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Passos N.87, Outubro 2007

EXPERIÊNCIA - Oriente Médio / Derrota da solidão

“Nós estamos aqui. E podemos dizer a todos: Venham e vejam”

por Roberto Fontolan

Visita às comunidades deste pedaço do mundo onde a presença cristã está cada vez mais ameaçada. Mas há quem continue a costurar a confiança, partindo de um dado: “Afirmar o positivo em tudo”


Em Beirute, eles se vêem todas as sextas-feiras na Escola de Comunidade, numa paróquia de periferia. Em Alexandria, no Egito, podem finalmente ler O senso religioso em árabe. Na Jordânia, um casal está costurando amizades. Em Jerusalém, a pequena comunidade ítalo-israelense-palestino-maronita continua a viver intensamente a experiência profética na cidade “que todos desejam, para a qual se voltam todos os corações” (palavras do Guardião da Terra Santa, padre Pierbattista Pizzaballa, pronunciadas no Meeting de Rímini deste ano). Agora nos vemos todos juntos, aproveitando a ocasião oferecida pela Assembléia Internacional, em La Thuile. Os membros do Movimento no Oriente Médio conhecem a prova, a responsabilidade, o chamado particular da vida deles. E falam à vontade, com a sabedoria de Simon ou a luz nos olhos da jovem Mariam.

Akoury , 42 anos, professor, Líbano: “Em nos-
sa pequena comunidade, com uma dezena de pessoas, há latinos, maronitas, melquitas, sírios. Somos um pedaço do Líbano, onde se praticam uns quinze ritos cristãos. Mas resistimos ao particularismo, à fragmentação. Agora os cristãos se dividem também na política (e gravemente), entre pró-sírios e anti-sírios, pró-sunitas e pró-xiitas, pró-governo e anti-governo. Vivemos sempre num pós-guerra. Houve o pós-guerra civil, que durou tanto tempo que temos dificuldade até para reconstruir as datas, e agora o pós-guerra israelense, no Sul. São muitas as fraquezas, as precariedades do nosso país. Desde o início do ano experimentamos uma consciência nova: em tudo, afirmar o positivo, dar confiança à nossa experiência de amizade e unidade. A reunião da Escola de Comunidade nunca deixou de se realizar, apesar das manifestações, das ruas fechadas, dos postos de bloqueio: ela era o nosso ponto de referência. Mas conhecemos bem a crise dos cristãos, muitos jovens querendo ir embora”.

Said , 43 anos, professor, Egito: “Esse é um grave problema também entre nós. Um cristão não encontra trabalho se o chefe da empresa for muçulmano. A vida na cidade e nos ambientes sociais é muito difícil, e às vezes até hostil. Assim, os vários grupos se fecham cada vez mais, os cristãos em suas paróquias e em suas escolas. E, para os nossos jovens, ir para o Exterior, dar um fim a todos esses problemas, acaba se tornando um sonho, quase sempre proibido”.

Simon , 55 anos, responsável Avsi, Jordânia: “Nós começamos até antes, partindo das coisas mais elementares. Aqui falta até a idéia de quem é Jesus. Para um árabe, é quase impossível falar da própria vida. A ninguém ocorre fazer isso, e muito menos na frente de outras pessoas. Há uma reserva, um senso de privacidade dos sentimentos profundos que sepulta as exigências pessoais. Partimos da simples amizade, de contar as coisas simples do dia a dia. Uma costura de confiança e de confidência recíprocas”.

Rony , 46 anos, responsável pela logística dos projetos Avsi, Líbano: “Nós estamos presentes, partimos daí, não importa quantos somos. Há famílias que durante a guerra civil puderam viver no Exterior, depois voltaram, aproveitando a calma dos anos seguintes e, por causa da guerra no Sul, fugiram de novo, desesperadas. E mesmo conhecendo a importância da convivência em nossa terra, sabendo que fomos um modelo positivo durante muito tempo, porém quando o perigo está presente, quando está em jogo a segurança dos próprios filhos, da vida, aí preferem partir. Outros, os mais jovens, vão trabalhar nos países do Golfo, ganham dinheiro e, quando voltam, a gente percebe que o ponto de vista deles mudou, têm outros interesses, o consumismo os conquistou. Devo dizer também que, em geral, os cristãos não captam a gravidade do problema. O comentário é este: eles vão para o Golfo, mas tenham a certeza de que voltarão, cedo ou tarde voltarão... Mas como retornam? Com qual mentalidade? Com o desejo de construir o quê? Esse é o ponto. Frente à tentação de fugir, que se espalha por toda parte, nós procuramos afirmar a positividade da vida, qualquer que seja a condição. Para muitos, pode ser até uma loucura, mas nós... nós fomos feitos para isso. E os sinais não faltam. Em nosso trabalho existe diálogo humano, o mesmo diálogo que normalmente existia entre dois libaneses, mesmo que de religiões diferentes. É um fato importante. E esperamos que também nós possamos começar a ler juntos O senso religioso em árabe”.

Ettore , 42 anos, engenheiro, Jerusalém: “Nossa situação é, em parte, semelhante à do Líbano e, em parte, à do Egito. Na Terra Santa, vivemos grandes tensões de ambos os lados: o árabe e o israelense. Nossa presença, nossa vida não nutre ilusões, não tem presunções. Vivemos e estamos presentes. A qualquer um podemos dizer: venham e vejam. Vejam que é possível conviver, ser amigos e até trabalhar juntos, construir algo juntos. No pouco ou no muito, o método não muda: na experiência de uma diversidade enorme, de diferenças colossais, que às vezes até assustam, o coração dos homens é, no fundo, idêntico”.

Mariam , 24 anos, professora, Egito: “Em casa vivemos, em dois cômodos, cinco irmãos e os pais; claro, precisaríamos de um pouco mais de espaço. Vejo os meus amigos e ouço a conversa deles, o cansaço, a idéia de que do outro lado as coisas estariam melhor. Eu, porém, devo dizer que esse pensamento não me ilude. Alexandria é o meu lugar, é a minha terra, a minha comunidade. Não estamos, na verdade, sozinhos, como pude ver no Meeting. Me deixa tranqüila essa nossa realidade de amizade em todo o mundo. Sei que na Itália e nos Estados Unidos, no Brasil e no Japão, vocês pensam em mim, em nós. Jesus nos quis juntos, mas juntos não significa que devemos viver na mesma rua ou freqüentar a mesma escola. Nossa amizade ajuda a formar um pensamento e o pensamento é que a solidão e o medo foram derrotados”.

 
 

Credits / © Sociedade Litterae Communionis Av. Nª Sra de Copacabana 420, Sbl 208, Copacabana, Rio de Janeiro - RJ
© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón

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