Um relacionamento como mãe e filho
Quando o seminarista Jéferson chegou a Londrina para estudar Teologia, ele já havia conhecido o Movimento por meio de um amigo, em Maringá, e logo procurou pela comunidade de CL para viver uma amizade e companhia que o ajudassem a estar próximo do carisma de Dom Giussani. Na época, como ele fabricava velas e eu também, Jaime o colocou em contato comigo. Logo me chamou atenção a sua admiração por Dom Giussani, seu desejo de seguir Cristo e o caminho vocacional. Por isso nasceu entre nós uma grande afeição. Por graça do Mistério moro bem perto do seminário e várias vezes por semana participava das missas com ele e depois rezávamos as vésperas. Jéferson sempre fazia questão de manter no mural algumas frases de Dom Giussani e cartazes de Páscoa do Movimento. Aos domingos ele me ajudava com a divulgação de Passos na paróquia e ele também foi uma ajuda providencial na Coleta de Alimentos que realizamos. Mas algo neste tempo me chamou atenção e me tocou profundamente. Estava acontecendo em Londrina a semana teológica e os seminaristas eram responsáveis pela coordenação do gesto. Jéferson, sem perda de tempo, sugeriu que eu fosse divulgar Passos e a Coleta que estava prestes a acontecer. Quando cheguei havia muita gente e, enquanto eu tentava me localizar, um seminarista chegou perto de mim e disse: “Você está procurando por seu filho?” Quanta ternura do Mistério eu senti naquele momento! Então era assim que as pessoas viam nossa amizade: algo tão bonito como o relacionamento entre mãe e filho? Sim, é verdade que Algo mais forte nos colocou juntos, não éramos simplesmente duas pessoas ligadas pela mesma religião. Havia o desejo de ser mais de Cristo, um desejo que Dom Giussani com o seu carisma suscitou em nossos corações. Uma amizade verdadeiramente diferente, humanamente bela porque é o rosto d’Ele. Se quando chegou, o seminarista Jéferson estava à procura de uma companhia para ele, no final foi ele que se tornou para mim uma companhia precisa, pois mesmo entre tantas coisas que tinha para fazer, com os estudos e as regras do seminário, quando sabia que eu não estava bem, sempre arrumava um jeito de vir me dar um abraço, trazer o seu olhar, o seu rosto amigo. Jéferson foi ordenado sacerdote no dia 30 de junho deste ano, Solenidade da Santíssima Trindade. Na ocasião estive presente representando a comunidade de CL que se reunia nos Exercícios anuais da Fraternidade. Em seu agradecimento ele não poderia deixar de citar Dom Giussani e lembrou a todos que “a raiz da nossa vida é essa piedade que Deus teve pelo nosso nada; é a iniciativa de Deus fazendo surgir o nosso ser e nos convocando a agir. Assim, toda a vida se torna ocasião de resposta a esse transbordamento de caridade”. Peço a todos que rezemos por este novo caminho que se inicia para ele.
Zaira, Londrina – PR
Aquela janela na prisão da Stasi
No ano passado, tivemos ocasião de conhecer Peter Drauschke, dirigente da Juventude Comunista da antiga Alemanha Oriental e, depois, prisioneiro da Stasi (polícia política alemã), durante uma viagem de estudos a Lípsia e Berlim. Nós o convidamos para ir à Itália para uma série de encontros. Sua história é a de alguém que buscou a liberdade deixando-se enganar pelas falsas promessas da ideologia. A comparação entre o seu desejo e a mentira da ideologia colocou-o diante de um impasse: seguir a verdade ou aceitar viver na mentira. Decidiu favorecer seu desejo de verdade, fugindo para a Alemanha Ocidental, mas pagando duramente com a prisão. Em sua dramática experiência de prisioneiro da Stasi, diante da própria impotência durante os longos períodos de isolamento sob torturas físicas e psicológicas, ele, que tinha sido educado segundo o mais rigoroso ateísmo marxista, redescobriu a pergunta sobre Deus: “Um dia, cheguei ao ponto mais baixo da tristeza, estava largado no chão e chorava. De repente, levantei-me e, olhando pela janela da cela, invoquei o nome de minha mãe e pensei em Deus. Naquele momento, voltei à vida. O comunismo é o único sistema que prometeu o paraíso sobre a terra e construiu o inferno, e isso acontece todas as vezes que os homens se colocam no lugar de Deus”. Diante da humanidade deste homem, nós, professores, junto com um grupo de estudantes, desejamos comunicar-lhe que aquele Deus procurado e invocado por ele se fez carne e nos reuniu em uma companhia dentro da história do Movimento. Assim, organizamos uma noite de cantos que tinha como tema a liberdade e o encontro com Cristo. O relacionamento com ele continua por meio de uma intensa correspondência, onde fica cada vez mais claro que aquilo que mais o tocou foi a descoberta de algo grande para ele: “Vim para cá com a ideia de precisar contar alguma coisa e voltei para casa descobrindo que algo tinha acontecido comigo”.
Patrizia, Anna, Giulio, Milão – Itália
Estrada para o céu
Estou no Movimento há dois anos, graças à convivência com Moisés e Éverton, que agora está no Chile. Escrevo para contar a experiência que fiz na peregrinação dos universitários e jovens trabalhadores entre 15 e 18 de julho, de Campos do Jordão a Aparecida. Na preparação para começar a caminhar, o meu primeiro esforço foi o de não ver nada como óbvio. Em meio às provocações feitas por padre Julián, meu segundo e doloroso esforço foi carregar meus 130 kg por 12 km morro acima. Ambos esforços valeram a pena e cheguei ao local da parada de boca aberta, mas já não era pelo cansaço, era o maravilhamento da companhia que me era dada. No segundo dia, 17 km de lama e descida. Mas como não continuar impressionado com a companhia, com as conversas sérias sobre vida e vocação, com os testemunhos na assembleia? Com o tornozelo inchado, estava disposto a caminhar os últimos 25 km de madrugada, já que depois de o corpo esquentar a dor some. Mas como havia pessoas que chegaram de carro e queriam caminhar, acabei ficando com o carro do Diego de Belo Horizonte. Fiquei a madrugada inteira cantarolando a melodia de Parsifal enquanto levava os mais cansados ao próximo ponto de parada. Num momento eu era o último da fila e, numa subida, consegui ver até a cruz que estava lá no início. Parecia uma estrada para o céu que tinha como pedras as pessoas. “É bela a estrada para quem caminha”. Cheguei a Aparecida e comigo estava um senhora brasileira, uma paraguaia, Eliana, e outro paraguaio. Este último estava descalço e com os pés enfaixados e a paraguaia não conseguia apoiar o pé esquerdo no chão. Enquanto eu fechava o carro eles foram andando, se apoiando um ao outro. Chovia nessa hora. Faltavam dez minutos para a missa e no ritmo que estavam demorariam muito. Consegui uma cadeira de rodas para Eliana e entrei com ela na Basílica. O rapaz sumiu e quando olhei ao redor tinham outros dez cadeirantes. Uma funcionária da Basílica abriu caminho e nos colocou lá na frente. Estávamos doloridos, sujos e exaustos, mas felizes. Fiquei emocionado ao ver padre Julián, padre Ignazio, padre Paulinho e padre Vando concelebrarem a missa. Fiz ali, talvez, a minha máxima oração, agradecendo por tudo o que me era concedido, por conhecer o Movimento, pela minha vocação e por Cristo ter se deixado encontrar por mim, que é o que torna qualquer estrada bela. Quero agradecer aos padres que já citei; ao padre Magno pelo testemunho de humanidade e vida; aos voluntários; ao Marcos e a Cleuza e à equipe da cozinha; à equipe de ordem. Todos fizeram parte da renovação que passei. E de forma especial a Eliana.
Pedro Henrique, Petrópolis – RJ
Uma amizade operativa
Relato um pouco do Encontro de Medicina e Persona que aconteceu de 6 a 8 de agosto, em Assunção. Efetivamente foi um Acontecimento; não fomos nós que o fizemos, aconteceu, pois se manifestou uma amizade entre nós. Uma amizade operativa. Começamos com um jantar na sexta-feira na casa de Mario Meyer com todos os brasileiros, argentinos, italianos, chilenos e peruanos que chegaram para o evento. Mario, Patricia e Estela (membros do grupo de Medicina e Persona) se empenharam em nos acolher com um carinho especial. Aliás, tiveram muito trabalho para nos garantir o melhor em todos os momentos. No sábado, o dia foi todo de conferências, num anfiteatro nobre da Universidade de Assunção, com mais de cem participantes, num ótimo nível acadêmico. Porém, o mais importante é que entre nós de Comunhão e Libertação pudemos conhecer mutuamente nossos trabalhos (o que não havia acontecido até esse encontro!) e ali ficava cada vez mais claro, para nós mesmos, que fazemos um mesmo caminho trabalhando em diferentes frentes. Foi impressionante ver como facilmente entramos em sintonia. Também participaram do encontro decanos da Universidade, professores da pós-graduação e altos funcionários, gestores do Serviço de Saúde do Paraguai. A equipe da Clínica de padre Aldo também estava toda presente. A conferência de padre Aldo e do doutor Humberto, médico-chefe da Clínica, junto com o testemunho de um paciente, encerraram os trabalhos do sábado. Depois fomos todos assistir à missa na Sede do Movimento, e aí pudemos nos aproximar ainda mais da comunidade local. E ainda, eu e mais quinze amigos terminamos a noite na pizzaria da Clínica, junto com padre Aldo. No domingo pela manhã os trabalhos foram na Clínica em sete grupos de estudos que trabalhavam separadamente estes temas, enquanto também se revezavam nas visitas monitoradas à Clínica e demais obras. Dois exemplos para ilustrar essa amizade: No sábado, do público, Maria, uma das médicas de neuropediatra da Clínica, com quem estive ano passado numa breve reunião, toma a palavra no momento aberto às perguntas para dizer como tinha sido importante para ela o que ouviu