Gratidão por um chamado
Desde quando fiquei sabendo que estaria diante do Papa Bento na audiência da Fraternidade em Roma, fui tomado por um sentimento de impropriedade por reconhecer a minha pobreza frente ao significado do gesto ao qual fui chamado. Mas, aliado a isso, me invadiu um grande sentimento de gratidão. Na Itália, visitei a Igreja de São Luís dos Franceses onde vi o quadro da conversão de São Mateus, de Caravaggio. Não pude deixar de pensar em mim como São Mateus, apontando para si e dizendo: “Eu? Tem certeza?”. Esta imagem profundamente evocativa do que me acontecia naqueles dias colocou-me diante do fato de que qualquer chamado de Cristo, pequeno ou grande, é sempre absoluta gratuidade da parte dEle. Ter estado com o Papa, beijado seu anel, dito a ele que trazia um abraço de todos os brasileiros, ter ouvido dele que estará no Brasil, como a me dizer “receberei este abraço lá”, ter levado escrito os nomes e referências da Fraternidade e do Movimento do Brasil no meu bolso esquerdo, me deu uma profunda alegria. Pude reconhecer deste modo o que foi dito pelo padre Carrón: “o Papa é sinal seguro para nossa fé”, ou seja, aquele gesto confirma o nosso caminho e nos dá certeza para continuar nele. Aqui Cristo torna-se, de fato, a resposta aos meus desejos com relação à minha família, ao meu trabalho e a todos que fazem parte da minha vida cotidiana. Junto com aquelas 100 mil pessoas do Movimento, pude perceber e confirmar como este Papa tem um carinho muito grande pela nossa história, porque tem sido amigo e ajudado o nosso caminho. Como disse padre Carrón, este gesto é sinal de um novo início para mim, mas também para todos os amigos do Movimento e para a Fraternidade do Brasil, de que Cristo presente na Igreja, por meio do nosso Movimento, é a resposta ao desejo do nosso coração, que despertado num momento como esse do encontro com o Papa, deve se tornar o modo como olhar para minha mulher, meus filhos, as pessoas no meu trabalho, todas as pessoas e fatos da minha vida. Obrigado a todos pela nossa história no Movimento.
Benedito,
Belo Horizonte – MG
Manter viva a pergunta
Caríssimo Julián, no ano passado, cheguei aos Exercícios de agosto do Grupo Adulto muito cansada pela prova de algumas circunstâncias de trabalho, de casa e familiares. Naquela manhã, depois da sua palestra, no silêncio, pela primeira vez pensei que nunca tinha feito verdadeiramente o trabalho do juízo que você nos pedia. Por exemplo, nunca tinha olhado de frente o meu desejo. O meu foco sempre foi como resolver as situações e não “o que eu quero realmente, o que responde ao meu coração agora, dentro deste estado de ânimo, dentro desta preocupação”. Entendi que a lâmina é sutil, ou se faz o trabalho sobre tudo ou sobre nada, porque trata-se de um ponto de verdade sobre mim que não pode permitir selecionar as situações, os sentimentos, etc. Quando o desejo me sufocava, começava a me perguntar: “O que eu realmente preciso, agora?”, e sempre se abria uma janela incrível de conhecimento do real, um modo de olhar muito mais simples e adequado e, sobretudo, uma correspondência continuamente renovada da companhia de Jesus dentro de cada coisa que pensava ou fazia. Fiz a experiência física daquela frase de Dom Gius que você repetiu: “e tudo pertence a mim, com aquele conforto e aquele repouso que me dá a percepção do ponto de fuga que está em tudo e que remete tudo e cada coisa ao Destino último, ao Mistério último que se revelou em toda a sua potência, misericórdia e justiça: Cristo ressuscitado”. Exatamente o desejo que experimentava e tudo aquilo que vinha em conseqüência, se tornava o terreno favorável para colocar em tema o meu eu e todo o feixe de necessidades e de exigências verdadeiras no fundo do coração. Não era preciso esconder nada, era possível olhar com simpatia também aquilo que dentro de mim parecia obstáculo a uma normal expressão de mim mesma. Depois daqueles dias, o trabalho não terminou, embora torná-lo habitual ainda não seja