Quem pode carregar no coração e testemunhar as razões de uma esperança que não teme as dificuldades da caminhada e as contradições da vida, o desafio do mundo e da história? Quanta coragem é necessária para sustentar a esperança dos homens, para acolher cada novo dia como um dom, como uma promessa de verdadeiro bem?
A verdadeira esperança existe no mundo por obra de Deus, que a planta no coração do homem como certeza (de outro modo, impossível) de que a realidade inteira, o universo e a história são destinados a atender ao desejo mais profundo da essência humana, que, portanto, não recua nem diante da vida nem diante da morte.
A esperança implica, pois, a superação de uma desproporção que o homem inevitavelmente percebe, mas que não consegue resolver. De um lado capta conscientemente a evidência de ser uma pequeníssima parte do universo e da história; do outro, porém, esse fato determina paradoxalmente a consciência de si e, com ela, o desejo da totalidade.
O nascimento da esperança, de um vínculo positivo e concreto entre o próprio ser, a própria existência, e o destino do universo, é fruto da intervenção de Deus, que vem ao encontro do homem com uma promessa de comunhão e de infinito.
A companhia de Deus
A primeira revelação a Abraão já testemunha que a relação que Deus instaura é sempre pessoal, com uma pessoa concreta, que adquire assim um valor único e inimaginável. A relação que Deus estabelece com Abraão torna-o tão precioso aos Seus olhos que vincula, de modo surpreendente, a sua pessoa concreta ao horizonte universal: em ti serão abençoadas todas as famílias da Terra (Gn 12,3b). A relação é concreta e proporcional à pessoa de Abraão. De fato, dele Deus não pretende ações extraordinárias; ao passo que o horizonte da Sua promessa não tem limites.
A intervenção divina consiste na oferta a Abraão da possibilidade de que a sua história não pertença simplesmente ao conjunto de eventos terrenos, mutáveis e passageiros, insuficientes para reafirmar o valor pleno da sua vida, mas que a sua história entre numa verdadeira relação com Deus, com a promessa de uma fecundidade no contexto do horizonte universal e do destino do mundo.
A pedagogia divina lhe oferece, desde o início, uma companhia estável, que inscreve a sua vida na aliança com Deus. Sobre essa base pode nascer uma esperança real, que não surgiria a partir de outros fundamentos, nem que Deus tivesse fornecido a Abraão o pleno conhecimento das leis que regem o mundo e a história. De fato, isso não lhe permitiria superar – mas até agravaria – a percepção da desproporção entre a pequenez do próprio ser e a grandeza do universo, dos desígnios divinos.
A fé de Israel
Portanto, a esperança nasce do fato de que Deus estabelece uma relação precisa com uma pessoa determinada. Por isso, o seu apoio central reside inevitavelmente no reconhecimento da iniciativa de Deus, cujo significado pode ser entendido pelo homem como gesto de amor gratuito.
Assim o interpretará o povo de Israel no curso da sua história, na qual aprende gradualmente a colocar a sua confiança na misericórdia e na fidelidade de Javé, que se relacionará de diferentes modos com o povo – às vezes, escolhendo a via do castigo –, mas que não romperá jamais a sua aliança, nem nunca o abandonará definitivamente.
Essa fé e essa esperança permitirão a sobrevivência de Israel em meio a culturas e impérios a ele muito superiores, impedindo que a sua caminhada termine com seu desaparecimento, com sua dissolução no fluxo de uma história constituída por uma multidão de povos e de nações.
Encarnação, forma da esperança
A plenitude da esperança aparecerá entre os homens pela manifestação da plena vizinhança de Deus, na pessoa do seu Filho feito carne, Jesus Cristo. NEle se revela definitivamente o amor de Deus, a verdade das suas promessas, a sua fidelidade ao homem e o poder da sua intervenção salvífica.
De fato, Jesus Cristo, “que morreu e ressuscitou para todos, dá sempre ao homem, mediante o seu Espírito, luz e força para responder à sua altíssima vocação” (Gaudium et spes 10), reivindica a dignidade e restitui a esperança de um destino feliz àqueles que já haviam perdido a esperança de alcançá-lo (cf. Gaudium et spes 18, 21).
