Frente às últimas polêmicas que envolveram Bento XVI – do “caso dos lefevbrianos” à Aids na África, passando pelos artigos sobre a suposta “solidão do Papa” –, corre-se um risco: nos acostumarmos, pensarmos que, no fundo, são coisas já vistas, quase costumeiras, a serem guardadas nas conhecidas gavetas: pró e contra o Papa. De um lado, os “papistas”; do outro, os “laicos”; no meio, uma plateia de católicos adultos e ateus teocon, misturando ainda mais as cartas.
Na verdade, o risco é grave. Porque impede que se capte em profundidade a natureza decisiva do que está em jogo. Por exemplo, não permite que percebamos que, no ataque à racionalidade com que a Igreja enfrenta os problemas cotidianos do homem – como a Aids ou a crise econômica –, está a negação da evidência mais poderosa que vivemos: reconhecer Cristo leva o homem a conhecer o real, a fé amplia a razão. Ao passo que, no escândalo frente à misericórdia que leva o Papa a abraçar aquele que erra – “gesto inequívoco do divino” e, portanto, “o maior desafio” que podemos enfrentar, como escreveu padre Julián Carrón em Avvenire –, está a rejeição obstinada e terrível do fato mesmo que Cristo trouxe ao mundo: a salvação. Obstinada porque fruto de uma razão teimosamente asfixiada. E terrível porque tenta retirar da nossa experiência a esperança.
O que seria da vida sem a Sua misericórdia? Como faríamos para enfrentar a doença, ou nossos erros, ou a dureza da crise? O que seria da realidade sem Ele? Um peso insuportável. Como a pedra de um sepulcro.
É desse sepulcro que irrompe a Páscoa. A pedra sepulcral foi afastada para sempre pela Ressurreição. Porque Ele está presente. Aqui e agora. Contemporâneo a nós. E basta segui-Lo, porque, como diz o próprio Bento XVI numa passagem muito bonita de um de seus discursos recentes, “no mistério da Encarnação está presente tanto o conteúdo quanto o método do anúncio cristão”.
É também por isso que, no lugar da “Página Um”, neste número de Passos, você encontrará a coletânea de alguns textos do Papa e dois discursos que ajudam a entender o valor deles (o próprio artigo de Carrón e um outro do padre Stefano Alberto). É um instrumento de trabalho que nos ajuda a dar um juízo mais profundo sobre o que está acontecendo. E surpreender-nos alegremente com o que é recordado no cartaz de Páscoa: “Cristo venceu”.
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© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón