O caminho para Jos
Ronald olha em volta. Parece que não se esqueceu de nada. Está já na porta de casa quando vê um exemplar de Traces sobre a mesa. Pega-o e guarda na bolsa. A viagem de Jalingo a Jos é longa: 600 quilômetros pela savana nigeriana. Decidiu não ir de carro, mas num pequeno ônibus que faz a ligação entre as duas cidades. Terá, pois, um bom tempo para ler a revista. Consulta o relógio. Está na hora.
Quando embarca, há apenas um lugar vago, ao lado de dois passageiros. Senta-se e olha para fora pela janela. Quando o ônibus deixa a cidade, a paisagem é sempre igual: a planície amarela, queimada pelo sol, e no horizonte o suave perfil das colinas. Ronald pega Traces, folheia-a até o artigo sobre o Meeting do Cairo e começa a ler. Depois de alguns minutos, tem a nítida impressão de que seus dois vizinhos estão de olho na revista. Aliás, parece que também estão lendo o artigo. A certeza vem quando um dos dois pergunta: “Desculpe, posso lê-lo?”. Ronald, um tanto embaraçado, passa-lhe a revista. Logo entendeu que são muçulmanos. Ronald fica preocupado. São dias de tensão entre cristãos e muçulmanos. Antes de partir ficou sabendo que em Bauchi também há conflitos. A estrada que leva a Jos passa justamente por ali. Não há alternativa. E agora estão perto. No pequeno ônibus, reina o silêncio. A tensão é alta e também o medo pelo que possa acontecer.
No entanto, durante meia hora, os dois homens não tiram os olhos de Traces. Quando a entregam de volta, perguntam a Ronald: “Onde você compra essa revista?”. “Lá da Itália me mandaram uma assinatura. Chega todo mês”. Um dos homens retoma o exemplar, abre na página onde está o artigo do Meeting egípcio e diz: “Se isso acontecesse aqui na Nigéria, haveria a paz”. Ronald pergunta em voz baixa: “O que você acha desses conflitos, da crise entre cristãos e muçulmanos?”. “A realidade é diferente do que parece. Acho que esses grupos de pessoas egoístas, que não se preocupam com a humanidade, mas só em seus interesses, usam a minha religião como pretexto”. “E o que você acha dos cristãos?”. “Eles também pegaram em armas, e isso é ruim. Mas os inocentes é que sofrem no final do dia”. Aos poucos, os outros viajantes também entram na conversa.
Finalmente, chegam em Bauchi. Pela janela dá para ver casas e carros em chamas, homens correndo com o fuzil na mão, ouvem-se disparos. No entanto, apesar do medo, no ônibus continua a conversa sobre paz, felicidade, diálogo. A leitura daquela experiência, daquela beleza inesperada, mexeu com os corações.
A viagem prossegue sem problemas. Parece quase impossível, mas Ronald e os outros chegam a Jos sãos e salvos. Na calçada, depois das saudações, passam uns aos outros seus endereços: “Vamos nos falar. Logo”. Nasceu uma amizade. E isso também parecia impossível.
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