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EDITORIAL

Uma simpatia humana

Olhando para nossa vida normal – o trabalho, a escola ou a universidade –, o cotidiano, podemos nos surpreender já à mercê das coisas, cansados de enfrentar a rotina (os colegas de sempre, as incumbências inevitáveis...) ou até entristecidos. Ou podemos nos descobrir vivos, desejosos de enfrentar a mesma rotina, curiosos por ver o que acontecerá a cada dia. Contentes, em suma. Cheios de esperança.
É uma encruzilhada sutil, quase imperceptível, mas real. E não depende daquilo que fazemos ou dizemos: é uma postura de fundo, algo que – objetivamente – vemos aflorar no modo de enfrentarmos a realidade. Estamos diante do cotidiano com a mesma posição que temos diante dos maiores problemas: fechados ou abertos, curvados sobre nós mesmos ou escancarados ao novo. Mas, o que faz a diferença?

No meio da revista vocês lerão o texto de uma reflexão de padre Julián Carrón, responsável de Comunhão e Libertação. É a síntese de quatro dias de encontros e diálogos com os responsáveis internacionais do Movimento. A certo ponto, ao retomar a frase dita por um dos presentes (“a certeza de ser amado me permite abraçar a realidade”), Dom Giussani é citado: “O sintoma da certeza é a simpatia humana por tudo aquilo que encontramos. De fato, [essa] simpatia só pode ser dada pela presença em nós da certeza do destino”.
Uma certeza. Na grande insegurança em que vivemos, o que devolve o gosto, a vontade de encarar “tudo o que encontramos” – o que liberta – é uma certeza. E não uma certeza nos nossos projetos, e propósitos: vemos bem como são inadequados para suportar o impacto das coisas. Mas uma “certeza do destino”, uma redescoberta contínua e cada vez mais profunda daquilo que somos: “amados”. É isso o que permite abraçar a realidade.

E como estamos vivendo esse período de eleições políticas? Também essa é uma ocasião para verificar qual é a minha postura, o que me move. Na Europa é um momento de muita desilusão e ceticismo, no Brasil vive-se a esperança de que “daqui a pouco vai melhorar”. Mas, com relação à política, a desilusão é a mesma. Parece que essa palavra remete a uma doença incurável. Então, essa é uma ocasião para não censurar algumas perguntas: tenho ainda esperança? Qual é a minha esperança? De onde se pode recomeçar? O que eu posso fazer? Qual é a minha contribuição?
O problema da política não é um problema dos políticos, é um problema nosso. Da nossa sociedade, da nossa humanidade. Se a política é se interessar pelo bem comum, pelo bem de todos, é preciso reconquistar um olhar novo sobre o eu. Porque só na descoberta do valor do eu é que nasce a paixão pelo próprio bem e de todos os outros eu’s.

Neste número de Passos podem ser encontrados muitos sinais desta dinâmica. Todos representam o mesmo abraço citado em muitos testemunhos cotidianos, como os descritos nas cartas, ou nos relatos de Dr. Paulo de Carvalho sobre o olhar às pessoas que ele condena para cumprir pena nas APAC’s, e assim por diante.
Tudo eco do que acontece quando o coração da vida, como diz o Papa, se torna “a presença forte e simples de Jesus, a sua misericórdia consoladora e que dá coragem”, e não outra coisa. Eco de quando, aos poucos, no tempo, tornamo-nos mais certos d’Ele e do fato de que somos amados. Porque, no fundo, é para isso que o tempo serve, inclusive aquele que recomeça agora, em meio às eleições municipais que somos chamados a enfrentar: para nos dar a certeza de que somos amados.

 
 

Credits / © Sociedade Litterae Communionis Av. Nª Sra de Copacabana 420, Sbl 208, Copacabana, Rio de Janeiro - RJ
© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón

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