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Passos N.76, Setembro 2006

CULTURA - CIÊNCIA | A AVENTURA DA DESCOBERTA

Entrevista com Beckwith e Nelson: O infinito dentro das estrelas

por Mario Gargantini e Michelle Riconscente

Dois cientistas falam sobre o desafio sempre maior da pesquisa sobre a realidade física sem nenhum constrangimento por terem fé. Uma fé razoável

Eles sondam o infinito com instrumentos diferentes, mas com a mesma paixão: Steven Beckwith, desfrutando do potente olho do Telescópio Espacial Hubble; Edward Nelson, com o rigor das demonstrações matemáticas. Pedimos a ambos que nos contassem como aconteceu, na experiência deles, o impacto com o infinito.
Steven Beckwith. Pra mim a visão das estrelas sempre foi um estimulante chamado ao infinito. Quando eu era jovem fiquei marcado por um mapa das galáxias no qual eu percebi as incalculáveis dimensões do universo e fiquei entusiasmado por um livro de George Gamow que contribuiu para alimentar em mim a paixão pela ciência.
Depois, na escola, quando aprendi sobre a relatividade me deparei com o paradoxo de poder perseguir o infinito e aproximá-lo tangencialmente através de uma quantidade finita como a velocidade da luz. Estudando a física quântica também me surpreendi com a dimensão do infinito, que consente acessar o mundo do infinitamente pequeno sem a necessidade de localizar as partículas em determinados pontos. Dedicando-me, enfim, à cosmologia, cresceu em mim a confiança nas possibilidades que o homem tem de conhecer a realidade e aproximar-se sempre mais do infinito.
Edward Nelson. Quando eu tinha 16 anos me fascinei por um livro de Bertrand Russel, Introdução à Filosofia Matemática, que eu li em italiano porque passava um período em Roma. A partir dali conheci as teorias de Cantor que me revelaram uma abordagem totalmente nova do infinito.

Diante das enormes potencialidades de observação oferecidas pelos instrumentos hoje disponíveis, qual é a postura que vocês têm com relação às capacidades cognoscitivas do homem: a esperança de poder conhecer tudo, ou o desconforto diante de uma batalha perdida na largada, ou o que mais?
Beckwith. Eu sempre considerei extraordinária a fecundidade do método científico que nos permite ter acesso a áreas de conhecimento sempre mais vastas: método que é a união que deu certo entre a nossa capacidade de imaginar explicações e a severidade dos controles experimentais.
Quando eu estava no colegial nunca imaginei que em poucos anos nós chegaríamos onde estamos agora e teríamos amadurecido uma consciência tão apurada do cosmo em distâncias tão grandes. Hoje estudamos o universo nos seus primeiríssimos instantes de vida, e também é maravilhoso poder conhecer até algum detalhe daquilo que aconteceu poucos segundos depois do big bang. Pessoalmente sou muito otimista com relação às capacidades da ciência de melhorar a nossa consciência do universo e de entrar com profundidade na sua história. Com isso não quero dizer que a ciência possa fornecer respostas a perguntas como aquela sobre o objetivo e o significado da natureza, perguntas que sempre fizeram parte da reflexão religiosa do homem. Não creio que a ciência possa ameaçar a fé, mas que pode até fornecer aos crentes uma visão mais clara e precisa da natureza à qual ele possa aplicar a sua fé.
Nelson. Tem uma célebre expressão de Newton que a meu ver descreve bem a postura com a qual é interessante fazer ciência: o grande cientista inglês dizia que se sentia como uma criança que fica contente quando encontra uma conchinha na praia ou uma pedra com um formato especial, enquanto o grande oceano da verdade permanece inexplorado diante dele. Os grandes cientistas têm expresso esta postura de humildade, de quem se dá conta do quanto ainda existe para ser descoberto. E isso não é pessimismo ou falta de confiança nas nossas capacidades; é, antes, um senso de maravilha que também se afirma em ocasião da menor descoberta.

Como o trabalho de pesquisador contribui para determinar a visão que os senhores têm da realidade?
Beckwith. A pesquisa científica nos impulsiona a nunca nos satisfazermos com uma teoria e avaliar todas as possibilidades. Por isso tende a formar uma mentalidade aberta, a viver a vida como aventura pronta para reconhecer o que acontece.
Nelson. Na primeira metade do século passado os físicos aceitaram uma interpretação da mecânica quântica que levava a negar a objetividade do mundo real e a pensar que a realidade física fosse o resultado de uma construção matemática. É curioso que, enquanto isso, a maioria dos matemáticos fosse propensa a crer na objetividade dos sistemas matemáticos construídos por eles mesmos. Quando eu era jovem pensava que a matemática não tivesse nada a ver com a minha fé, mas agora não: quando alguém vai bem a fundo de um âmbito específico, se aproxima do coração de tudo.

A visão e a prática da ciência como expe-riência positiva é claramente um problema educativo: como os senhores pensam que se deva enfrentar o ensino das ciências?
Nelson. Tenho em mente algumas experiências interessantes onde os docentes não se preocupavam em transmitir noções, mas utilizavam os próprios conhecimentos para despertar perguntas e assim solicitar a curiosidades dos estudantes e a capacidade deles de encontrar as respostas.
Beckwith. Eu também acho que precisamos de educadores capazes de transmitir o sentido da beleza e a satisfação que derivam da aplicação das nossas faculdades mentais em algo criativo e a possibilidade de chegar a conhecer algo do universo.

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Edward Nelson nasceu em Decatur, Georgia (EUA), em 1932. Completou seus estudos na Universidade de Chicago e seguiu a carreira acadêmica. Desde 1964 é docente de Matemática no Departamento de Matemática da Universidade de Princeton. Realizou numerosos estudos sobre a física matemática e é autor da Internal Set Theory, uma teoria que contribuiu para o desenvolvimento da lógica matemática.

Steven Beckwith nasceu nos Estados Unidos em 1951. É graduado em Física e Engenharia. Desde 1998 é diretor do Space Telescope Science Institute, local onde são recebidas e re-elaboradas as informações do Telescópio Espacial Hubble. Também trabalha como professor de Física e Astronomia na Universidade Johns Hopkins (Baltimora, Maryland).

 
 

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© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón

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