Estimados irmãos e irmãs no Senhor. “Este é um dia de festa consagrado ao Senhor, nosso Deus; não haja aflição, nem lágrimas... a alegria do Senhor será a vossa força” (Ne 8, 9-10). (...) Este dia é um ponto significativo numa vasta história de esperança, trabalho e generosidade, que dura mais de um século. Neste momento, gostaria de recordar todos e cada um daqueles que tornaram possível a alegria que nos envolve hoje, dos promotores aos executores da obra; dos arquitetos e pedreiros da mesma àqueles que ofereceram, de alguma forma, a sua contribuição inestimável para tornar possível a continuação deste edifício. E recordamos, sobretudo, aquele que foi a alma e o artífice deste projeto: Antoni Gaudí, arquiteto genial e cristão consequente, com a tocha da sua fé que ardeu até o término da sua vida, vivida em dignidade e austeridade absolutas. Este gesto é também, de certo modo, o ápice e a foz de uma história desta terra catalã que, sobretudo a partir dos finais do século XIX, ofereceu uma constelação de santos e fundadores, de mártires e poetas cristãos. Histórias de santidade, de criação artística e poética, nascidas a partir da fé, que hoje recolhemos e apresentamos como oferenda a Deus nesta Eucaristia.
A alegria que sinto de poder presidir esta cerimônia aumentou quando tomei conhecimento de que este templo, desde as suas origens, esteve vinculado à figura de São José. Comoveu-me especialmente a segurança com que Gaudí, diante das inúmeras dificuldades que teve de enfrentar, exclamava cheio de confiança na Providência divina: “São José terminará o templo”. Por isso, então, não deixa de ser significativo que seja dedicado por um Papa, cujo nome de batismo é José. O que fazemos ao dedicar este templo? No coração do mundo, diante do olhar de Deus e dos homens, num gesto de fé humilde e jubiloso, levantamos uma imensa massa de matéria, fruto da natureza e de um esforço incomensurável da inteligência humana, construtora desta obra de arte. Ela constitui um sinal visível do Deus invisível, a cuja glória se elevam estas torres, setas que indicam o Absoluto da luz e daquele que é a Luz, a Altura e a própria Beleza.
Neste ambiente, Gaudí quis unir a inspiração que lhe chegava dos três grandes livros que o alimentavam como homem, como crente e como arquiteto: o livro da natureza, o livro da Sagrada Escritura e o livro da Liturgia. Assim, uniu a realidade do mundo e a história da salvação, tal como nos é narrada na Bíblia e atualizada na Liturgia. Introduziu pedras, árvores e vida humana no templo, para que toda a criação se transformasse em louvor divino, mas ao mesmo tempo tirou os retábulos para pôr diante dos homens o mistério de Deus revelado no nascimento, na paixão, na morte e na ressurreição de Jesus Cristo. Deste modo, colaborou genialmente para a edificação da consciência humana ancorada no mundo, aberta a Deus, iluminada e santificada por Cristo. E realizou algo que é uma das tarefas mais importantes de hoje: superar a ruptura entre consciência humana e consciência cristã, entre existência neste mundo temporal e abertura a uma vida eterna, entre beleza das coisas e Deus como Beleza. Foi isto que realizou Antoni Gaudí, não com palavras, mas com pedras, traços, planos e cumes. E a beleza é a grande necessidade do homem; constitui a raiz da qual brota o tronco da nossa paz e os frutos da nossa esperança. A beleza é também reveladora de Deus porque, como Ele, a obra bela é pura gratuidade, convida à liberdade e elimina o egoísmo.
