A escolha maior
Caríssimos amigos,
não me foi concedida a permissão para entrar na prisão, como tanto desejei. Por isso lhes escrevo, para poder, desse modo, também participar da alegria de vocês. Estou muito feliz por saber que Bledar começará um caminho para preparar-se para se tornar cristão, como eu mesmo comecei, no dia 20 de setembro. É muito bonito o que você está fazendo, Bledar, porque eu vi que este caminho que me prepara para o Batismo é a escolha maior que já fiz na vida. A partir daquele momento, minha vida encontrou um sentido, e acho que, seguindo este caminho, ele será cada vez mais carregado de certeza. Desde que comecei a percorrê-lo, percebo que meu caráter está mudando. Por exemplo, eu era muito nervoso e ficava furioso quando alguma coisa não funcionava ou me incomodava, mas agora estou muito calmo e sereno diante das coisas que acontecem, porque na minha mente Jesus me corrige e me mostra como devo viver e onde devo ir. O Evangelho de Marcos, que escreveu a história de Jesus e que estou lendo, me agradou muito, e fiquei tocado pela maneira como Jesus superava as dificuldades e enfrentava as coisas. Eu não posso fazer milagres, porque só Ele pode fazê-los. Mas vejo que ele os faz para mim e para vocês. Agradeço a Deus, que me dá uma segunda vida, porque por aquilo que fiz, devia ser deportado para a China e lá, corria risco de sofrer pena capital. Mas Jesus salvou-me, fazendo-me permanecer aqui. É muito bonito que você, Bledar, tenha escolhido como nome cristão o de João, enquanto eu, escolhi André. Você sabe que André e João foram os dois primeiros que encontraram Jesus e o seguiram? Ouvi dizer que Umberto também está se preparando para receber a Confissão, a Comunhão e o Crisma. Você está um passo à minha frente, Umberto, porque eu sou apenas um catecúmeno, mas não se preocupe, porque eu também chegarei onde você está. Quero cumprimentar a todos e dizer que rezo por vocês, para que possam superar as dificuldades e sair da prisão o mais breve possível. Tenho certeza de que o Senhor me escuta, porque sou o único chinês que reza.
Ye André
Por aquilo que somos
Foi uma cerimônia inesquecível desde o primeiro instante e, para mim, desde que decidi abraçar o cristianismo. Percebo que o Senhor nos ama por aquilo que somos, que não é preciso complicar a vida para sermos amados por Ele: basta dizer sim a Cristo para sentir que está perto de nós. Eu sabia muito pouco sobre o cristianismo, não sabia que era tão bonito e cheio daquele amor que só uma mãe pode dar. Eu, caro Bispo, nasci no mesmo bairro de Madre Teresa de Calcutá: sempre ficava impressionado quando ouvia falar dela, mas não podia me aproximar da religião por causa do regime. Agora, entendo melhor o que significa ser cristão. Sobretudo quando vejo meus amigos, que vêm à prisão para trabalhar conosco, e meus companheiros de cela que seguem o caminho de Jesus Cristo. Há alguns anos, nasceu, aqui, um grupo de CL, que faz Escola de Comunidade. É exatamente graças a isso que minha vida está mudando: embora esteja na prisão com culpas muito pesadas, meu coração e meu espírito estão encontrando a alegria que nunca tinham encontrado.
Bledar Giovanni ao Bispo de Pádua
Hoje renasci mais uma vez
Caríssimos amigos, que carga de bem e de amor puro vocês nos deram. Para explicar todos estes fatos, não há palavras: eles podem ser simplificados em uma, se se pode ousar dizê-la, que se chama Mistério. Mas o que foi isso que aconteceu? Para que serviu? Conto aquilo que vi com meus olhos. Há muito tempo não se via um dia assim, nunca vi uma alegria assim em meus companheiros. A emoção em seus olhos era evidente, estou cada vez mais convencido de que algo está mudando de maneira positiva, que eles também percebem que estão mudando. Aquela alegria que os fez esquecer por um tempo que estavam na prisão, tornando-os partícipes, como não lhes acontecia há muito tempo ou nunca, os fez pensar que tudo isso não aconteceu por acaso mas pela vontade de alguém que nos ama, mesmo que o tenhamos traído. Percebi isso quando me aproximei dos meninos: “Franco, que dia bonito, cheio de serenidade, emoção e paz”. Ver um dos meus companheiros, que hoje também disse sim pela primeira vez, e estava ali conosco, cantando e rindo, me fez pensar apenas em uma coisa: Jesus está me enviando outra mensagem evidente, fez brotar algo naquele coração. Obrigado por me fazer perceber isso, obrigado por ter escutado meus pedidos. Eu sentia o coração batendo como nunca: isso tinha me acontecido apenas uma vez, quando minha filha nasceu. Hoje posso dizer que nasci outra vez, que dia a dia Ele nos ama cada vez mais, se vivemos com seu amor. Posso renascer todos os dias se digo sim a Cristo. Posso dizer a todos que se disserem sim ao Senhor, Ele dará a vocês aquilo que dá a mim. Foram necessários quarenta anos para que eu sentisse Seu amor, foi necessário tanto tempo porque Ele me criou livre. Não é a prisão que faz você mudar, no caso nos embrutece, mas é o amor que se sente, aquele bem que faz você pensar que é você que não entende ou faz de conta que não entende. Na prisão existe aquela velha regra que não se deve dar confiança a ninguém de fora, porque há algo por trás, quando vêm aqui. Padre Eugenio disse na homilia: “O que vocês possuem na prisão que têm toda esta serenidade, que encontram Cristo dessa maneira? Devem ter um truque”. Nós também pensávamos assim. Na verdade, não havia nada que pudesse ser feito de um homem, é apenas obra de Jesus Cristo, é Ele que nos faz! O bonito é que, pouco a pouco, todas aquelas velhas regras estão se desfazendo, precisamos viver como se nada existisse. Vocês nos ensinaram todos esses valores quando éramos pequenos, nós apenas lhes tiramos o pó e colocamos em uso.
Franco
“Tu convicium times...”
Sábado à noite, quando voltei à Paróquia para celebrar a missa, vi-me diante da parábola do filho pródigo. Não pude deixar de me comover ao perceber que aquilo que Jesus conta tinha acontecido diante de mim algumas horas antes. Bledar, Umberto, Ye... são exatamente aquele filho que volta para casa. Voltaram surpreendidos por alguém que corre para abraçá-los. Sem a gratuidade deste abraço não teriam voltado. Esta história de Graça brilhou diante de todos, dentro dos muros da prisão. A missa, com tantos amigos, foi literalmente aquele abraço. E, para não tirar nenhuma vírgula do Evangelho, depois houve a festa. Familiar, grandiosa e bonita, como aquela preparada pelo pai na parábola. Santo Ambrósio dizia: “Tu convicium times, adornat ille convivium”. “Você espera uma reprovação e ele lhe prepara um jantar”. Esta é a Misericórdia de Deus, que vejo todas as vezes que entro na prisão para dar catecismo. Fico tocado com a alegria de Bledar, tão agradecido, que tudo nele mostra isso: a maneira como me abraça, como prepara o café, com a qual envolve os companheiros. Está tão afeiçoado a Jesus que, às vezes, penso que seu coração cheio de desejo já tem dentro toda a Graça do Batismo.
padre Lucio Guizzo
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