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Passos N.56, Novembro 2004

50 anos de CL / Testemunhos

Da Rússia ao Canadá.
Abrir as portas a Cristo

por Cecilia Zucchi

O encontro com John. O casamento, a transferência para o Canadá, o nascimento dos quatro filhos… e tantos encontros que abriram o coração e a casa a uma experiência maior, além de todas as medidas

Aquilo que sustentou em todos esses anos o nosso casamento foram algumas palavras que don Gius nos dirigiu quando nos casou: “A honra da vossa escolha não está em ter escolhido o casamento mais que uma outra vocação, porque a vocação é sempre Deus que a dá, é sempre Deus que escolhe; a honra dessa vossa escolha está no fato de não ter reduzido o sinal ao nível só natural, de ter aceitado que essa vocação coincida com a construção da Igreja, que é a glória de Cristo no mundo”.
Antes de me casar – há 18 anos – mudei-me por dois anos para Moscou, onde ensinava na escola italiana. Mesmo não sendo do Grupo Adulto fui viver com uma moça dos Memores Domini. Por dois anos vivemos de um modo muito silencioso porque, estando na época do Comunismo, não se podia exprimir nosso pertencer de modo visível. Devagarzinho, vivendo com aquela moça, dei-me conta que afirmar e reconhecer a presença de Cristo – que se manifestava para mim por ela e por outras pes-soas – podia sustentar todo o meu desejo e realizar a fecundidade que eu desejava.

Convites a toda hora
Depois encontrei John e a perspectiva de morar no Canadá, onde ainda não havia a comunidade do Movimento, causava-me um pouco de medo porque entendia que também o meu casamento devia ser sustentado, ajudado, devia fazer parte de um âmbito maior. A experiência que havia feito em Moscou com Helena trouxe-me a certeza de que, então, por meio daquele rosto e, agora, por meio de John, poderia começar a reconhecer Cristo, a desejar encontrar outras pessoas. Definitivamente, estava ali a possibilidade de ser feliz.
Quase de repente, por graça, nos foram dados muitos amigos, chegaram os filhos, e esse alargar-se da nossa unidade fez com que crescesse, também, o ímpeto de conhecer e convidar outras pessoas, de abrir as portas da nossa casa.
Com efeito, John convidava as pessoas, sem muita consideração, a toda hora, e eu muitas vezes tinha a tentação de pôr limites. Dizia-me: aqui não se entende mais nada, a que horas vamos dormir, quem deve ir para a escola, quem deve fazer as tarefas, etc… Apesar dessas minhas dúvidas, dessas minhas resistências, eu percebia que os nossos amigos, aos poucos, tornavam-se também verdadeiramente amigos dos nossos filhos, que a nossa companhia tornava-se, de verdade, um lugar que os educava, que dava a eles uma dimensão grande. Por isso conti-nuávamos a abrir as nossas portas e a encontrar a todos: do diretor do Jornal Cotidiano de Montreal a pessoas bastante desastradas do ponto de vista psicológico: todos. A propósito, queria contar uma história sobre um bispo que estava conosco na Assembléia Internacional.
Carras tinha encontrado dom Wingle que era, então, bispo da Nova Escócia, um lugar belíssimo sobre o Atlântico. John, entre maio e junho, me disse: “Este ano não tive tempo de encontrá-lo porque tinha muitas coisas para fazer. Peguemos os quatro filhos e vamos passar as férias em sua casa”. Eu fiquei um pouco perplexa, porque dizia: não é possível, é muito trabalhoso fazê-los se comportar bem, conseguir falar tranqüilamente, etc… No entanto chegamos lá, depois de 18 horas de viagem de carro, e encontramos dom Wingle com uma pistola d’água, pronto para brincar com nossos filhos…

As mães da escola
Um outro lugar de encontro foi a escola dos nossos filhos. Sendo o Canadá bilíngüe, as nossas crianças vão à escola francesa, e ali conheci muitas mães que convidei para irem à nossa casa e das quais tornei-me amiga. Na verdade, nenhuma delas veio conosco para o Movimento, e assim me dava conta de que era um gesto gratuito poder ser amiga delas, estar próxima delas, pois na América do Norte existe uma grande pressão para que as mães sejam perfeitas, eduquem os filhos como os melhores da classe, etc. Cedo ou tarde não agüentam mais. Assim – apesar de não conseguirem estar na nossa amizade – dão-se conta de que existe algo misterioso dentro da companhia que oferecemos a elas, tanto que ainda agora muitas procuram para seus filhos a companhia dos nossos.
O fato de abrir a nossa casa teve finalmente um momento fundamental. Uma italiana do Grupo Adulto foi a Montreal, mas por várias circunstâncias, não existindo ainda uma casa dos Memores Domini, veio ficar seis meses conosco. E foi realmente o romper-se absoluto da medida, porque foi totalmente inesperado e, conforme o tempo passava, eu reconhecia que ela tinha entrado na nossa casa para ser a companhia inesperada de Cristo, portanto, para lembrar-me também que as outras pessoas (meus filhos, John, e os outros amigos que nos rodeavam) são essa presença para nós. Posso dizer que essas reflexões são fruto da gratidão por aquilo que estivemos estudando na Escola de Comunidade: o valor de cada gesto está no fato de ser oferecido. Percebo que isso não está continuamente presente na minha memória, mas é uma certeza que me dá uma paz enorme, à qual posso retornar sempre como consciência profunda, mas também como pedido de perdão.

 
 

Credits / © Sociedade Litterae Communionis Av. Nª Sra de Copacabana 420, Sbl 208, Copacabana, Rio de Janeiro - RJ
© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón

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