Notas de um diálogo de Luigi Giussani
com um grupo de universitários.
Riccione, outubro de 1976;
in Passos dezembro de 2002, pp. 20-22
Uma presença é original quando nasce da consciência da própria identidade e da afeição a ela, e nisso encontra a sua consistência.
II - Identidade é saber quem somos e por que existimos, com uma dignidade que nos dá o direito de esperar que a nossa presença proporcione “algo melhor” para a nossa vida e para a vida do mundo. Mas quem somos nós para termos direito a essa esperança, sem a qual a nossa vida cai em um burguesismo vesgo – cujo critério supremo é assegurar-se contra o risco – ou na palidez de uma insatisfação que logo se transforma em lamento ou em acusação contra os outros?
“Todos vós, com efeito, sois filhos de Deus pela fé em Cristo Jesus, porque quando fostes batizados, vos revestistes de Cristo. Não há mais nem judeu nem grego, nem escravo nem livre, nem homem nem mulher, porque todos sois um em Cristo Jesus” (Gl 3, 26-28). Nunca citei um outro trecho mais do que este (salvo um: “Quem me segue terá a vida eterna e o cêntuplo nesta vida”; Mt 19, 29).
“Vós, que fostes conquistados, vos tornastes um só com Cristo”: “Não fostes vós que me escolhestes, mas eu que vos escolhi” (Jo 15, 16). É uma escolha objetiva da qual não podemos mais nos livrar, é uma penetração do nosso ser que não depende de nós e que não podemos mais cancelar. “Todos vós que fostes batizados vos revestistes de Cristo”: por isso, não existe mais nenhuma diferença entre vocês, “nem judeu nem grego, nem escravo nem livre, nem homem nem mulher. Todos vós sois um em Cristo Jesus”: esta é a nossa identidade. A Carta aos Efésios diz literalmente: “Somos membros uns dos outros” (Ef 4, 25).
Não existe nada culturalmente mais revolucionário do que esta concepção da pessoa, cujo significado, cuja consistência é uma unidade com Cristo, com um Outro, e, através dela, uma unidade com todos aqueles que Ele conquista, com todos aqueles que o Pai lhe dá.
A nossa identidade é o ser um só com Cristo. A identificação com Cristo é a dimensão constitutiva da nossa pessoa. Se Cristo define a minha personalidade, vocês, que foram agarrados por Ele, entraram necessariamente na dimensão da minha personalidade. Essa é a “criatura nova” de que fala o belíssimo final da Carta aos Gálatas (Gl 6, 15), o início da “nova criação” de que fala São Tiago (Tg 1,18).
“Essa é a vitória que vence o mundo: a nossa fé”, diz São João (1 Jo 5, 4): a fé vence o mundo, ou seja, demonstra a sua verdade acima de todas as ideologias e concepções, acima de todos os modos de conceber o humano, porque é a verdade estrutural pela qual o mundo foi feito. É a verdade que se manifestará e se instaurará completamente no fim, mas é o fator que move a história agora e catalisa o bem no mundo, permitindo que o mundo seja mais humano.
Quer eu me encontre sozinho no meu quarto, quer nos encontremos em três estudando na universidade, em vinte no restaurante, etc., em todos os lugares e em todas as circunstâncias, esta é a nossa identidade. O problema é, portanto, a autoconsciência, o conteúdo da consciência de nós mesmos: “Não sou eu que vivo, mas Tu que vives em mim” (cf. Gl 2, 20). Este é o verdadeiro homem novo no mundo – o homem novo que foi o sonho de Che Guevara e o pretexto mentiroso de revoluções culturais com as quais o poder tentou e tenta dominar o povo, para subjugá-lo segundo a sua ideologia –; e nasce, antes de mais nada, não como coerência, mas como autoconsciência nova.
III - A nossa identidade se manifesta em uma experiência nova dentro de nós e entre nós: a experiência da afeição a Cristo e ao Mistério da Igreja, que na nossa unidade encontra a sua concretude mais próxima. A identidade é a experiência viva da afeição a Cristo e à nossa unidade.
A palavra “afeição” é a maior e a mais capaz de definir toda a nossa expressividade. Ela indica muito mais um “apego” que nasce do juízo de valor – do reconhecimento daquilo que existe em nós e entre nós – que uma facilidade sentimental, efêmera, frágil como uma folha ao vento. E na fidelidade ao juízo, isto é, na fidelidade à fé, com a idade, esse apego cresce, torna-se mais sólido, vibrante e potente. “Tudo o que poderia ser para mim um lucro eu o considerei uma perda diante do conhecimento de Cristo Jesus, meu Senhor, pelo qual deixei todas essas coisas e as considero como esterco para ganhar a Cristo e ser achado nEle, não com uma justiça minha, que vem da lei, mas com a justiça que vem da fé em Cristo, ou seja, com a justiça que vem de Deus, baseada na fé” (Fl 3, 7-9).
Essa experiência viva de Cristo e da nossa unidade é o lugar da esperança, e por isso da nascente do gosto da vida e do florescer possível da alegria – que não é obrigada a esquecer ou a renegar nada para afirmar-se; e é o lugar da recuperação de uma sede de mudança da própria vida, do desejo de que a própria vida seja coerente, que mude em virtude daquilo que ela é no fundo, que seja mais digna da Realidade que carrega.
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