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Passos N.91, Março 2008

BENTO XVI

A origem da universidade está na sede de conhecimento, que é própria do homem

por Bento XVI

O texto que o Papa Bento XVI teria lido durante a visita à Universidade de Roma “La Sapienza”, prevista para o dia 17 de janeiro, depois anulada em 15 de janeiro de 2008.

É para mim motivo de profunda alegria encontrar-me com a comunidade da Universidade La Sapienza de Roma, por ocasião da inauguração do ano acadêmico. Há séculos esta universidade marca o caminho e a vida da cidade de Roma, fazendo frutificar as melhores energias intelectuais em cada campo do saber. Depois da fundação querida pelo Papa Bonifácio VIII, a instituição – quer no período em que dependia diretamente da Autoridade eclesiástica, quer sucessivamente, quando o Studium Urbis se desenvolveu como instituição do Estado Italiano – manteve um grande nível científico e cultural, que a coloca entre as mais prestigiosas universidades do mundo. Desde sempre, a Igreja de Roma tem olhado com simpatia e admiração para este centro universitário, reconhecendo o seu empenho, por vezes árduo e cansativo, de investigação e de formação das novas gerações. Nestes últimos anos, não faltaram momentos significativos de colaboração e diálogo. (...)
Nesta circunstância, começo por expressar a minha gratidão pelo convite que me foi dirigido para falar à vossa universidade. Com esta perspectiva em mente, pus-me antes de tudo esta pergunta: O que é que pode e deve dizer um Papa numa ocasião como esta? Na minha preleção em Ratisbona (Alemanha), falei certamente como Papa, mas o fiz sobretudo enquanto ex-professor daquela universidade, procurando unir lembranças e atualidade. Mas, à universidade “Sapienza”, a antiga universidade de Roma, fui convidado a vir precisamente como Bispo de Roma e, por isso, devo falar enquanto tal. Sem dúvida, outrora a “Sapienza” era a universidade do Papa, mas hoje é uma universidade laica com aquela autonomia que, na base do seu próprio conceito constituinte, sempre fez parte da natureza da universidade, que deve estar vinculada exclusivamente à autoridade da verdade. Na sua liberdade de autoridades políticas e eclesiásticas, a universidade encontra a sua função particular, nomeadamente na sociedade moderna, que tem necessidade de uma instituição deste gênero.
Volto à minha pergunta inicial: O que é que pode e deve dizer o Papa no encontro com a universidade da sua cidade? Refletindo sobre esta questão, pareceu-me que a mesma incluísse outras duas, cujo esclarecimento por si mesmo havia de levar à resposta. Com efeito, é necessário interrogar-se: Qual é a natureza e a missão do Papado? E ainda: Qual é a natureza e a missão da universidade? Não quero aqui demorar com prolongadas indagações sobre a natureza do Papado. Uma breve menção é suficiente. O Papa é primariamente Bispo de Roma e como tal, em virtude da sucessão do Apóstolo Pedro, detém uma responsabilidade episcopal por toda a Igreja Católica. A palavra “bispo” – episkopos, cujo significado imediato é o de “sentinela” – já no Novo Testamento se fundiu com o conceito bíblico de Pastor: é alguém que olha o conjunto de um ponto de observação mais elevado, cuidando do reto caminho e da coesão da totalidade. Neste sentido, tal designação da sua missão aponta antes de mais para o interior da comunidade crente. O Bispo – o Pastor – é o homem que tem cuidado desta comunidade; é aquele que a conserva unida, mantendo-a no caminho para Deus, que foi indicado, segundo a fé cristã, por Jesus – e não somente indicado: Ele mesmo é, para nós, o caminho. Mas, esta comunidade da qual o Bispo se ocupa – seja ela grande ou pequena – vive no mundo; as suas condições, o seu caminho, o seu exemplo e a sua palavra influem, inevitavelmente, sobre o resto da comunidade humana inteira. Quanto maior ela for, mais a sua condição salutar ou então uma eventual degradação se repercute no conjunto da humanidade. Salta hoje aos nossos olhos, com grande clareza, como as condições das religiões e como a situação da Igreja – as suas crises e as suas renovações – influem no conjunto da humanidade. Assim o Papa, precisamente como Pastor da sua comunidade, também foi se tornando cada vez mais uma voz da razão ética da humanidade.
