Publicamos trechos do testemunho de padre Claudio Del Ponte, mestre de noviços do mosteiro do mosteiro beneditino da Cascinazza, na entrada de Milão, durante os Exercícios Espirituais dos Memores Domini em La Thuile (Itália), no dia 1º de agosto de 2005.
Desde o surgimento do Cascinazza, o olhar do Dom Gius captava de modo único a novidade, o milagre que o Senhor estava fazendo nascer. Sua paternidade nos acompanhou sempre: naquela primeira década, de modo muito discreto, mas constante e preciso, estimulando-nos sempre à obediência; na segunda década, de modo extraordinário, apaixonado, chegando a nos dizer, por exemplo, com um ímpeto que podeis imaginar: “Tenho vontade de vos fazer dilatar à força!”. Aqueles anos, especialmente o de 1982, foram decisivos para nós. Éramos uns 7 ou 8 e estávamos preparando as Constituições, para que a Igreja reconhecesse a nossa experiência. E o Dom Gius nos acompanhou de perto, mostrando-nos a Graça e a responsabilidade que Cristo dava à nossa vida. Aos poucos, fomos percebendo que, ao criar a Cascinazza, o Senhor estava criando um lugar de Graça, uma casa em que Ele queria, antes de tudo, entregar-se, para realizar a humanidade daqueles que Ele chamava, que Ele convocava. Esse chamado comum à própria realização podia se tornar, nas mãos de Deus, um instrumento para a reconstrução de todo o Seu povo.
Dom Giussani nos fez, assim, redescobrir a grandeza de São Bento e da experiência dele. Antes de tudo, o objetivo da vida monástica, que está em viver a vida cristã de modo paradigmático, isto é, o mais intensamente possível, com o único objetivo de evidenciar maximamente a presença de Cristo e a unidade entre nós criada por Ele, fazendo de nós um só corpo. “Esse – dizia-nos Dom Giussani – é o coração da mensagem beneditina da primeiríssima hora, que sublinhou a organicidade, as implicações orgânicas desse Evento.”
Ora et labora
Então o método, a estrada, é a memória de Cristo, a consciência dessa Presença que faz tudo, que invade e transfigura toda a nossa vida. “A coisa verdadeiramente capital – nos dizia – é a consciência do porquê estão aqui. É preciso que vocês reflitam continuamente sobre o motivo pelo qual estão juntos. E o motivo é um só, a presença de Cristo, a fim de que, com a vossa unidade, possam dar testemunho ao mundo”. O mosteiro nasce como sinal físico da afeição de Cristo pelos homens e, portanto, do nosso amor por Cristo, como o lugar em que mais agudamente se realiza esse coração de todos: a busca de Cristo, a admiração e a adoração de Cristo, a fome e a sede de que Ele venha, mas que venha no concreto, dentro de todas as relações: consigo mesmo, com os outros e com as coisas. Eis o sentido do lema ora et labora, que o Dom Gius nos ajudou a redescobrir e a valorizar, como um apelo à unidade da pessoa, à unidade da vida. Na estabilidade de um perímetro fixado (a clausura), numa família estável, onde a pessoa se fixa estavelmente na memória, torna-se mais fácil para os cristãos encontrar o exemplo e, por isso, tanto lavar os pratos como introduzir dados no computador, são para viver intensamente a divindade do instante, na atitude de oferta. O abade Brasó, que tanto apoiou o início da Cascinazza, dizia a esse respeito que “dentro da Igreja, o monge não tem a missão de ser um homem de ponta, de abrir novos caminhos. A sua missão, sobretudo, é assumir, aprofundar e iluminar com a luz da eternidade as coisas corriqueiras”. Isso será possível se em todas as relações eu tender à Raiz da qual nascem todas as coisas e todas as pessoas. Esse dinamismo é a oração, isto é, o tomar consciência de que neste momento a vida é feita por um Outro. Fiquei muito impressionado quando, há três anos, Dom Gius, falando aos universitários, disse que “a oração é o posto avançado da nossa humanidade, da nossa humanidade em batalha..., a última trincheira da batalha da nossa vida”.
O espaço e o tempo
O fato de o mosteiro ser o sinal físico, orgânico, do amor, daquela condescendência com que Cristo nos trata, esse fato transfigura o modo de viver o espaço (entre as paredes da cela ou no perímetro da clausura) e o ritmo do tempo, com o som da campainha, que pelo menos dez vezes ao dia nos chama para um gesto comum (a oração, as refeições, os encontros comunitários), mas sobretudo esse fato transfigura as relações entre nós. Não vivo uma verdadeira afirmação de Cristo se isso não implicar a afirmação do outro, com “o” minúsculo, do outro tal como ele é aqui e agora. Não vivo uma verdadeira afirmação de Cristo se esta não for uma verdadeira obediência, total e sem reservas, à companhia e a quem a guia.
Mútua estima
Dois apelos de Dom Giussani tiveram particular influência sobre meu crescimento, nestes últimos 20 anos. O primeiro, quando dizia que “todo sacrifício pela unidade é sempre o melhor sacrifício. A gente acerta sempre”. E o segundo – depois de um duro desacordo entre nós, que ele resolveu – quando nos dizia, numa saudação: “Em todo caso, a raiz profunda pela qual devemos sempre zelar é a estima mútua, porque é aí que o demônio mete o seu rabo”. Viver esse dinamismo é a estrada para a plena realização do meu eu. Entre nós está se tornando cada vez mais evidente que o Senhor me dá a presença dos outros, não importa como eles são ou como vivem, com um objetivo preciso: fazer vir à tona o melhor de mim mesmo. Mesmo quando o outro é cheio de limites ou até nos prejudica, o Senhor o permite com esse objetivo, para arrancar o melhor de cada um de nós, ou seja, a gratuidade. Gostaríamos simplesmente de vos testemunhar que com esse vaso de barro, que é a nossa vida, a pessoa de Jesus está operando coisas grandes. E isso não é só para nós, mas para todos, e antes de tudo para vós dos Memores Domini, que sois os mais queridos.
Credits /
© Sociedade Litterae Communionis Av. Nª Sra de Copacabana 420, Sbl 208, Copacabana, Rio de Janeiro - RJ
© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón