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Passos N.75, Agosto 2006

SOCIEDADE

2.Políticas públicas e subsidiariedade

ormalmente, pensamos o Estado como o planejador, coordenador, gestor e executor de políticas públicas que atendem à população. Mas isto gera uma série de conseqüências bem diferentes daquelas esperadas nos discursos oficiais. Quatro delas são bem conhecidas:
1) A “burocratização” dos serviços, que passam a funcionar não mais para o bem das pessoas, mas sim para a própria manutenção da máquina burocrática. A instituição passa a existir para si mesma e não mais para o atendimento das necessidades dos outros. Salários incompatíveis (tanto para mais como para menos), normas burocráticas que se prestam a controlar o serviço, mas não melhoram o atendimento, crescimento excessivo de alguns setores em detrimento de outros... Os sintomas são muitos e quem já procurou utilizar estes serviços os conhece bem.
2)O uso político dos órgãos promotores destas políticas sociais, que se tornam os famosos “cabides de empregos”, “trampolins políticos” ou meios para “compra de votos”.
3) Num país tão grande e heterogêneo como o Brasil, dificilmente uma determinada política pública terá o mesmo sucesso em todos os lugares. Como o Estado não pode chegar ao detalhamento necessário destas políticas, dando-lhes “cor local”, freqüentemente programas considerados geniais em uma realidade urbana acabam se revelando um fracasso para as populações rurais, o que dá certo no Sul acaba não dando certo no Norte, e assim por diante.
4) Os gastos também crescem astronomicamente, por conta do sustento do gigantismo da máquina pública, da ineficiência dos órgãos burocráticos, de seu uso político etc. É bem conhecido pelos estudiosos da área, que as principais causas para o fracasso de tantas políticas públicas no Brasil são a ineficiência administrativa e a descontinuidade, muito mais do que a falta de recursos.
Além disto, com este centralismo, a luta pela manutenção do poder e pelo controle estatal se tornaram os principais objetivos de qualquer ação social. Se tudo deve ser feito e controlado pelo Estado, não tem sentido trabalhar por outra coisa que não seja “tomar o poder”. Os fins passam a justificar os meios e o exercício do poder perde sua função social.
Com isso, os movimentos e as organizações sociais que, após passarem anos lutando e se preparando para dar respostas satisfatórias a determinadas demandas da população, acabam sendo “cooptadas” por quem tem o poder político ou dinheiro para financiá-lo. Assim, acabam repassando para o Estado o trabalho e as obras que desenvolveram. Geralmente, aquilo que era feito com amor e dedicação por pessoas realmente envolvidas nos problemas, passa a ser realizado como tarefa burocrática, coordenada por decisões que chegam de gabinetes distantes da realidade local. Se perde tanto a eficiência quanto o dinamismo social que gerou aquelas soluções dos problemas.
Esta postura não apóia nem desenvolve o protagonismo, a criatividade e a responsabilidade de cada pessoa ou grupo dentro da vida social. Cada um de nós tem em si a necessidade de construir um mundo que seja conforme as nossas idéias, nossa visão de mundo, nossos objetivos na vida. Quanto mais o Estado determina a forma como serão atendidas as demandas sociais, mais quem detém o poder determina como é o nosso mundo e menos espaço temos para exercer o protagonismo em nossa própria vida. Num mundo em que não somos protagonistas, também não nos sentimos responsáveis e acabamos por delegar cada vez mais a outros aquilo que é nossa tarefa, nos conformando às imposições do poder.
Por isto, as políticas públicas devem ser capazes, ao mesmo tempo, de respeitar o protagonismo e a criatividade das pessoas e grupos sociais na superação de suas dificuldades. Isto não quer dizer um Estado distante ou apático diante das demandas sociais, que se omite
diante dos abusos do poder econômico. Quer dizer um Estado subsidiário, isto é, que se esforça para apoiar, subsidiar as pessoas e os corpos intermediários, na medida em que estes, por meio de suas capacidades de associação e organização, enfrentam e encontram soluções para seus problemas. É um Estado que respeita e valoriza as organizações já criadas na sociedade para satisfazer às demandas da população. O mais sábio é que o Estado, vendo que estão realmente cumprindo sua tarefa de forma adequada, apóie estas iniciativas e viabilize sua manutenção.
Nesta perspectiva, passamos a ver a concretização das políticas públicas como o resultado da ação de uma rede de “sujeitos sociais”, isto é, instituições, comunidades, movimentos, cada uma delas criando espaços onde cada pessoa pode viver como protagonista responsável pela construção da sociedade em que vive preservando as características e soluções encontradas por cada realidade em particular. O Estado não perde o seu papel, pois cabe a ele colaborar para que estes sujeitos sociais tenham condições adequadas para desenvolver todo o seu potencial criativo, mas a sociedade não fica à mercê de quem detém o poder político.

 
 

Credits / © Sociedade Litterae Communionis Av. Nª Sra de Copacabana 420, Sbl 208, Copacabana, Rio de Janeiro - RJ
© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón

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