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Passos N.65, Setembro 2005

MEETING 2005

As dimensões do mundo

por Roberto Fontolan

Nos pavilhões da Feira, os grandes temas internacionais. E o testemunho de quem trabalha para o bem do homem

A viagem do Meeting fora das fronteiras italianas é realizada por meio de grandes encontros, e composta por líderes e nomes importantes; mas a arquitetura que sustenta o palco é feita por histórias como a de Gregoire ou a dos missionários da Fraternidade São Carlos Borromeu que atraíram centenas de pessoas, várias vezes ao dia, interessadas em ouvir sobre seu trabalho na Sibéria, no Paraguai e nos Estados Unidos. Ou, ainda, a de irmã Maria, do Quênia, que luta incansavelmente contra a violência sexual.
Em sete dias, o Meeting permitiu dar a volta ao mundo. Este caminhar globalizado é a sua vocação universal. Na grande avalanche de personagens, imagens, livros, testemunhos, estandes, palestras ocasionais e análises acuradas, podemos destacar alguns grandes temas: Desenvolvimento, Guerra e Paz, Islã e Mediterrâneo, Europa e Estados Unidos. Mas o preceito do Meeting é conhecido: nada pode ser entendido a não ser por meio de um encontro. Então, conhecemos a história do casal Cleuza e Marcos Zerbini (cf. Passos de junho), de São Paulo, com seus dramas sociais. Eles dirigem a Associação dos Trabalhadores Sem Terra. Começaram procurando terra para os que não a possuíam. Depois, enfrentaram a questão da moradia e dos problemas sanitários, depois, a escola, a vida comunitária, mas “sempre faltava alguma coisa; tínhamos respondido a algumas necessidades, mas não era suficiente”. A aventura do casal toca o coração do povo do Meeting e foi, para nós, uma das grandes revelações desta edição. Ainda no Brasil conhecemos o projeto de reurbanização de uma extensa área de palafitas em Salvador, no qual a Associação de Voluntários para o Serviço Internacional (Avsi) fez um milagre: “converter” o Banco Mundial e a Cooperação Italiana. Esta última, aliás, apostou tanto no Meeting, que montou um estande de dimensões inferiores somente ao da Companhia das Obras. A África também esteve presente várias vezes nos temas apresentados nos pavilhões de Rímini: as guerras, a Aids, a corrupção e o projeto promovido pela Associação Medicina e Pessoa chamado “uma hora de trabalho que muda a vida”.

Sobre o Islã...
O complicado capítulo sobre o Islã teve como protagonista o vice-diretor do jornal italiano Corriere della Sera, Magdi Allam e, como ponto central, um encontro com o intuito curioso de falar sobre a “vida cotidiana” numa religião que, sob muitos aspectos, continua misteriosa. Magdi é amigo sólido e de longa data. As surpresas foram o especialista em Islã, Abu Zyad, que propôs a grande e delicadíssima questão do “literalismo”: é possível interpretar o Corão? Para ele, obviamente, sim, senão o destino do Islã estaria fechado nos locais de culto e no fundamentalismo. O jovem Khalid Chaouli também se colocou: “Não consigo entender como é possível, em nome do Islã, conceber o desejo da própria morte e a de outros”. Porém, ele admite que este é um discurso difícil de fazer, até na comunidade islâmica italiana. Viver com e no Islã também foi o tema das sofridas narrações e explicações sobre os escritos reunidos em um livro da especialista italiana em Islã, Valentina Colombo. Mas, atenção, o que existe não é a raça das mulheres árabes, mas pessoas vivas (mesmo que, às vezes, escondidas atrás de um véu) com seus problemas concretos, sustenta a estudiosa, e é aí que podemos e devemos intervir. No encontro com o Ministro do Interior italiano, Beppe Pisanu, e com o comissário europeu Franco Frattini, foi retomado um tema do ano anterior: o Mediterrâneo, que significa uma estratégia a ser redescoberta, uma política a ser construída (verdadeira, não política-politicante, auto-referencial e auto-determinada). Sabendo que não se começa do zero: junto com as invasões existem as trocas e o enriquecimento recíproco. Em suma, Oriana Fallaci foi citada junto com o grande escritor eslavo Predrag Matvejecic. Mediterrâneo como mar “mestiço”, para dizê-lo em uma palavra, que, em Rímini, conheceu uma certa notoriedade. Ainda hoje, existem as desconfianças e os conflitos, mas também existem os projetos entre os dois lados e as amizades que nasceram: a CdO em Jerusalém, que reúne árabes israelenses, judeus e palestinos; atividade da Câmera de Comércio Italiana; a presença, em Rímini, do bispo da Tunísia, Fouad Twal, agora prestes a transferir-se para Jerusalém... Em suma, o Meeting ofereceu a moldura, a rede, para dizer melhor, de um impulso político novo e global.

