Oitocentas mil presenças, 130 encontros, oito mostras... Mas, sobretudo, o MEETING DE RÍMINI testemunhou “uma paixão pelo significado das coisas”. E conseguiu se comunicar com gente do mundo todo. Balanço de uma semana que acertou bem no alvo
Um sujeito novo. Oitocentas mil presenças, 130 encontros, oito mostras, 35 espetáculos: também neste ano o Meeting tomou dimensões imponentes. Todavia, mais do que as frias estatísticas, o resumo do que realmente aconteceu está no comunicado final: “o Meeting teve sucesso porque correspondeu à exigência de lançar um olhar positivo sobre a realidade e representou uma proposta para a necessidade de mudança e de restauração da vida social” . De fato, um título como o deste ano – “A natureza que nos leva a desejar grandes coisas é o coração” – obrigou todo mundo a se questionar. Como respondeu uma voluntária a alguém que a exortava a trabalhar “pelos outros”: “eu faço o Meeting antes de tudo por mim mesma, para enriquecer a minha experiência”. Sem esse envolvimento do eu, aos outros só oferecemos propaganda e voluntarismo.
A própria coordenação do Meeting, desde o início de seu trabalho, não ficou imune de se questionar, em diálogo com Julián Carrón, encontrando-se a fazer a verificação daquela intuição que Luigi Giussani teve depois do primeiro Meeting, em 1980: o Meeting é feito por gente caracterizada pela seriedade no encarar a vida, que é paixão pelo significado das coisas; e a paixão pela vida torna as pessoas capazes de criar amizade.
Assim, protagonistas e temas não foram pensados dentro de um escritório, antes nasceram desse mar de presença movida pelo desejo de coisas grandes na vida de todos os dias, que é o Movimento Comunhão e Libertação. Especial, neste ano, foi a contribuição criativa dos universitários de CL em pelo menos quatro mostras (crise econômica; Ulisses dantesco; Matemática; e sobre a escritora Flannery O´Connors, em colaboração com os universitários americanos); a contribuição determinante de muitos jornalistas, de diversas formas; o sacrifício dos 3.193 voluntários, todos empenhados em oferecer o seu trabalho por um objetivo maior e descobrir nisso uma correspondência.
É uma realidade que deixou de ser sobretudo italiana, passando a ter um caráter internacional: estavam presentes pessoas de 29 nacionalidades, entre voluntários, relatores, grupos visitantes, sinal de um Movimento que sabe falar ao coração do homem de todas as partes do mundo e capaz de um juízo novo sobre as questões cruciais do nosso tempo.
“Examinar tudo...”. Como todos os anos, foi o Papa, com sua mensagem no início do Meeting, quem desafiou a todos a tomar consciência do valor do título: “... no fundo da natureza de cada homem encontra-se uma inextinguível inquietação, que o leva a buscar algo que satisfaça esse anseio. [O homem] deve, por assim dizer, sair de si mesmo e ir ao encontro do que seja capaz de preencher a amplitude do seu desejo. [...] Testemunhai, em nosso tempo, que as grandes coisas que o coração humano deseja se encontram em Deus”.
Depois, o título foi discutido nos encontros principais do Meeting, em evidente dialética com a cultura dominante, inimiga dos desejos humanos mais verdadeiros. Como disse padre Stefano Alberto, o homem que busca o “impossível” pode acabar encontrando uma resposta antes inimaginável, mas supremamente conveniente em sua manifestação livre e totalmente gratuita. Como disse o Patriarca de Veneza, Cardeal Angelo Scola, um acontecimento no qual “o desejo integral do homem, isto é, do seu coração, encontra plena satisfação”.
Os testemunhos – de Rose Busingye e seus amigos ugandeses, da viúva Coletta, de Maria Teresa Landi, pesquisadora do prestigioso Instituto de Câncer de Washington, do padre Monacelli e de David Maurice Frank, indiano de Vancouver, de Fiametta Cappellini, do Haiti, e de Mireille Yoga, de Camarões – foram sobretudo exemplificações metodologicamente eficazes do tema proposto, porque mostraram a capacidade da experiência cristã de enfrentar as condições mais difíceis experimentando aquela plenitude humana que é resposta à promessa contida no próprio desejo.
Convite para a ceia. Essa busca que caracteriza a natureza humana gerou aberturas inimagináveis, não só com pastores da Igreja católica, como Péter Erdö, Paul Josef Cordes, Jean-Louis Tauran, Diarmuid Martin, mas foi também impressionante a amizade profunda e verdadeira, a unidade em ato, com pessoas de outras confissões religiosas.
Frente a 15 mil pessoas, o metropolita ortodoxo de Minsk e Sluck, Filaret, abraçou o Primaz dos bispos europeus, o Cardeal de Budapeste, Péter Erdö. E, no coração de um apaixonado testemunho de fé pessoal, mostrou a estrada-mestra para a unidade entre católicos e ortodoxos: “Em Cristo já estamos unidos”.
Renovou-se a amizade com o filósofo e teólogo anglicano John Milbank e seus colaboradores, entre os quais destaca-se Philip Blond, um dos inspiradores do programa de “welfare subsidiário” do premiê inglês David Cameron.