de mim no ano anterior. Naquela vez, frente ao dilema que ela enfrentava no tratamento de um menino, ela falava do sofrimento pessoal de tratar uma criança tão deficiente tendo ela um filho da mesma idade. Na ocasião, entendi que ela estava muito voltada a buscar soluções técnicas para justificar uma ou outra conduta. E eu lhe dizia para encarar essa realidade com outro olhar; lembro-me de ter-lhe dito que uma verdadeira postura realista implicava não só olhar para os aspectos técnicos, que não podiam ser obviamente desprezados, mas que ela também considerasse os outros fatores, e que só se poderia caminhar numa amizade entre eles da equipe, e deles com outros, como comigo. Eu não pude voltar lá nesse ano e agora retorno e a escuto testemunhar como aquela conversa mudou a sua vida nesse ano. Eu fiquei surpreso com o que ouvi porque eu mesmo não tinha me dado conta disso. Outro exemplo é que no domingo pela manhã, fiquei coordenando o grupo que tratou do tema do ensino, da formação dos profissionais da saúde. Para esse grupo foram os decanos e outros professores da Universidade. Como os que estão chegando agora, estavam mais preocupados com o conteúdo do tipo “como vocês fazem para ‘convencer’ os alunos? E no grupo também estava o doutor Alberto, nosso amigo médico argentino, com quem nesses anos eu tive apenas uma relação muito formal e com quem eu nunca havia conversado. Ali nos vimos, nós dois, nos sucedendo em falas que se completavam no diálogo com esses outros professores. Como se, eu e ele, estivéssemos trabalhando juntos há anos. Se os outros professores entenderam ou não o que dizíamos, saberemos com o tempo. O importante é que eu e Alberto entendemos o que acontecia entre nós. É por isso que falo de uma amizade operativa que acontece. É um novo início. Foi lindíssimo também como nos aproximamos dos paraguaios de Medicina e Persona (Mario, Patricia e Estela) e da equipe de padre Aldo. Outro aspecto que não posso deixar de compartilhar é que na casa de Mario Meyer, como também na Sede o Movimento, há fotos de padre Francesco Ricci e do pai de Mario, Luiz Meyer. Foram eles que levaram o Movimento ao Paraguai. Convivi com os dois. E me emocionei ao ver essas fotos, ao me lembrar deles e constatar que agora re-floresce isso tudo que testemunhamos nesses dias. Somos pequenos, eu sou pequeno, mas mesmo assim o Senhor se serve de nós. E agora temos muito mais a caminhar. Estou curioso para saber onde o Senhor vai nos fazer chegar.
Dalton, São Paulo – SP
Professor feliz por estar na sala de aula
Escrevi esta carta depois de ler em um jornal on-line o depoimento de uma colega de profissão que dizia que, hoje, assumir um cargo de professor é deprimente por culpa dos jovens sem vontade e sem interesse por nada, de seus pais que sempre os defendem, e da dificuldade econômica. Terminava assinando “professora do ensino médio desiludida”
Posso lhes assegurar que ser professora, hoje, é entusiasmante e me obriga a não me entrincheirar atrás de velhos métodos de ensino, atrás de tradições didáticas que já parecem não dar mais resultado. É verdade que os problemas são muitos – seja no que diz respeito ao dinheiro como à disciplina –, mas também é verdade que os jovens que encontro na sala de aula todas as manhãs não são esses monstros que normalmente nós mesmos pintamos para ter um álibi para nossas falhas. As fontes são escassas, a família não cuida mais e os jovens se ressentem fortemente com isso. Os modelos que têm diante de si todos os dias não são de modo algum educativos... E então? Naquelas horas de aulas, somos nós que estamos diante deles, não os modelos da televisão, não aqueles pais que perdoam tudo impedindo que os filhos cresçam (e, francamente, vamos parar de colocar a culpa nos pais, porque não são todos assim). Nas horas de aulas nos é pedido para demonstrar aos jovens o que nos apaixona na disciplina que ensinamos e na vida que vivemos! É verdade que os jovens, muitas vezes, parecem sem vontade e desinteressados, mas não são tolos e logo percebem se há alguém que quer o bem deles, se há alguém que começa a levá-los a sério não apenas pelas notas que tiram ou pelos erros que cometem. E, depois, quem disse que nossa obra educativa deve terminar com o bater do sinal? Nós, professores, devemos aprender que os jovens não são vasos que devemos preencher com conhecimentos, mas são pessoas que pedem para ser amadas e acompanhadas em seu caminho. E em um relacionamento assim, nada mais pode se tornar álibi, nem para nós, nem para eles... E inesperadamente um deles começa a estudar seriamente, começa a se perguntar o que tem a ver tudo aquilo que lhe é proposto com aquilo que ele deseja. E a vida renasce... até mesmo nos bancos escolares!
Professora feliz de um Instituto Técnico.
Giuditta, Lecco – Itália
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