... e sobre o Iraque
A pouca distância da tentativa de conhecer e se aprofundar sobre o Islã, acontecem as discussões e análises sobre as guerras que, com ou sem razão, travam com este país o terrorismo e a sua ameaça global e o Iraque. O Iraque que sangra, que tenazmente luta pela liberdade de existir. Também foi lembrada a guerra dos armênios, hoje certamente mais afortunados, para que seu tremendo passado não seja ocultado: foi um belo encontro com Marco Tosatti e Antonia Arslan. Os testemunhos dos jornalistas Toni Capuozzo, Monica Maggioni e Gianni Riotta contra o risco da indiferença. E o ápice da “política estrangeira” do Meeting foi a presença do Ministro das Relações Exteriores de Bagdá, Al Zebari, e do afegão, Abdullah, promovido pelo Ministro das Relações Exteriores da Itália, Gianfranco Fini. Por uma vez, não uma mesa diplomática nem declarações obrigatórias, mas um pedaço do Ocidente, milhares e milhares de pessoas como que arrastadas durante duas horas dentro do fogo, da pólvora e das bombas, colocadas ao lado dos homens e mulheres daqueles dois países. “Fiquem conosco”, gritaram os ministros, “fiquem perto”. Vejam o que sofremos, a liberdade que buscamos é a mesma de vocês, é o bem precioso que nos falta. A guerra como realidade contra a guerra como título de jornal.

Além do oceano
... e senhor Anderson, o que é a liberdade? A pergunta chega inesperada e nada óbvia, mesmo no Meeting da liberdade, ao mais ilustre americano presente em Rímini: Carl Anderson, supremo responsável dos Cavaleiros de Colombo, cujo retrato está estampado nos jornais mais atentos aos dias de Rímini. Todos os anos os cavaleiros recolhem entre 130 e 150 milhões de dólares destinados à caridade. Trata-se da maior organização católica mundial de serviço às famílias, um milhão e setecentos mil afiliados. É suficiente? Anderson foi o chefe de fila do esquadrão americano que incluía, entre outros, Kenneth Ciongoli, presidente das organizações dos italo-americanos e Joseph Weiler, bastante conhecido pela comunidade dos constitucionalistas e por aqueles que em vão empenharam-se pelo reconhecimento das raízes cristãs na Constituição européia. Judeu, escreveu um livro imperdível. À noite, disse duas palavras: Sabe, nos Estados Unidos os meus colegas me criticam porque venho aqui e por causa da minha amizade com CL. Mas eu não estou nem aí – diz exatamente assim, em italiano claro – escuto, me escutam, nos tratamos bem, colocamos as coisas de lado, é assim que fazemos e, assim, vamos em frente”. Ainda, entre os “americanos” não faltaram o porto-riquenho monsenhor Albacete, o italiano Marco Bardazzi e, naturalmente, Jonathan, Riro e outros responsáveis do Movimento. O laço entre os Estados Unidos e a Europa deu a eles monsenhor Diarmuid Martin, primaz da Irlanda, que falou sobre dificuldades (em certas paróquias de Dublin, a freqüência à missa foi reduzida a um por cento”) e honras de seu país (a evangelização européia promovida pelos santos irlandeses; o sucesso econômico destes anos; o desarmamento do Ira). Representando a Europa estiveram presentes o ex-presidente espanhol, Aznar, o presidente do partido popular europeu, Poettering e o bispo romeno, Bercea, ordenado na clandestinidade, que lembrou a uma platéia comovida a ferida do nosso passado recente. Hoje é quase difícil lembrar como era o mundo quando o Meeting nasceu. Ele mudou. Se ele muda um pouco a cada ano, se a cada ano nós mesmos mudamos um pouco, se cada vez mais se acrescenta um pouco mais de esperança, me agrada pensar que também é mérito desta última semana de agosto que muitos passaram em Rímini.

 
 

Credits / © Sociedade Litterae Communionis Av. Nª Sra de Copacabana 420, Sbl 208, Copacabana, Rio de Janeiro - RJ
© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón

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