imediato e, até hoje, o que realmente me admira é constatar como a maneira de estar diante das coisas mudou: não me assusto mais por causa do meu estado de ânimo e, portanto, não me deixo determinar por ele; mudou a maneira de encarar tanto as dificuldades cotidianas quanto os milagres que acontecem diante de mim, sobretudo na vida dentro de casa. Maravilha-me o fato de que o desejo, quando chega, posso olhá-lo e torná-lo útil ao trabalho. Mas, sobretudo, é realmente verdade que tomando nas mãos com sinceridade a minha necessidade humana, mesmo a mais oculta, brota sempre de novo o dizer: “Preciso de Ti Jesus, faz-me companhia” e a realidade se revela como o lugar de uma resposta pronta. Tocou-me muito e me acompanha sempre aquilo que você disse nos Exercícios do CLU no final do segundo ponto: “A questão é deixar-se tocar, dar espaço para o que acontece, pois só isso nos faz respirar. Todas as nossas tentativas não são suficientes, não dão nem um instante daquela novidade que entra na nossa vida por meio de um fato”. Viver com uma migalha desta consciência me permite levantar de manhã cheia de pedido e de espera diante de tudo, abrir os braços às ocasiões e aos encontros e enfrentar situações de condições excepcionais, de maneira simples e alegre. Na primeira noite do nosso Retiro de Quaresma, você retomou a frase de João Paulo II: “Não haverá fidelidade se não houver no coração do homem uma pergunta para a qual somente Deus é resposta”, e eu logo pensei que quero pedir a Jesus para ajudar-me a manter viva esta pergunta, esta necessidade do meu eu; que posso olhar de frente e estimar de modo que Jesus não seja uma palavra ou uma imagem, mas realmente o Senhor da minha vida.
Carla,
Milão – Itália
Educar é um risco
Caríssimo Carrón, há alguns meses decidimos organizar a apresentação de Educar é um risco, aqui em Manchester. Uma das características mais evidentes da vida no exterior é que, normalmente, não existe uma grande comunidade na qual misturar-se. Não faltaram dificuldades, perguntas, surpresas bonitas e feias. Porém, ter sido capazes de recomeçar não obstante os passos falsos e os tantos empenhos, já é um milagre. A preparação do encontro nos permitiu também aprofundar a amizade com duas moças da Chaplaincy (centro católico pastoral universitário; nde), Laura e Karolina, com quem nos encontramos toda semana para ler Educar é um risco. O diálogo que nasceu entre nós foi fonte de contínuas provocações e nos ajudou muito a entender a novidade da mensagem de Dom Giussani. Nesta ocasião pudemos levar a sério o relacionamento com padre Ian, capelão da universidade. Já há anos este sacerdote nos fornece uma sala da Chaplaincy para fazer Escola de Comunidade mas, até então, nunca o tínhamos convidado para participar e julgar diretamente a nossa experiência. O modo com o qual padre Ian acolheu e respondeu a esta proposta, o entusiasmo com o qual falou nos 45 minutos da sua colocação, continuamente comparando a sua experiência com passagens do livro, foi uma confirmação ulterior de que a história na qual fomos colocados se dirige realmente ao coração do homem. Isto abre cenários incríveis mas, sobretudo, nos lança nos relacionamentos com as pessoas que encontramos todos os dias. Também pedimos a Peter, professor da Universidade de Manchester, que falasse. Muito culto e finamente inglês, pertence ao caminho Neocatecumenal e é pai de 4 filhos. O modo com o qual respondeu à provocação de ler e julgar Educar é um risco foi surpreendente. Tocou-nos a frase com a qual começou seu discurso: “Esse livro não deve apenas ser lido porque permaneceria abstrato. Este livro deve ser vivido, senão não é possível entendê-lo”. O terceiro palestrante foi Dominic, um amigo de York, comovente na concretude dos exemplos que deu. Não escondemos de você a nossa surpresa em relação ao grande número de participantes, entre eles o Vigário do Bispo de Salford. Quase sem nos darmos conta, CL entrou oficialmente na comunidade católica da cidade.