“Na realidade, somente no mistério do Verbo encarnado é que o mistério do homem encontra a verdadeira luz” (Gaudium et spes 22), nEle adquire sentido e o gênero humano encontra o seu centro. Desse modo, são possíveis a alegria e a plenitude das aspirações do coração; já que o homem sabe que, junto a Ele, caminha para a plenitude da história humana, segundo o desígnio do Seu amor (cf. Gaudium et spes 45).
Em outros termos, a forma definitiva da esperança nasce, no homem, do encontro com Jesus Cristo, com o Verbo de Deus feito carne, que ilumina definitivamente a essência do homem, a sua dignidade e o seu destino, colocando-o em relação com a realização do desígnio divino sobre o universo.
Por meio de um encontro real
Por isso se pode dizer, a rigor, que a raiz da esperança se coloca num encontro histórico, isto é, aquele de uma pessoa concreta com a presença real de Jesus Cristo na história. Sem o encontro com o amor dAquele que guarda o destino do mundo no coração da pessoa, não se poderá jamais estabelecer a certeza de que a sua existência seja verdadeiramente capaz de responder às próprias exigências de dignidade, de significado e de plenitude.
O encontro deve ser, obviamente e sobretudo, real para que possa sustentar verdadeiramente o peso da vida. Deve também ser sempre encontro com o amor gratuito do Senhor, já que só essa gratuidade torna verossímil a grandeza de um tal dom e, do outro lado, só o amor faz com que a aceitação de um vínculo tão profundo da própria existência não lesione a liberdade. Por isso, nesse encontro está em jogo completamente a liberdade da pessoa, que é convidada a decidir inclusive sobre o nascimento da própria esperança, a adesão pessoal ao desígnio de amor do Senhor do universo.
Um consolo para o coração humano
Com o dom do seu Espírito, Cristo revela a profundidade da sua vitória sobre tudo o que limita o homem, sobre o pecado e a morte, sobre a perda da relação com Deus e com os irmãos, sobre a perda de valor e de sentido da vida e do mundo. Eis que, com o dom do seu Espírito, Jesus nos introduz no verdadeiro conhecimento da sua Pessoa e da sua missão, na verdadeira unidade com Ele, e nos constitui em “comunhão de vida, de caridade e de verdade” em um “povo de Deus” que, embora muitas vezes pareça um pequeno rebanho, é “a semente mais forte de esperança” para todo o gênero humano (cf. Lumen gentium 9).
O fato mesmo da presença da Igreja de Cristo no mundo serve para evitar que os homens se esqueçam do Pai, a fim de que permaneça, de algum modo, a memória do seu Amor, comunicado por meio de Jesus Cristo. A existência da Igreja já é, então, um princípio de esperança para o gênero humano, enquanto impede que o horizonte do mundo feche-se sobre si mesmo, sufocando o coração do homem.
O encontro real, pessoal, com a vida do Povo de Deus, com a “comunhão fraterna” (Gaudium et spes 32) nascida da presença e do abraço misericordioso de Cristo, consola o coração humano, estimula-o a uma vida nova e faz surgir nele uma poderosa esperança, que não se baseia nas próprias forças, mas se apóia para sempre no amor irremovível do Senhor.
Portanto, o testemunho de Cristo, dado por aqueles que entraram em comunhão com Ele, é o instrumento por meio do qual o Espírito continua a fazer brotar na história a verdadeira esperança. Na vida de um homem, o encontro com a comunhão cristã, como fato real que não expressa só as capacidades limitadas do indivíduo ou do próximo, mas a iniciativa de Cristo que une os homens no seu Corpo e no seu Sangue, na Eucaristia, é o princípio da salvação, que a pessoa experimenta como esperança.
Toda graça, todo dom e carisma do Espírito, são destinados a essa obra principal: conduzir os homens à verdade do amor de Jesus Cristo e, assim, acender no coração deles a luz da esperança, a fim de que ela ilumine toda a casa, a fim de que todos possam caminhar em direção ao próprio destino. Porque não estamos na escuridão, pois a luz continua a iluminar o mundo.
* professor na Faculdade de Teologia de San Damaso (Madri)
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