Porém, aqui se levanta imediatamente uma objeção, ou seja, que o Papa, de fato, não falaria verdadeiramente com base na razão ética, mas tiraria as suas conclusões da fé e, por isso, não poderia pretender a validade das mesmas para quantos não partilham desta fé. Ainda voltaremos a este tema, deixando-o por agora porque se levanta aqui a questão absolutamente fundamental: O que é a razão? Como pode uma afirmação, sobretudo uma norma moral, demonstrar-se “razoável”? Aqui gostaria, brevemente apenas, de relevar que John Rawls, embora negando às doutrinas religiosas compreensivas o caráter da razão “pública”, todavia vê na sua razão “não pública” pelo menos uma razão que não poderia, em nome de uma racionalidade secularizadamente insensível, ser simplesmente desconhecida por aqueles que a defendem. Para além do mais, ele vê um critério desta razoabilidade no fato de tais doutrinas derivarem de uma tradição responsável e motivada, tendo sido durante um longo período desenvolvidas argumentações suficientemente boas em defesa da respectiva doutrina. Nesta afirmação, parece-me importante o reconhecimento de que a experiência e a demonstração ao longo das gerações a base histórica da sabedoria humana constituem também um sinal da sua razoabilidade e do seu significado duradouro. Diante de uma razão não histórica que procura se autoconstruir somente numa racionalidade não histórica, a sabedoria da humanidade como tal – a sabedoria das grandes tradições religiosas – deve ser valorizada como realidade que não se pode impunemente lançar para o cesto da história das idéias.
Voltemos à pergunta inicial. O Papa fala como representante de uma comunidade crente, na qual, durante os séculos da sua existência, amadureceu uma determinada sabedoria da vida; fala como representante de uma comunidade que guarda em si um tesouro de conhecimento e de experiência ética, que se revela importante para toda a humanidade: neste sentido, fala como representante de uma razão ética.
Mas agora devemos interrogar-nos: O que é a universidade? Qual é a sua missão? É uma questão colossal, à qual mais uma vez me é possível tentar responder, em estilo quase telegráfico, com algumas observações. Penso que se possa afirmar que a verdadeira e íntima origem da universidade esteja na sede de conhecimento, que é própria do homem. Este quer saber o que é tudo aquilo que o circunda. Quer a verdade. Neste sentido, podemos ver o questionar-se de Sócrates como o impulso do qual nasceu a universidade ocidental. Penso, por exemplo – para mencionar somente um texto –, na disputa com Eutifrone, que diante de Sócrates defende a religião mítica e a sua devoção. A isto, Sócrates contrapõe a pergunta: “Tu acreditas que entre os deuses exista realmente uma guerra recíproca e terríveis inimizades e combates... Teremos nós, Eutifrone, de afirmar que tudo isto é verdade?” (6 b-c). Nesta pergunta, aparentemente pouco devota, mas que, em Sócrates, derivava de uma religiosidade mais profunda e mais pura, ou seja, da busca do Deus verdadeiramente divino, os cristãos dos primeiros séculos reconheceram a si mesmos e ao seu caminho. Acolheram a sua fé não de forma positivista, ou como a via de fuga de desejos não realizados; compreenderam-na como uma diluição da neblina da religião mitológica para deixar espaço à descoberta daquele Deus que é Razão criadora e, ao mesmo tempo, Razão-Amor. Por isso, o interrogar-se da razão sobre o Deus maior e também sobre a verdadeira natureza e o autêntico sentido do ser humano era, para eles, não uma forma problemática de falta de religiosidade, mas fazia parte da essência do seu modo de ser religiosos. Por conseguinte, eles não tinham necessidade de diluir ou abandonar o questionar-se socrático, mas podiam, aliás deviam, acolhê-lo e reconhecer como parte da sua própria identidade a árdua busca da razão para alcançar o conhecimento da verdade inteira. Assim podia, aliás devia, no âmbito da fé cristã, no mundo cristão, nascer a universidade.
