasse em mim e na minha filmadora. A coisa mais bonita que me disse, de fato, foi: Tudo bem, venha, acredito no seu coração porque percebo que o que lhe interessa é o mesmo que me interessa”, conta o diretor Emmanuel Exitu, nascido em Bolonha, que tirou seu nome artístico de um monólogo escrito por Giovanni Testori, grande teatrólogo italiano convertido ao catolicismo no final da vida, do qual se proclama “filho ilegítimo”.

Grudado às coisas
Não se trata de um reality show, as câmeras não estão escondidas e a ninguém é pedido para encenar nada. “A câmera está sempre à vista, faz parte da própria realidade que está sendo filmada e sua presença gera um curto circuito. Paradoxalmente, aumenta o senso de verdade: não se torna um ponto de vista falsamente externo e separado, mas permanece ligada às coisas, obrigada a segui-las para ver o que acontece”, explica Emmanuel. O espectador torna-se, assim, um companheiro de viagem, um co-protagonista projetado dentro daquilo que está sendo contado.
O risco que se corre escolhendo esse tipo de linguagem cinematográfica é muito grande, conhece-se o ponto de partida, mas não se sabe aonde chegará. “Eu confio absolutamente no fato de que a experiência fala. O método era simples. Quando Rose vinha nos buscar, eu perguntava: ‘O que você vai fazer hoje?’, e a seguia. Não preparava nada. Queria apenas me aproximar daquilo que acontecia”. Portanto, não partia de nenhum projeto. Porém, nada foi feito de maneira voluntarista. A câmera não foi simplesmente ligada para filmar ao acaso. Para que pudéssemos estar lá, foram necessários trâmites judiciários e três dias de retomadas, cinqüenta horas de filmagem e um trabalho meticuloso de edição na sala de montagem. E nas imagens, não se vê um lamento, mas a vida, aquilo que há dentro, além da miséria e da doença. Exatamente como escreveu Testori, sobre o Cristo crucificado: “O espaço doce/do teu sinal/que se estende/treme/e em nós acende/uma diversa projeção/da humana indistinção”.

“É preciso ver”
No fundo, é o que disse Rose logo no início do filme: “Neste mundo, fala-se demais. É preciso ver, ver e se comover. Porque o fazer não basta, cansa. Mas olhar nos comove e nos mantém em movimento sem parar”.
Em Cannes, não foi premiado um documentário comum de denúncia social, muito menos uma obra estereotipada e cinematograficamente plastificada. Venceu a realidade e aquilo que todos os dias ela nos traz e nós buscamos. “Eu busco a esperança, não o final feliz”, conclui Exitu: “Esse é o meu motor e a força de Greater. Porque o final feliz torna mudo e surdo o mal que se viveu. A esperança, ao contrário, não precisa esquecer nada, arde sempre”.
Narrado em inglês e italiano, Greater – Defeating Aids encontra-se disponível em http://www.babelgum.com/113782/greater-defeating-aids.htm

O Meeting Point em Uganda

Mais de 10% da população ugandense tem Aids, o que legou ao país mais de um milhão de órfãos. A população é paupérrima e os conflitos armados mantêm a população há anos num estado de insegurança.
Nesse contexto, Rose Busingye é responsável pelo Meeting Point de Kampala, uma pequena organização não-governamental nascida em 1990. Um grupo de italianos da Fundação AVSI ajudou seus amigos ugandenses a responder ao problema da Aids, que atingira suas famílias e seus amigos mais queridos, com o objetivo de não deixá-los sós diante da doença e da morte. “Hoje, o combate à Aids está na moda. Todos fazem projetos para ajudar os doentes, para defender os direitos humanos, para derrotar a doença. Mas a pessoa fica reduzida à sua doença. Chega alguém com Aids e a tendência é cuidar da doença dela. Nós, antes de mais nada, olhamos para a pessoa que tem a doença”, explica Rose, para destacar que tudo aquilo que faz é obra de um Outro.
Quem pode, vai com suas próprias pernas; caso contrário, são as pessoas do Meeting Point que vão procurar os doentes até nos recantos mais esquecidos, nos bairros pobres e insalubres, onde a cada dia a Aids faz novas vítimas.
O Meeting Point age nos subúrbios de Kampala, em Kitgum e Hoima, na parte ocidental do país, encontrando doentes, viúvas, crianças e órfãos, oferecendo apoio psicológico a jovens e famílias, ensinando normas de educação sanitária e sexual, tratando pacientes em domicílio e levando cuidados e remédios àqueles que não podem se internar por motivos econômicos ou pelo adiantado estágio da doença. Na sede do Meeting Point organizam-se cantos e danças diante da casa dos órfãos. São a expressão de uma contagiante vontade de viver. As danças vêm de todas as tribos ugandenses: Baganda, Bunyoro, Acholi. A atividade teatral e de dança é instrumento recreativo e de socialização, ajuda a tomar consciência do problema, gera renda, pois o grupo é cada vez mais freqüentemente convidado a participar de manifestações e encontros públicos.
As histórias do Meeting Point são belas e comoventes. Certa vez, alguns amigos italianos levaram Rose para ver a beleza de um pôr-do-sol. Ela pensou: “isso também é para minhas amigas do Meeting Point”. Assim, agora organiza passeios para levá-las para ver o pôr-do-sol!”
Quando o furacão Katrina varreu a Louisiana, nos EUA, em 2005, Rose pediu às mulheres que rezassem pelas pessoas que ficaram sem casa e sem família. Elas, para sobreviver, quebram pedras grandes para empresas rodoviárias e da construção civil. Uma mulher se aproximou e lhe disse: “Quando você me encontrou, não rezou. Eu também quero ter amado alguém antes de morrer. Não quero que um dia qualquer alguém que encontre os meus filhos, reze e pronto”. Assim, elas trabalharam mais tempo e arrecadaram US$ 1, 2 mil para ajudar os desabrigados norte-americanos!

 
 

Credits / © Sociedade Litterae Communionis Av. Nª Sra de Copacabana 420, Sbl 208, Copacabana, Rio de Janeiro - RJ
© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón

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