A experiência do Mistério na tradição Russa Padre Men, assassinado em 1990, gostava de repetir: “A razão é imagem e semelhança do Logos divino”. As lembranças de seu irmão durante o Meeting. A contribuição do pensamento cristão russo
Não foi por acaso que uma das grandes figuras apresentadas no Meeting este ano tenha sido a de padre Aleksander Men’, sacerdote ortodoxo que, certamente, passará para a história como o Apóstolo da Rússia do século XX, barbaramente assassinado por desconhecidos em 1990, (cf. CL-Litterae Communionis, nov/dez 1990, p.15) exatamente nos meses em que a ideo-logia se debatia desesperadamente para manter o controle do país. O que fascinava padre Aleksander – em anos em que a fé e a Igreja eram rigorosamente banidas da sociedade – era o seu olhar voltado à Presença viva que se encarna na realidade e que se torna encontrável para o homem. Como testemunhou o irmão Pavel, durante o encontro: “Ele entendeu que a coisa principal que o cristianismo transmite é a abertura ao mundo. Gostava de salientar que Cristo se fez pequeno para encontrar a humanidade”. Padre Aleksander propôs um encontro vivo com Jesus às novas gerações soviéticas, às quais havia sido inculcada a idéia de que Cristo era uma das tantas figuras mitológicas da humanidade, valorizando – no sulco da tradição cristã – a razão humana que tende ao seu Arquétipo. Ele escreveu, em 1971: “A razão do homem é imagem e semelhança do Logos divino e, por isso, a Igreja, falando da Encarnação de Deus, usa esta expressão: ‘Brilhou no mundo a luz da Razão’“.
Método educativo
Padre Aleksander e Dom Giussani não se conheceram pessoalmente. No entanto, sua semelhança, sua afinidade de experiência e método educativo são documentados pelas milhares de pessoas que visitaram a Mostra e participaram da sua apresentação. Eu mesma, muitas vezes, ouvi Dom Giussani lembrar esta frase de padre Aleksander: “O ponto de força do cristianismo consiste exatamente em não negar nada, consiste na afirmação, na amplitude, na plenitude de horizonte que afirma tudo”. A experiência do cristianismo oriental, em particular russo, é exatamente esta percepção viva do Mistério que se faz encontro ao homem em cada coisa para dar a razão de tudo sem censurar ou esquecer nada: na beleza da liturgia, basta pensar nos jovens que recitavam poesias na Praça Majakovskij. Padre Aleksander foi, sob muitos aspectos, o ponto conclusivo da grande experiência de redescoberta do cristianismo iniciada na Rússia há quase dois séculos – quase paralelamente com a variante do iluminismo ateu introduzida com punho de ferro na cultura oficial por Pedro, o Grande e Catarina II.
As “questõs malditas”
A mesa redonda sobre “Fé e Razão no Cristianismo Russo”, que o Meeting realizou, nasceu do desejo de testemunhar essa tradição, ou seja, o drama vivido pela razão humana que, para ser verdadeiramente si mesma, não pode deixar de comparar-se com as “questões malditas”, ou seja, levar até a soleira do Mistério. Nisso, como salientaram os relatores – Sergej
Capnin, diretor do semanário
Patriarcado de Moscou; Aleksander Archangel’skij, um dos mais conhecidos apresentadores de talk-show na televisão e colunista da Izvestija e padre Georgij Rjabych, assistente do Bispo metropolitano Kirill – se demonstra a contribuição original do pensamento cristão russo e, também, a raiz comum que anima profundamente as diversas tradições cristãs e permite o reconhecimento da unidade como dado original e fundamental. Uma percepção do cristianismo que Dostoievskij soube exprimir bem em uma frase bastante contestada pelos racionalistas ocidentais: “Se me dissessem que a verdade está de um lado e Cristo de outro, escolheria Cristo”. Não por irracionalidade, mas pela cons-ciência clara expressa por Santo Agostinho, segundo a qual a verdade pode ser sempre e somente uma Presença viva, quer dizer, “vir qui adest” (um homem presente).
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