É necessário dar mais um passo. O homem quer conhecer; quer a verdade. Esta é primariamente algo que diz respeito ao ver, ao compreender, à theoría, como a denomina a tradição grega. Mas, a verdade nunca é apenas teórica. Agostinho, ao estabelecer uma correlação entre as Bem-Aventuranças do Sermão da Montanha e os dons do Espírito mencionados no capítulo 11 de Isaías, notou uma reciprocidade entre “scientia” e “tristitia”: o simples saber, disse, deixa-nos tristes. E realmente, quem se limita a ver e apreender tudo aquilo que acontece no mundo, acaba por ficar triste. Mas verdade significa mais do que saber: o conhecimento da verdade tem como finalidade o conhecimento do bem. Este é também o sentido do questionar-se socrático: Qual é o bem que nos torna verdadeiros? A verdade nos torna bons e a bondade é verdadeira: este é o otimismo que vive na fé cristã, porque a esta foi concedida a visão do Logos, da Razão criadora que, na encarnação de Deus, se revelou junto como o Bem, como a própria Bondade.
Na teologia medieval, houve uma disputa profunda sobre a relação entre teoria e prática, sobre a justa relação entre conhecer e agir – uma disputa que não cabe aqui desenvolver. Com efeito, a universidade medieval com as suas quatro Faculdades apresenta esta correlação. Comecemos pela Faculdade que, segundo a compreensão da época, era a quarta: a de Medicina. Não obstante fosse considerada mais como “arte” do que como ciência, todavia a sua inserção no cosmos da universitas significava claramente que estava colocada no âmbito da racionalidade, que a arte de curar se encontrava sob a guia da razão, subtraindo-se ao âmbito da magia. Curar é uma missão que exige sempre mais do que a >>
>> simples razão, mas por isso mesmo precisa da conexão entre saber e poder, tem necessidade de pertencer ao campo da ratio. Inevitavelmente levanta-se a questão da relação entre prática e teoria, entre conhecimento e agir, na Faculdade de Jurisprudência. Trata-se de atribuir a justa forma à liberdade humana, que é sempre liberdade na comunhão recíproca: o direito é o pressuposto da liberdade, e não o seu antagonista. Mas aqui se levanta a questão: Como se individualizam os critérios de justiça que tornam possível uma liberdade vivida em conjunto e favorecem o ser bom do homem? Nesta altura, impõe-se dar um salto ao presente: É a questão do modo como se pode encontrar uma normativa jurídica que constitua um ordenamento da liberdade, da dignidade humana e dos direitos do homem. É a questão que nos ocupa hoje nos processos democráticos de formação da opinião e que, ao mesmo tempo, nos angustia porque problemática para o porvir da humanidade. Na minha opinião, Jürgen Habermas exprime um vasto consenso do pensamento contemporâneo, quando afirma que a legitimidade de uma carta constitucional, como pressuposto da legalidade, derivaria de duas fontes: da participação política igualitária de todos os cidadãos e da forma razoável como são resolvidos os contrastes políticos. A propósito da referida “forma razoável”, observa ele que a mesma não pode ser somente uma luta por maiorias aritméticas, mas há de caracterizar-se como um “processo de argumentação sensível à verdade” (wahrheitssensibles Argumentationsverfa hren). É uma afirmação correta, mas muito difícil de transformar em prática política. Os representantes daquele público “processo de argumentação” são predominantemente – como sabemos – os partidos enquanto responsáveis pela formação da vontade política. Com efeito, estes terão infalivelmente em vista, sobretudo a consecução de maiorias e, por conseguinte, olharão de maneira quase inevitável pelos interesses que prometem satisfazer; mas, tais interesses muitas vezes são particulares e não favorecem verdadeiramente a comunidade. A sensibilidade pela verdade acaba incessantemente subjugada à sensibilidade pelos interesses. Julgo significativo o fato de que Habermas fale da sensibilidade pela verdade como de um elemento necessário no processo de argumentação política, voltando assim a inserir o conceito de verdade no debate filosófico e político.