Cristina, Cristian, Alessandro, Luca, Miriam, Anna,
Manchester – Inglaterra
Uma nova experiência
A minha experiência de trabalho no Centro de Solidariedade (CdS) nasceu de um encontro. Há cerca de um ano conheci Annarita e tomei conhecimento, pelo seu testemunho, das atividades desenvolvidas na periferia de Nápoles. O que ela contou me fascinou muito e, depois de me formar, espontaneamente e sem raciocinar muito expressei o desejo de fazer uma experiência de trabalho nos lugares dos quais tinha ouvido falar. Na verdade, acho que só hoje estou me dando conta, dia após dia, momento a momento, da grandeza e também da falta de simplicidade da experiência que estou vivendo. Acho que o que contribuiu para a minha escolha foi uma resposta natural a algo simples, bonito, justo e verdadeiro que me chamava a si. O fiz também, e sobretudo, por mim. Afastando-me de casa esperava poder amadurecer e crescer pessoalmente e sabia muito bem que a experiência de trabalho que tinha abraçado seria muito rica e formativa. Estabeleci um bom relacionamento com as crianças, desde que começamos a fazer atividades depois das aulas. No início, elas ficaram curiosas sobre mim pelo fato de eu vir de Milão. Tinham uma curiosidade positiva, que as fez imediatamente se aproximarem de mim. Sinceramente, ainda não consigo entender, por meio de argumentos meramente racionais, o motivo dessa aproximação tão imediata. Seria tolo pensar que tudo se deve a uma capacidade particular minha porque é claro que não pode ser isso e seria presunção e limitação pensá-lo. As crianças com as quais tenho contato vivem em situações muito difíceis, mas têm um grande e imenso coração. Talvez isso tenha feito a diferença: o coração. Primeiro, foram as crianças que se abriram para mim e eu, consequentemente e como uma resposta semi-automática, me abri a elas. Assim, as atividades vespertinas, os passeios, a festa de Natal contribuíram para me fazer sentir parte deles e isso fez com que os pais e as crianças, hoje, me olhem de um modo muito verdadeiro e bonito e se dirijam a mim como uma pessoa que é parte integrante do CdS. Acho que abracei esta nova experiência com um pouco de inconsciência não percebendo, exatamente, o quanto estava me distanciando da minha vida de sempre, não me dando conta de que distante dos afetos de cada dia, num certo momento, tudo pareceria mais difícil. Para mim foi uma grande novidade ler, junto com os colegas de trabalho, o livro de Dom Giussani, Educar é um risco. Conheci Dom Giussani com os meus pais que, desde a juventude, freqüentam o Movimento. Sinceramente, nunca senti necessidade de participar de CL e de me aproximar tanto desta maneira de estar juntos, porque sempre encontrei em outros lugares e companhias ocasião para refletir de algum modo sobre a minha realidade e, na verdade, sempre julguei CL como algo que era muito distante de mim, muito artificial, muito ligado à idéia de companhia que inclui e, ao mesmo tempo, exclui. O que aprendi nestes meses foi, ao contrário, que a companhia é um dom sempre necessário. Assim, ler juntos com os outros as palavras de Dom Giussani foi e é, ainda hoje, não uma adesão estéril a uma organização religiosa, mas estar ao lado de pessoas com quem dividir dúvidas e incertezas e, juntos, aprender a olhar a vida e a realidade de modo eficaz. O trabalho no CdS me estimula a estar realmente junto com os outros e me chama a tomar em primeira pessoa uma responsabilidade que é, realmente, comum porque é parte de todos.
Carta assinada
Quarenta anos no Brasil
No dia 25 de fevereiro a comunidade de Belo Horizonte organizou uma festa para comemorar os 40 anos de missão no Brasil da italiana Rosa Brambilla. A seguir, a carta que ela escreveu em agradecimento a todos os seus amigos.
Caríssimos amigos, com o coração comovido e transbordante de alegria pela grandiosa festa realizada pelos amigos com amor e sacrifício, no dia 25 de fevereiro, em comemoração aos meus 40 anos de presença no Brasil, desejo comunicar a cada um de vocês o que foram pra mim estes anos. Olhar este pedaço de história é reconhecer antes de tudo o espetáculo de Misericórdia que meus olhos presenciaram – uma Misericórdia encarnada dentro da companhia dos amigos que me abraçaram assim como sou e sempre me colocaram “de pé”. Dom Giussani, em 8/9/67, dizia-me numa carta: “Não tenha medo de nada dentro ou fora de você, como disse o Anjo a Maria. Confia em Nossa Senhora como uma menina; e louva a Deus no seu coração, que te escolheu assim como você é, e te transformará no que Ele quiser. Do seu afetuoso Dom Gius”. E ainda em outra carta de 7/12/68: “Deus te colocou no mundo e te fez ir pro Brasil para ajudar os homens, para fazê-los conhecer Jesus Cristo e ajudá-los a viver a vida cristã que é a verdadeira vida humana. Ama Jesus Cristo, Rosetta, com todo o teu ser, e usa a caridade com todos até o ponto de romper seu coração. A sua mãe, tão boa, certamente te quer assim. Abraço-te e te encorajo. Do seu Dom Gius”. O tempo tornou visível a certeza da graça inexaurível, da fidelidade de Deus mesmo com os meus limites e minhas traições. Obrigada de coração pela amizade de vocês e por fazerem parte da minha história. Um grande abraço.
