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Passos N.108, Setembro 2009

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ACONTECE

Educação: tarefa do homem, tarefa do cristão

No dia 20 de julho, em São Paulo, o educador italiano Franco Nembrini realizou um encontro nacional apresentando alguns pontos do livro de Dom Giussani, Educar é um risco (Bauru, EDUSC, 2004). O evento reuniu pouco mais de cem pessoas e muitos chegaram de longe para ouvi-lo: “Vale a pena estar aqui se vocês se colocam em questão a partir do que iremos ouvir. Queremos começar hoje um trabalho conjunto”. Nembrini introduziu o encontro afirmando que a educação não é o trabalho de alguns (dos pais ou dos professores), mas a educação é a profissão do homem, pois ao viver o homem testemunha o seu modo de ser e educa, sendo isso o que nos diferencia dos animais e nos faz semelhantes a Deus.
O ponto de trabalho foi a parte central do livro, que tem como título “Dinâmica e fatores do acontecimento educativo”. Para falar de conceitos como tradição, certeza e autoridade, Nembrini se utilizou de muitos exemplos destes 30 anos como educador. Ao citar a “hipótese explicativa da realidade”, falou da necessidade de a criança ver um adulto que tenha uma hipótese boa para a vida e falou da própria experiência: “Um domingo, quando meu mais velho, Stefano, estava com seis anos, eu estava concentrado, corrigindo alguns trabalhos. Ele tinha se aproximado da mesa em silêncio e estava me olhando trabalhar. Não pedia nada em particular, não tinha sede, nem fome e nem precisava de nada em especial. Ele me olhava e basta. Lembro como se fosse hoje que quando meu olhar cruzou o olhar de meu filho naquele dia, uma ideia me atravessou a mente: que o olhar de meu filho continha uma pergunta absolutamente radical. Era como se, me olhando, perguntasse: ‘Papai, assegure-me de que valeu a pena ter vindo ao mundo’. Então, quando Dom Giussani diz que a tradição é a palavra mais importante da educação, pretende dizer isso: que o problema da educação não está nas crianças, mas no adulto, pois é o adulto que se propõe diante do filho ou do aluno ou de quem estiver diante dele, porque está verificando uma hipótese boa a respeito da vida e da realidade. As crianças veem ao mundo como sempre vieram: com o desejo de felicidade. Se hoje nós estamos em uma ‘emergência educativa’ é porque não existem mais adultos que testemunhem a bondade do real”.
Por Isabella Alberto


Apresentação da Caritas in Veritate
Por Dimitri Martins e Davi Brazil

No dia 29 de julho de 2009, aconteceu no auditório do Centro de Pesquisa e Extensão (CEPEX) da Universidade Católica do Salvador, a apresentação da nova encíclica do Papa Bento XVI, Caritas in Veritate (Caridade na Verdade), contando com a presença de Dom João Carlos Petrini, Camilo de Santa Bárbara Júnior, Padre Maurício Ferreira e Otoney Alcântara. Cada palestrante destacou certos aspectos específicos, de acordo com suas respectivas áreas de interesse e inquietação.
Dom Petrini, Bispo Auxiliar de Salvador, foi o mediador e fez uma pequena introdução à apresentação. Para ele, a nova encíclica é uma proposta de diálogo com todos do mundo moderno, principalmente com os cientistas e intelectuais dotados de certa “pobreza de espírito”, isto é, dispostos a se desapegar, para fins de reflexão autêntica, dos seus esquemas ideológicos, segundo os quais pretendem explicar toda a realidade. Há algum tempo tem sido um tema recorrente das falas do Papa a proposta de alargamento da razão. Vale dizer que a problemática atrelada ao estreitamento da nossa humanidade é conseqüência direta do triunfo do ideário iluminista. Uma vez perdido o vínculo vital e de identidade com o Mistério, abre-se o caminho para o uso e instrumentalização da pessoa. Podemos dizer que hoje se vive num mundo de muita intimidade e pouco amor, caritas, dom de si mesmo para o bem do outro. Diante desse cenário – pergunta-se Dom Petrini: "onde podemos encontrar a fonte do amor por excelência?" E responde: "Em Deus".
Já para Camilo, Mestre em Sociologia e Professor da Universidade Federal de Sergipe, uma grande observação que o Papa nos faz com essa encíclica é a de que “o receber tem precedência sobre o fazer”. Antes de qualquer outra coisa, nós recebemos dois dons básicos, não contraditórios entre si, mas complementares: a Criação e a Salvação. Outra conclusão que podemos destacar é o diagnóstico de que a lógica da dádiva, tal como abordada na encíclica, corresponde ao ideal organizativo da sociedade, porque a lógica da dádiva é anterior ao mercado e ao Estado.
Para padre Maurício, doutor em teologia moral e professor da Faculdade São Bento, a caridade na verdade não é uma terceira via ideológica, dado que a doação de si possui uma substancialidade própria. Nas suas discussões sobre o desenvolvimento humano, entendido aqui como crescimento total do “eu”, o Papa Bento XVI resgata o conceito de “humanismo integral”, do filósofo francês Jacques Maritain. Esse mote é uma síntese capaz de contemplar de modo razoável a complexidade da personalidade humana. Em acréscimo, o Santo Padre posiciona-se contra uma visão da política enquanto caminho salvífico por excelência. Isso significa dizer que a plenificação da pessoa não será alcançada por uma perspectiva exclusivamente imanente, uma vez que os seres humanos sozinhos não são capazes de alcançar a salvação. Nesse sentido, o primeiro passo para a redenção é olhar a si e ao semelhante como dom de um Outro, postura capaz inclusive de modificar as relações dentro do mercado.
Por fim, Otoney, advogado e professor de Direito Constitucional na Faculdade de Tecnologias e Ciências, mostra o ponto principal da encíclica: a afirmação de Bento XVI de que o anúncio de Cristo é a mola propulsora de um desenvolvimento verdadeiramente humano, caracterizado por um crescimento integral do “eu” e pelo florescimento de todas as suas potencialidades. As mediações que permitem o amplo impacto da caridade na sociedade são, então, os fatores que promovem a capacidade associativa dos cidadãos, isto é, o reconhecimento e a prática dos princípios de solidariedade e subsidiariedade entre todas as comunidades constitutivas do corpo social. Em acréscimo, Bento XVI destaca como a caridade supera a justiça, uma vez que a doação de si a um outro só faz sentido quando a esse outro já foi entregue tudo o que lhe pertence por direito. A proposta de vivência da caridade na verdade é um convite a pessoas interessadas em agir de modo reto, tendo em vista o bem comum, a despeito de suas limitações e do reconhecimento do pecado original. Sem dúvida alguma, sua viabilidade não é possível sem uma educação de nossa humanidade que seja coerente com as nossas exigências elementares, nosso desejo de eternidade e de infinito.



 
 

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© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón

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