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Passos N.58, Fevereiro 2005

RIO DE JANEIRO / TESTEMUNHO

Um encontro humano
e um anúncio de vida para todos

por Valéria Gomes Lopes

Dom Filippo Santoro é homenageado na Câmara dos Vereadores do Rio de Janeiro. Ocasião de anúncio do carisma, testemunho de um olhar que abraça todas as experiências religiosas

Rio de Janeiro. 10 de dezembro de 2004. Câmara dos Vereadores da Cidade Maravilhosa. Era como se ouvíssemos ecoar, naquele ambiente, as palavras de padre Luigi Giussani, fundador do Movimento Eclesial Comunhão e Libertação (CL), numa carta em resposta à saudação do Santo Padre, por ocasião das comemorações pelos 50 anos do Movimento: “Eu não apenas nunca pretendi ‘fundar’nada, como considero que a genialidade do movimento que vi nascer é ter sentido a urgência de proclamar a necessidade de um retorno aos aspectos elementares do cristianismo, ou, em outras palavras, a paixão pelo fato cristão enquanto tal, em seus elementos originais, e nada mais”.
Olhando para dom Filippo Santoro, Bispo de Petrópolis, na Tribuna da Câmara, sendo homenageado com a Medalha Pedro Ernesto – comenda máxima daquela Casa Legislativa Municipal –, num ato pluripartidário único, até o presente momento, resultado do desejo dos Vereadores Católicos Adilson Pires (PT), Leila do Flamento (PFL), Luiz Guaraná (PSDB), Romualdo Boaventura (PFL) Marcelino de Almeida (PFL) e Argemiro Pimentel (PMDB), a comunidade de CL do Rio de Janeiro fazia experiência do que dissera Monsenhor Giussani, no mesmo texto: “O cristianismo se identifica com um Fato – o Acontecimento de Cristo – , e não com uma ideologia. Nestes cinqüenta anos, apostamos tudo nessa evidência”.
Na mesa, o atual Vice-Prefeito da cidade, Otávio Leite, o padre Jesus Hortal (Reitor da PUC- Rio) e os representantes do Cardeal-Arcebispo do Rio, dom Eusébio Oscar Scheid, e do Conselho Nacional das Igrejas Cristãs (CONIC/RJ), do qual dom Filippo é presidente. No Plenário, além da comunidade de CL, podiam-se encontrar os Deputados Estaduais da ALERJ Leandro Sampaio(Petrópolis), Alessandro Molon (PT) e o Vereador do Rio, recém-eleito, Márcio Pacheco (PSC); o Dr. Hugo Leal, Presidente do DETRAN/RJ, o Dr. Carlos Dias, autor da Lei 3.459/00, que dispõe sobre o ensino Religioso Confessional Plural na rede estadual. Viam-se, ainda, professores de Ensino Religioso de diferentes municípios, representantes de diversas Secretarias de Estado, participantes de movimentos eclesiais, agentes de pastorais, seminaristas, padres, leigos. Enfim, uma diversidade de pessoas que compartilhavam com dom Filippo o que surgiu da simplicidade de um “sim”, conferido por ele à Igreja e ao convite de monsenhor Giussani, em outubro de 1984, para que viesse dar aulas na PUC, a pedido do então cardeal-arcebispo dom Eugênio Salles. Fazia-se carne, mais uma vez, a resposta de Giussani em entrevista à televisão italiana: “Procurei sempre viver a vida – nas suas exigências pessoais e concretas e na sua aplicabilidade – como resposta a necessidades reais”.
Essa total identidade entre a experiência de padre Giussani e a de dom Filippo nos fazia entender, mais do que suas palavras, a força de um encontro humano que transforma a vida. Num trecho de sua saudação aos presentes, pudemos ouvir o testemunho de um seguimento fiel ao carisma que elabora sua “autonomia de juízo” (conforme afirmara por ocasião de sua posse na Diocese de Petrópolis): “O evento, porém, que determinou a minha sensibilidade humana, eclesial e política foi o encontro com o movimento de Comunhão e Libertação, fundado por Monsenhor Luigi Giussani. Em tempos de rejeição de qualquer autoritarismo, foi o encontro com uma verdadeira “auctoritas”, autoridade como aquele que te faz crescer. Em tempos de relativismo e de domínio da dúvida pela dúvida, foi a redescoberta da razão e da sua capacidade de relacionamento com o Mistério e o Infinito; em tempos de complexo de inferioridade da Igreja diante do mundo, foi o encontro com a certeza da fé e de sua profunda conveniência humana; em tempos de ideologia, foi o primado da experiência, de uma experiência em que era abraçada a totalidade da minha pessoa no indizível encontro com Cristo – vida da minha vida – , presente agora no seu corpo misterioso, que é a Igreja. Começou, assim, uma nova vontade de anúncio dessa vida para todos e de diálogo com todos: católicos, leigos e radicais, fascistas e comunistas”.
A quantidade de deputados e de vereadores de diferentes partidos presentes indicava o princípio animador da sua ação como padre e como bispo, na política e na cultura: o pluralismo. A participação de amigos de outras confissões cristãs e de diversas religiões evidenciava mais um aspecto que sempre o apaixonou: o respeito pelo outro. No pluralismo e no respeito à diversidade, sintetizam-se dois elementos: o amor à própria identidade e o respeito à diferença. “Sem identidade e sem pluralismo – afirmara Dom Filippo –, não existe convivência civil”. Sabemos que o fim de uma sociedade acontece quando se destrói a identidade e quando se elimina a pluralidade cultural e política de um povo. Nos dois casos, afirma-se a ditadura, evidente e clamorosa na eliminação da identidade da pessoa; quase imperceptível, na tentativa de homogeneidade cultural e política.
Como documentação da paixão educativa que movem o educador – Luigi Giussani – e seu eterno educando – Filippo Santoro –, durante a sessão foi apresentado, pela Coordenadora de Educação Religiosa do Estado do Rio de Janeiro o livro didático de Ensino Religioso Católico para a 2ª série do Ensino Fundamental, intitulado O Fato Cristão. O livro está sendo elaborado por um grupo de professores, a convite da Arquidiocese do Rio de Janeiro, com ilustrações do cartunista Ziraldo. Na medida em que as unidades eram exibidas, descortinavam-se, diante de um público comovido, O Sentido da Vida; O Sentido da Festa; A Encarnação; O Acontecimento Cristão; A Paixão, Morte e Ressurreição de Jesus – Centro das Religiões Cristãs; A Importância da Vida e da Instituição Familiar; O Prazer da Convivência; A Abertura ao Outro; O Respeito às Raças, às Outras Religiões e a Todos os Povos e Um Jeito Novo de Ser Igreja.
Esperamos que os aplausos intermitentes do Plenário, durante a apresentação do livro, possam ter servido de ânimo aos políticos presentes, a estreitarem seu relacionamento com a autoridade que homenageavam. Assim, as palavras de indignação de Dom Filippo, em seu discurso, ao se referir ao fato de que o Ensino Religioso Confessional e Plural ainda não esteja presente em todas as escolas estaduais e municipais do Rio de Janeiro “revela o quanto é contrário ao pluralismo um certo poder político-cultural que nos governa”, poderão se converter, quem sabe, na experiência concreta do que se denomina “Princípio de Subsidiariedade”: “o Estado a serviço das identidades culturais, religiosas e políticas”.

* Coordenadora de educação Religiosa da Secretaria Estadual de Educação do Rio de Janeiro

 
 

Credits / © Sociedade Litterae Communionis Av. Nª Sra de Copacabana 420, Sbl 208, Copacabana, Rio de Janeiro - RJ
© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón

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