Mas, então, torna-se inevitável a pergunta de Pilatos: O que é a verdade? E como a reconhecemos? Se para isso se remete para a “razão pública”, como faz Rawls, segue-se necessariamente a questão: O que é razoável? Como é que uma razão se demonstra verdadeira? De qualquer maneira, sobre esta base torna-se evidente que, na busca do direito da liberdade, da verdade da justa convivência, devem ser ouvidas outras instâncias diversas dos partidos e grupos de interesse, sem com isto querer minimamente contestar a importância destes. Voltamos assim à estrutura da universidade medieval. Ao lado da Faculdade de Jurisprudência, havia as Faculdades de Filosofia e de Teologia, às quais estava confiada a investigação sobre o ser homem na sua totalidade e, conseqüentemente, a missão de conservar viva a sensibilidade pela verdade. Poderia-se mesmo afirmar que o sentido permanente e autêntico das duas Faculdades é este: serem guardiães da sensibilidade pela verdade, não permitirem que o homem seja afastado da busca da verdade. Mas como é que elas podem corresponder a esta missão? Trata-se aqui de uma questão pela qual é necessário lutar incessantemente sem nunca estar posta e resolvida de maneira definitiva. Estando assim as coisas, nem sequer eu posso oferecer propriamente uma resposta, mas simplesmente um convite para continuarem a caminhar com esta interrogação – a caminhar com os grandes que, ao longo de toda a história, lutaram e procuraram com as suas respostas e com a sua inquietude pela verdade, que remete continuamente para além de cada uma das respostas individuais.
Teologia e filosofia formam nisto um par de gêmeos peculiar, não podendo nenhuma das duas desligar-se totalmente da outra e, todavia, cada uma deve conservar a própria tarefa e identidade. É mérito histórico de São Tomás de Aquino – face às diferentes respostas dos Padres, em virtude do seu contexto histórico – ter evidenciado a autonomia da filosofia e, juntamente com ela, o direito e a responsabilidade própria da razão de se interrogar com base nas suas forças. Diferenciando-se das filosofias neoplatônicas, onde religião e filosofia se encontravam inseparavelmente entrelaçadas, os Padres tinham apresentado a fé cristã como a verdadeira filosofia, ressaltando ainda que esta fé corresponde às exigências da razão na sua busca da verdade; que a fé é o “sim” à verdade, comparativamente às religiões míticas que se tinham tornado uma simples rotina. Sucessivamente, porém, na época do nascimento da universidade, no Ocidente já não existiam aquelas religiões, mas somente o cristianismo, e assim era necessário ressaltar novamente a responsabilidade própria da razão, de modo que não fosse absorvida pela fé. São Tomás interveio num momento privilegiado: pela primeira vez, os escritos filosóficos de Aristóteles tornaram-se acessíveis na sua integridade; estavam presentes as filosofias hebraicas e árabes enquanto específicas apropriações e prolongamentos da filosofia grega. Assim o cristianismo, num novo diálogo com a razão dos outros que ia encontrando, teve que lutar em favor da sua própria razoabilidade. Designada “Faculdade dos Artistas”, a Faculdade de Filosofia, que até então tinha sido somente propedêutica à teologia, tornou-se agora uma verdadeira e própria Faculdade, um parceiro autônomo da teologia e da fé nela refletida. Não é possível aqui demorarmo-nos sobre o fascinante confronto que daí resultou. Diria que a idéia de São Tomás sobre a relação entre filosofia e teologia poderia ser expressa pela fórmula encontrada pelo Concílio de Calcedônia para a cristologia: filosofia e teologia devem relacionar-se entre si “sem confusão e sem separação”. “Sem confusão” significa que cada uma delas deve conservar a própria identidade. A filosofia deve permanecer verdadeiramente uma busca da razão na própria liberdade e na própria responsabilidade; deve ver os seus limites e, precisamente deste modo, também a sua grandeza e vastidão. A teologia deve continuar a beber num tesouro de conhecimento que não foi inventado por ela, que sempre a supera e que, não podendo jamais ser totalmente esgotado mediante a reflexão, por isso mesmo leva o pensamento a começar sempre de novo. Mas, a par do dado “sem confusão”, vigora também o dado “sem separação”: a filosofia não recomeça cada vez do ponto zero do sujeito individual que pensa, mas vive no grande diálogo da sabedoria histórica, que ela, crítica e ao mesmo tempo docilmente, acolhe e desenvolve sempre de novo; mas também não deve fechar-se diante daquilo que as religiões e, de modo particular, a fé cristã receberam e transmitiram à humanidade como indicação do caminho. Várias