Vai para os conteúdos

Passos N.56, Novembro 2004

50 anos de CL / Experiência

Realmente úteis à companhia humana

por Giorgio Vittadini

O cristianismo se identifica com um Fato e não com uma ideologia, da qual se faz experiência. Há 50 anos a vida do Movimento é o testemunho de pessoas que não têm vergonha de Cristo, de dizer quem é Cristo. E por isso criam ocasiões de amizade e de esperança para todos, onde quer que seja com um ímpeto de valorização de tudo aquilo de verdadeiro, de belo, de bom e de justo que permanece em qualquer pessoa

Verdadeiramente úteis à companhia humana: desde o primeiro dia a boa nova cristã quis mostrar um modo diferente e mais humano de tratar-se. Os primeiros diáconos, como Santo Estevão, trabalhavam no serviço às viúvas, que eram as pessoas mais indefesas da sociedade de então.
Assim, na analogia profunda com a vida da Igreja, quem encontrou o carisma veiculado ao Movimento tem um modo mais humano de viver os problemas dos homens. Gioventù Studentesca (GS) se firmou logo na escola de Milão e de repente deu vida à primeira batalha para a democracia: não para si mesmo, mas para aquelas minorias que arriscavam ficar excluídas na representação estudantil, como estava acontecendo com os estudantes hebreus. Nos anos da guerra fria e das contraposições ideológicas, Giussani inaugurou assim, nas aulas do Berchet, um modo novo de entender a democracia: superar as lógicas de alinhamento incentivando cada um a colocar em jogo até o fundo as próprias perguntas últimas, na comparação com o real. Essas primeiras batalhas para uma verdadeira liberdade de expressão e para a democracia foram a profecia da vida do Movimento em todos esses 50 anos: três exemplos provam isso para todos.
Muitíssimos, entre os quais figuras importantes da política italiana, como Andreotti e Cossiga, afirmaram várias vezes que a tentativa de presença pública do Movimento na universidade nos anos 70, as assembléias na universidade, a participação nas eleições universitárias, o “Atlantide” (grandes cartazes com juízos que eram afixados nos murais), a resistência pacíficas às cusparadas, aos ataques à sede, às calúnias jornalísticas, foram fundamentais para a restauração da democracia na Itália.

Contra os novos farisaísmos
Da mesma natureza foi, nos anos sucessivos, a batalha contra os novos farisaísmos que mais de uma vez tentaram dividir a sociedade entre puros e impuros (da marcha dos honestos até a instrumentalização política de “Tangentopolis”). O Movimento esteve na linha de frente ao recordar com debates, artigos, livros, panfletos, que a violência nasce quando, em vez de reconhecer o próprio mal, pessoal e social, se procura esquecê-lo construindo ideologias, religiosas ou políticas.
Por fim a batalha em favor de “Mais sociedade, menos Estado”, que depois se tornou empenho pela subsidiariedade (que levou à introdução, em 2001, do conceito de “subsidiariedade horizontal” na Constituição italiana), não foi outra coisa do que a tradução daquela batalha inicial pela liberdade do princípio econômico e político, voltada para favorecer a criatividade social na nossa sociedade. É isso que defendem os muitos que pertencem ao Movimento e entraram na política, servindo a causa pública também nos cargos importantes (Formigoni em primeiro lugar). A atividade dos numerosos Centros Culturais e o Meeting de Rímini – que se tornou um lugar de diálogo internacional, exemplo virtuoso de uma possibilidade de confronto muito diferente da dialética barulhenta dos programas de auditório – são expressão desse contínuo agir em favor do pluralismo e da democracia.

O olhar sobre o mundo
Essa mesma paixão pela liberdade de todos é também a primeira constante do olhar do Movimento sobre o mundo. Nos anos da guerra fria, centenas de pessoas iam à União Soviética encontrar dissidentes famosos e gente comum. No próprio Meeting e em debates públicos foram recebidos Tarkovskij, Walesa, dissidentes russos, amigos de Irina Amberti. As editoras Rússia Cristiana, Cseo e Jaca Book publicaram seus textos entre os quais O Poder dos Sem Poder, do futuro presidente Vaclav Ravel. Nos momentos cruciais das relações Leste-Oeste, dos euromísseis à crise da Solidarnosc, não faltaram manifestações públicas. Trata-se do mesmo empenho que nos levou a dizer o nosso “não à guerra, sim aos Estados Unidos”, em um empenho contra os extremismos ideológicos opostos dos senhores da guerra e dos pacifistas relativistas sobre os direitos humanos dos povos.
Exatamente essa paixão pela liberdade, potencializada pela fé encontrada, distinguiu a relação do Movimento com o mundo inteiro. “Viver as dimensões do mundo” foi o primeiro debate de GS na metade dos anos 60, que foi testemunho da certeza de que a novidade para o mundo era a vida nova vivida nas comunidades cristãs e de que se tratava de vivê-la em qualquer lugar.