Dedicamos este espaço sagrado a Deus, que se nos revelou e entregou em Cristo para ser definitivamente Deus com os homens. A Palavra revelada, a humanidade de Cristo e a sua Igreja são as três máximas expressões da sua manifestação e entrega aos homens. “Ninguém pode pôr outro fundamento, diverso daquele que já foi posto, isto é, Jesus Cristo”, diz São Paulo na Segunda Leitura. O Senhor Jesus é a pedra que suporta o peso do mundo, que mantém a coesão da Igreja e que recolhe na unidade final todas as conquistas da humanidade. Nele temos a Palavra e a presença de Deus, e é dele que a Igreja recebe a sua vida, a sua doutrina e a sua missão. A Igreja não tem consistência por si mesma, mas é chamada a ser sinal e instrumento de Cristo, em pura docilidade à sua autoridade e em serviço total ao seu mandato. O único Cristo funda a única Igreja; Ele é a rocha sobre a qual se alicerça a nossa fé. Ancorados nesta fé, procuremos juntos mostrar ao mundo o Rosto de Deus, que é amor e o Único que pode responder ao anseio de plenitude do homem. Eis a grande tarefa: mostrar a todos que Deus é Deus de paz e não de violência, de liberdade e não de coação, de concórdia e não de discórdia. Neste sentido, penso que a dedicação deste templo da Sagrada Família, numa época em que o homem pretende edificar a sua vida de costas para Deus, como se já nada tivesse para lhe dizer, é um fato de grande significado. Com a sua obra, Gaudí mostra-nos que Deus é a verdadeira medida do homem. Que o segredo da originalidade autêntica, como ele próprio dizia, está em voltar à Origem, que é Deus. Ele mesmo, abrindo assim o seu espírito a Deus, foi capaz de criar nesta cidade um espaço de beleza, de fé e de esperança, que leva o homem ao encontro com Aquele que é a Verdade e a própria Beleza. (...). Eis aqui unidas a verdade e a dignidade de Deus com a verdade e a dignidade do homem. Ao consagrar o altar deste templo, considerando Cristo como seu fundamento, apresentamos ao mundo Deus, que é amigo dos homens, e convidamos os homens a ser amigos de Deus. Como ensina o caso de Zaqueu, do qual se fala no Evangelho de hoje, se o homem deixar que Deus entre na sua vida e no seu mundo, se permitir que Cristo viva no seu coração, não se arrependerá, mas irá experimentar a alegria de compartilhar a sua própria vida, como objeto do seu amor infinito.
A iniciativa deste templo deve-se à Associação de Amigos de São José, que quiseram dedicá-lo à Sagrada Família de Nazaré. Desde sempre, o lar formado por Jesus, Maria e José é considerado como escola de amor, oração e trabalho. Os patrocinadores deste templo queriam mostrar ao mundo o amor, o trabalho e o serviço vividos diante de Deus, tal como os viveu a Sagrada Família de Nazaré. As condições de vida mudaram muito, e progrediram enormemente nos âmbitos técnicos, sociais e culturais. Não podemos contentar-nos com estes progressos. Juntamente com eles, devem estar sempre presentes os progressos morais, como a atenção, a tutela e a ajuda à família, porque o amor generoso e indissolúvel de um homem e de uma mulher constitui o âmbito eficaz e o fundamento da vida humana na sua gestação, na sua iluminação, no seu crescimento e no seu termo natural. Só onde existem o amor e a fidelidade, nasce e perdura a verdadeira liberdade. Por isso, a Igreja luta por adequadas medidas econômicas e sociais, para que no lar e no trabalho a mulher encontre a sua plena realização; a fim de que o homem e a mulher que contraem matrimônio e formam uma família sejam decididamente apoiados pelo Estado; para que se defenda a vida dos filhos como sagrada e inviolável, desde o momento da sua concepção; a fim de que a natalidade seja dignificada, valorizada e apoiada jurídica, social e legislativamente. Por isso, a Igreja opõe-se a todas as formas de negação da vida humana e sustenta aquilo que promove a ordem natural no âmbito da instituição familiar.
Ao contemplar admirado este ambiente sagrado de beleza surpreendente, com uma longa história de fé, peço a Deus que nesta terra catalã se multipliquem e consolidem novos testemunhos de santidade, que prestem ao mundo o grande serviço que a Igreja pode e deve oferecer à humanidade: ser ícone da beleza divina, chama ardente de caridade, canal para que o mundo creia naquele que Deus enviou (...). Amém!
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