coisas, ditas por teólogos ao longo da história ou mesmo traduzidas na prática pelas autoridades eclesiais, foram demonstradas como falsas pela história, e hoje confundem-nos. Mas, simultaneamente, é verdade que a história dos santos, a história do humanismo desenvolvido sobre a base da fé cristã demonstra a verdade desta fé no seu núcleo essencial, tornando-a desta forma também um paradigma para a razão pública. Sem dúvida, muito do que dizem a teologia e a fé só pode ser assumido no âmbito da fé e, portanto, não pode apresentar-se como exigência para aqueles a quem esta fé permanece inacessível. Ao mesmo tempo, porém, resta verdadeiro que a mensagem da fé cristã nunca é somente uma “comprehensive religious doctrine”, no sentido de Rawls, mas uma força purificadora para a própria razão, que a ajuda a ser cada vez mais ela mesma. Com base na sua origem, a mensagem cristã deveria ser sempre um encorajamento à verdade e, conseqüentemente, uma força contra a pressão do poder e dos interesses.
Pois bem, até agora falei somente da universidade medieval, procurando, contudo, deixar transparecer a natureza permanente da universidade e da sua missão. Nos tempos modernos, abriram-se novas dimensões do saber, que, na universidade, são valorizadas, sobretudo, em dois grandes âmbitos: em primeiro lugar, nas ciências naturais, que se desenvolveram com fundamento na conexão de experiência com a pressuposta racionalidade da matéria; em segundo lugar, nas ciências históricas e humanistas, nas quais o homem, perscrutando o espelho da sua história e esclarecendo as dimensões da sua natureza, procura compreender-se melhor a si mesmo. Neste desenvolvimento, abriu-se à humanidade não apenas uma medida imensa de saber e poder; mas aumentaram também o conhecimento e o reconhecimento dos direitos e da dignidade do homem, e disto podemos apenas sentir-nos gratos. No entanto, o caminho do homem jamais pode dizer-se completo, e o perigo de cair na desumanidade nunca está esconjurado de todo: como se vê no panorama da história atual! O perigo do mundo ocidental – para falar somente dele – é que o homem hoje, precisamente à vista da grandeza do seu saber e do seu poder, desista diante da questão da verdade; significando isto ao mesmo tempo em que, no fim de contas, a razão cede face à pressão dos interesses e à atração da utilidade, obrigada a reconhecê-la como critério último. Dito do ponto de vista da estrutura da universidade: existe o perigo de que a filosofia, deixando de se sentir à altura da sua autêntica missão, se degrade em positivismo; que a teologia, com a sua mensagem dirigida à razão, seja confinada na esfera privada de um grupo mais ou menos numeroso. Mas, se a razão – ciosa da sua presumida pureza – se torna surda à grande mensagem que lhe chega da fé cristã e da sua sabedoria, seca como uma árvore cujas raízes já não chegam às águas que lhes dão vida. Perde a coragem pela verdade; e deste modo não fica maior, mas menor. Aplicado à nossa cultura européia, isto significa: se ela quiser se autoconstruir unicamente com base no círculo das suas próprias argumentações e naquilo que de momento a convence e, preocupada com a sua laicidade, se separa das raízes de que vive, então não se torna mais razoável nem mais pura, mas desagrega-se e fragmenta-se.
Assim, volto ao ponto de partida. O que o Papa tem a fazer ou a dizer na universidade? Seguramente, não deve procurar impor de modo autoritário aos outros a fé, a qual pode ser dada somente em liberdade. Para além do seu ministério de Pastor na Igreja e com base na natureza intrínseca deste ministério pastoral, é sua missão manter desperta a sensibilidade pela verdade; convidar sempre de novo a razão a pôr-se à procura da verdade, do bem, de Deus e, neste caminho, estimulá-la a entrever as luzes úteis que foram surgindo ao longo da história da fé cristã e, assim, sentir Jesus Cristo como a Luz que ilumina a história e ajuda a encontrar o caminho rumo ao futuro.

© Copyright 2007 - Libreria Editrice Vaticana

 
 

Credits / © Sociedade Litterae Communionis Av. Nª Sra de Copacabana 420, Sbl 208, Copacabana, Rio de Janeiro - RJ
© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón

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