No Brasil, em missão
Os primeiros missionários partiram para o Brasil no começo dos anos 60 com Pigi Bernareggi. Quem ficou, depois da crise de 1968, não propôs nada mais do que a comunidade cristã, a sua capacidade de partilha, de cultura, e de caridade.
Foi exatamente essa caridade vivida nas favelas de Belo Horizonte, assim como no Congo ou nos guetos da Uganda, que inevitavelmente abriram a dimensão da obra como resposta orgânica às necessidades das pessoas e vivida segundo os critérios dados pela experiência de fé: “avaliem cada coisa e fiquem com o que tem valor”. Nasceu a Fundação Avsi, na qual pessoas do terceiro mundo e européias cooperavam para um desenvolvimento, fruto da vida cristã comum. Obras caritativas para os doentes de Aids em Kampala, o hospital para crianças de Bucareste e ainda, obras educativas, escolas de grandes e pequenas dimensões em Santiago, em Nairobi, em Manaus, pequenas empresas espalhadas pelo mundo, da marcenaria de Nairobi à Team Service, empresa de limpeza italiana reproduzida no Chile. São pequenos, mas significativos exemplos da atuação do slogan de Paulo VI: “O verdadeiro nome da paz é o desenvolvimento”, e da nova convivência entre os povos preconizada por João Paulo II. São exemplos que vivem no novo e alegre protagonismo dos jovens cazaques, brasileiros e nigerianos do Movimento.
A mesma paixão pela vida e pelo progresso humano são comunicadas por muitas obras nascidas na Itália. As obras caritativas (como a Cooperativa Solidariedade, o Banco Alimentar, as Famílias para Acolhida) mostram como o amor cristão ao homem concreto já é um projeto de resposta orgânica às suas necessidades. As mais de 300 escolas e os milhares de professores de todo tipo e graduação, que, tomando o exemplo do Instituto Sagrado Coração, de Milão, procuram construir na Itália um modo diferente de educar e ensinar. As 30 mil empresas associadas à Companhia das Obras, que, além de criar milhares de postos de trabalho, são um modo diferente de conceber a empresa, ligado à capacidade do homem de gerar a sua capacidade de educar e valorizar o capital humano, à abertura a mudanças e inovações.

Uma cultura nova
Portanto, não é por acaso que de toda essa atividade e, sobretudo, daquilo que a precede – aquele diálogo estreito sobre a vida que é a Escola de Comunidade –, nasce também uma cultura nova, como consciência crítica e sistemática de uma experiência em curso. Apenas alguns exemplos: os primeiros fichamentos para releitura crítica dos conteúdos escolares, os debates culturais públicos (Galileu, as batalhas na Universidade Católica de Milão nos anos 70 e do semanário Il Sabato), a coordenação cultural das escolas, as editoras, os já citados centros culturais, o Meeting de Rímini, os Centros de Estudo sobre Ecumenismo, a Fundação para a Subsidiariedade, a atividade de introduzir associações como Euresis e Medicina e Pessoa no meio científico.
São contribuições originais à vida de todos que nasceram de uma experiência de busca contínua da verdade e da experiência de vida cristã. Não é por acaso então, que essa verdade seja abertura ao verdadeiro em todos. Isso se vê, sobretudo, nos Estados Unidos, onde a abertura ao novo, à ciência, à tecnologia, unida ao desejo de conhecer que é próprio do Movimento, levou muito amigos aos órgãos mais avançados do mundo, da Fermilab à Nasa, em Bethsesda, levando Cristo para onde tinha sido expulso.
A simpatia por qualquer procura de verdade do homem fez nascer encontros e debates com outras experiências religiosas. Da discussão dos livros de Giussani nasceram amizades com protestantes, como Archie Spencer; cresceu a fraternidade com judeus e ortodoxos e o diálogo com muçulmanos e budistas.
É a contribuição para uma imagem de homem mais verdadeiro, mais ligada ao seu senso religioso. Verdadeiramente úteis à companhia humana.

 
 

Credits / © Sociedade Litterae Communionis Av. Nª Sra de Copacabana 420, Sbl 208, Copacabana, Rio de Janeiro - RJ
© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón

Volta ao início da página