Rosa,
Belo Horizonte – MG
Graças a uma experiência no Japão
Sou peruano e conheci o Movimento Comunhão e Libertação na cidade de Hiroshima, onde vivi quatorze anos ilegalmente, trabalhando para ajudar minha família. Fui transferido para a cidade de Osaka onde fui preso no Centro de Imigração. Lá, encontrei pessoas de diferentes nacionalidades, vindas da América Latina, Ásia e Oriente Médio. A despeito das diferenças de língua, cultura e religião, criamos laços de amizade, dado que a maioria dominava a língua japonesa, se não completamente, pelo menos 70%, o que serviu para que conseguíssemos nos comunicar. A maior parte de nós estava nesse Centro por ser “clandestino”, à espera de ser transferido. Cada um tem uma história diferente, porém, todos chegamos neste país com um único objetivo: trabalhar pela própria família ou para manter os filhos na escola nos respectivos países de origem. Durante a minha permanência no Japão aprendi a amar Cristo segundo a doutrina da Igreja Católica, a qual me ensinou a olhar a vida sob um outro ponto de vista. Em particular, este: que de cada sofrimento sempre surge a luz porque Deus sempre dispõe as coisas segundo a sua imensa sabedoria. Conforme os dias transcorriam, percebia que a maioria, aqui, era cristã: católicos, protestantes ou testemunhas de Jeová e, cada um, tinha sua Bíblia na respectiva língua. É por esse motivo que, junto a dois amigos americanos protestantes, decidimos ler a Bíblia e rezar. Depois de uma semana, o pequeno grupo aumentou consideravelmente, fazendo-me entender que havia muita sede de Deus. Todos demonstravam interesse pelo estudo da Palavra de Deus e pela oração, e os participantes eram de países distantes como Nepal, Filipinas, Sri Lanka, Indonésia e Coréia assim como de países sul-americanos como Brasil, Peru, Chile e Bolívia. Por isso, não hesitei em pedir ajuda a um grande amigo: padre Arnaldo Negri, de nacionalidade italiana. Foi graças a este padre católico que encontrei o Movimento de CL na cidade de Hiroshima, e conheci, por meio deste Movimento, com mais profundidade, o Mistério. Ele passou a me fornecer, periodicamente, a revista Passos, tanto em espanhol quanto em português, além de abundante literatura sobre o Evangelho de cada semana em inglês, espanhol e português. Isso nos ajudou e nos fortaleceu muito nos nossos encontros, o que se traduziu no amor por Jesus Cristo ressuscitado e na possibilidade de aprofundar a amizade com pessoas que nunca tinham se visto antes, de culturas diferentes, mas unidos por uma só fé em um único Deus. Assim, experimentávamos uma emoção indescritível, escutando a leitura da Bíblia na própria língua e, depois, ouvindo comentários da leitura em japonês ou diferentes orações a Nosso Senhor nas diversas línguas. Como diz na Carta aos Efésios 4,3-4: “Sede solícitos em conservar a unidade do Espírito por meio do vínculo da paz. Sede um só corpo e um só espírito”. Realmente, me dei conta de que Jesus estava entre nós.
Roberto,
Osaka – Japão
A familiaridade de Cristo
Caríssimo padre Julián, um jovem, filho de amigos da Fraternidade, foi estudar em Trieste. Pediu para conversar comigo e me contou todas as suas dificuldades e objeções em relação aos universitários (CLU), um pequeno grupo que, além de tudo, está dividido em dois. Eu pedi a ele que me descrevesse seu dia e, no final, lembrando de você, lhe disse: “Quem e o que lhe impede de pedir Cristo durante o seu dia?”. Ele abaixou a cabeça, agradeceu e foi embora. Soube, algum tempo depois, em uma conversa sobre o CLU, que este rapaz, que tinha tantas objeções a ponto de não querer se inscrever na Escola de Comunidade, mudou de postura e se tornou a pessoa mais viva dos encontros. Nunca teria dito a ele aquela frase se não tivesse sido educado, pela nossa companhia com você, a reconhecê-la como a mais familiar no meu dia: “Quem és tu que me preenches com a tua ausência?”. E, ontem à noite, na Assembléia de Responsáveis da comunidade de Chioggia, a uma pessoa que me perguntou: “O que quer dizer apoiar em Cristo toda a minha humanidade?”, respondi que para mim a pergunta verdadeira é: “O que é a minha humanidade sem Cristo?”. Assim, lentamente, de pergunta em pergunta, Ele se torna mais familiar.
Mario,
Pádua – Itália
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