Para a ceia de sexta-feira à noite, com o qual tem início a festa do Shabat, o professor judeu nova-iorquino Joseph Weiler convidou, como já é tradição, amigos católicos, ortodoxos, protestantes e muçulmanos, além de José Barroso, o presidente da Comissão Europeia. O grande amigo do Meeting, o muçulmano Wael Farouq, estava tão admirado e comovido que disse, ao me abraçar, que há dois anos jamais imaginaria que seria convidado (e teria aceitado) o convite de um judeu ortodoxo. Nesse clima de verdadeira fraternidade nasceu, da parte dele e de alguns juízes da Corte Suprema do Egito, o convite para um evento público ligado ao Meeting, nos próximos dias 28 e 29 de outubro, um evento do qual certamente participarão milhares de pessoas.
Renovou-se o encontro com os budistas do monte Koja e com grandes filósofos, como Fabrice Hadjadj, que apresentou o último livro das “equipes” de Dom Giussani. Foi lançada a edição em chinês de O senso religioso; aprofundou-se o diálogo com grandes instituições culturais internacionais, como a Fundação Tony Blair e a Fundação Adenauer. Visitas como a de Joshua DuBois, diretor do Departamento de Relações Inter-Religiosas da Casa Branca, do ex-embaixador inglês no Vaticano, Francis Campbell, e do atual embaixador americano Miguel Diaz, além de diretores de grandes jornais, como Mario Calabresi e Ferruccio De Bortoli, nos obrigaram a tornar mais clara as razões da nossa posição.
Perguntas radicais. Vivemos num mundo “sem Cristo depois de Cristo”, mas onde também se vê o fim das ideologias políticas e econômicas que dominaram a história dos últimos séculos e que agora não se sustentam mais. Se isso pode abrir caminho para o relativismo e o niilismo, pode também tornar as pessoas mais sensíveis frente a exemplos concretos de humanidade verdadeira. Uma posição humana mais respeitosa dos seus desejos profundos é também mais capaz de colocar perguntas radicais em todos os campos do conhecimento. Por isso, a partir das análises feitas na mostra Dentro da crise, além da crise, diversas personalidades do mundo econômico-financeiro se questionaram sobre a necessidade de a racionalidade econômica não se reduzir à maximização egoísta do lucro, mas ser movida por esse “desejo que aciona o motor”, de que fala Giussani. E assim, Sergio Marchionne, diretor da Fiat, ao invocar uma mudança necessária para a vida econômica italiana, confrontou-se com o desejo de mudança tão bem descrito por Giussani: “Não existe verdadeira percepção ideal se não se tornar energia de mudança, isto é, afeição, energia de mobilização do tempo, do espaço, da realidade, em função do ideal”. O alto executivo chegou a dizer: “Preciso refletir sobre o que vi, porque é maior do que eu havia imaginado”.
A mesma experiência ocorreu nos diálogos que muitos dos nossos amigos tiveram, sobre temas como os direitos humanos e a organização do Estado; sobre aspectos diversos das ciências; na arte, com a releitura do Calígula de Albert Camus. Não faltaram temas políticos: antes de tudo, a política internacional com José Barroso, Mary McAleese, presidente da Irlanda, Franco Frattini, Ministro das Relações Exteriores da Itália, em diálogo com os representantes de países árabes sobre o tema da liberdade religiosa; e a política italiana com expoentes da atual classe política questionando-se sobre problemas reais que uma presença de povo e de obras faz emergir, segundo aquela preocupação com o bem comum tão bem expressa pela mostra da Companhia das Obras sobre os afrescos de Ambrogio Lorenzetti sobre o Bom Governo, em Siena.
Assim, muitas personalidades famosas que vieram para falar apenas de um tema específico acabaram percebendo a inteligência da realidade que emerge do Meeting. E se perguntam qual é a origem disso: a inteligência da fé mostra-se pela primeira vez a pessoas que nunca a tinham notado.
Uma realidade estranha. Não era possível deixar de contar para o mundo todo, inclusive por meio dos nossos instrumentos, o que realmente acontece no Meeting; isso foi feito pelo site ilsussidiario.net (média de duzentos mil acessos únicos por dia) e em vídeo, com um verdadeiro telejornal, o Tg Meeting.
Grande parte da mídia, enquanto relatava os encontros e os personagens presentes, descreveu o Meeting como uma realidade “estranha”, a ser respeitada, cada vez mais difícil de ser rotulada: não reúne os justos, nem os puros, nem os bons, mas apenas gente apaixonada por Algo que responde aos nossos desejos mais verdadeiros. “Bestiais como sempre, carnais, egoístas, interesseiros e obtusos como desde sempre o foram, / Porém sempre em luta, sempre reafirmando, sempre retomando sua marcha sobre o caminho iluminado pela luz; / Freqüentemente parando, perdendo tempo, desviando-se, atrasando-se, retornando, porém nunca seguindo outro caminho” (T.S. Eliot, Coros de “A Rocha”).
É a batalha de sempre do cristianismo, a batalha contínua e crucial do Movimento no mundo todo.
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© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón