Histórias de certeza no dia a dia na doença. Para Angela e sua família, enfrentar o câncer foi “uma luta sem trégua”. Cheia de surpresas e fatos nunca vistos antes
Estávamos neste so-fá. Ainda me lembro bem”. Passou-se apenas um ano daquela tarde de outubro, mas Gigi jamais se esquecerá dela. Angela, sua esposa, tinha recebido há pouco o diagnóstico de um câncer nos ossos. E ali decidiram contar o caso aos filhos, Francesco e Matteo. Na salinha onde tinham visto dezenas de filmes e jogos, entrava agora em cena algo que ninguém poderia prever. “Não sabíamos o que iria acontecer, mas tínhamos clara uma coisa: a realidade é positiva. Ainda que, naquele momento, não tivéssemos garantias: foi um salto no escuro”. Dentro da normalidade daquele lar na periferia de Parma. Por força do que Gigi, eletricista, e Angela, funcionária da universidade, haviam vivido no Movimento: “Segui de um modo infiel, inconstante, belicoso... Mas não desisti nunca”, escrevia Angela numa das suas últimas cartas.
Morreu às 4h20 do último dia 31 de agosto, com o céu ainda escuro. Junto dela, no quarto de uma casa de recuperação, para onde foi levada três semanas antes, umas quinze pessoas, entre familiares e amigos, rezavam desde o início da noite. “Naquela noite, experimentei a presença de Alguém que salva da morte”, conta Francesco, 18 anos. Por meio daqueles rostos: “Pequenos sinais, mas concretos. Por exemplo, fiquei sem palavras pela maneira como nos ajudavam. Havia gente que eu nem conhecia. Uma delas me contou: Eu estava querendo ir embora logo. Depois entendi que estava acontecendo alguma coisa grande. E decidi ficar”.
Na luta, a companhia nos sustenta. “Lutamos até o fim”, recorda Gigi. “Angela, sobretudo: toda manhã precisava reconquistar a consciência do seu sim àquela circunstância, para que se tornasse mais pleno”. Apesar de diariamente as coisas piorarem para ela. “Dizem que eu não sairei mais da cama. Cristo quer ainda mais”, escrevia. “Minha vida só tem um sentido se se tornar certeza da Sua presença. Se não for assim, perderemos tempo”.
Mas assim foi. Viu-se no seu funeral e naqueles oitocentos rostos que lotavam a Catedral: “Não celebramos a morte de Angela, mas o testemunho que nos deu”, disse padre Lorenzo na homilia. ‘O fato de estarmos aqui é o sinal da vida nova que o Senhor traz”. A própria Angela dizia isso aos seus amigos: “Os seus rostos, o fato de vocês estarem ao meu lado torna evidente a Sua presença”. Por isso, até o funeral foi uma festa, com os cânticos de que ela gostava, de Chieffo aos espanhóis: “Em continuidade com o Happening que propusemos na cidade uma semana depois”, diz Gigi; e com a churrascada que os filhos fizeram com os amigos naquela noite; e com a música e as brincadeiras: “Para que todos vissem que se pode viver assim”. E mesmo quem os conhecia pouco percebeu a diferença, como a professora de Latim de Francesco: “Ela disse: Vocês me fizeram sentir o amor de Deus”. Ou como aquela jovem que ia toda noite à discoteca e agora os segue por toda parte: “Ela não consegue entender como podemos enfrentar tudo desse jeito”, diz Francesco. Inclusive uma freira da casa de recuperação se deu conta disso: “Eu lhes agradeço. Foram vocês que nos deram um testemunho”. Para não falar da mudança da vovó Rosa: “Já viúva, ela não aceitava a doença de Angela”, conta Francesco. “Mas com todo aquele povo na recitação do rosário e no funeral, começou a ceder: Será possível que estão aqui só por causa da minha filha?. Aos poucos, conheceu as amigas dela... Agora, encontram-se para preparar os bolos para os encontros da Fraternidade. Inclusive me disse: Agora intuo que o Paraíso é muito mais perto do que pensamos”. Mérito deles? “De jeito nenhum”, diz Gigi. “Nós nos sentimos mais espectadores do que atores: tudo aconteceu apesar de nós. Bastou um sim”.
E agora? “A dificuldade não acabou”, explica Francesco. “Mas o desafio é o mesmo: não podemos parar no sim de ontem. Tudo depende de como a gente recomeça hoje”. Como ocorreu outro dia, quando seus amigos se encontraram para as Laudes antes da escola: “Eu entrava mais tarde, então queria ficar na cama. Mas me chegou uma mensagem no celular... Em suma, fui. Talvez eu estava menos espontâneo, mas aquele dia foi de fato intenso. Foi cheio, não de tristeza, mas d’Ele. É isso que desejo para sempre”.
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