No dia 13 de março passado, o Senhor nos surpreendeu de forma inesperada. Ficamos arrebatados em um profundo silêncio. Havia sido eleito um Papa argentino. Quem sabe, para outras latitudes, isso seria irrelevante, mas para nós... Um Papa argentino, um homem no nosso povo. Foi um imprevisto, sem precedentes na História da Igreja.
Com um grupo de CL de Santa Fé, queríamos organizar um gesto por ocasião do Ano da Fé, mas a imponência da eleição de Francisco nos obrigou a centralizar nossos olhares nisto. Quem é Francisco? De onde nasce sua capacidade de despertar os corações? Para encontrar respostas a estas perguntas decidimos convidar alguns amigos do então Cardeal Jorge Mario Bergoglio para um diálogo público que foi realizado no dia 24 de setembro.
Os convidados foram o padre Juan Isasmendi, dos chamados “curas villeros” (sacerdotes das favelas), e Marcelo Figueroa, evangélico, locutor de televisão. Juan Isasmendi trabalha com o padre Pepe Di Paola na favela de Barracas. Um sacerdote jovem, de 32 anos, ordenado por Bergoglio, fez uma entrevista com o cardeal na rádio do bairro, uma das poucas e a última, antes que fosse eleito Papa, enquanto tomavam chá-mate.
Marcelo Figueroa, de confissão evangélica, apresentador do programa televisivo “Bíblia, diálogo vigente”, junto com o Rabino A. Skorka e o cardeal J. Bergoglio, haviam se conhecido em atividades ecumênicas. Quando Marcelo se encontrou sem trabalho, o cardeal o contratou para trabalhar no canal de televisão do arcebispado de Buenos Aires.
Comunicar com estas pessoas foi começar a tocar com as mãos aquele imperativo (essencial) de Francisco: “Saiam!” Aquilo que ele já fazia, nos bairros, para os mais pobres dos pobres; para outras religiões; no diálogo com eles... Assim Francisco se converteu em alguém que nos tomava pelo braço tirando-nos do nosso esconderijo.
Tão importante era organizar o encontro como divulgá-lo. Como fazer para que todos saibam? Um publicitário nos sugeriu que fossemos as rádios, à televisão e aos jornais. Gravamos um áudio para o rádio, escrevemos para os jornais, fizemos os desenhos gráficos, divulgamos no Facebook... A partir dali, o que marcou nossos últimos meses foi sair ao encontro, de todos. Desde o mecânico de carros, até o comerciante que confeccionou as camisas para o serviço de ordem. Desde os professores dos colégios das crianças, até os antigos alunos de Bergoglio. Porque Bergoglio foi professor em Santa Fé, nos anos de 64 e 65, no colégio da Imaculada Conceição, dos padres jesuítas, lugar onde celebramos o encontro. O diretor do colégio, quando fomos pedir a sala, nos disse que colocaria tudo a disposição, porque eles queriam se juntar ao evento, “estou tão contente com o que estão fazendo”, acrescentou.
Um amigo, que ia levando os cartazes às paróquias, ao entrar em uma delas, se encontrou com o sacerdote, que lhe disse: “Comunhão e Libertação, sempre me interessou, mas nunca havia conhecido alguém de CL”. Fez com que entrasse no seu escritório e depois conversou por uma hora com ele, debaixo do vidro de sua mesa tinha o Cartaz de Páscoa de CL de 2012.
Tampouco estivemos isentos de dificuldades. Faltando 20 dias para o encontro, nos faltava quase todo o dinheiro. Dois dias antes, um amigo havia conseguido as impressões grátis, e isso havia diminuído os custos. Mas o dinheiro faltava. No dia seguinte, escrevemos uma carta solicitando ajuda. Imediatamente nos responderam que queriam colaborar com o patrocínio principal. A poucas horas, respondeu outra pessoa, dizendo o mesmo. À tarde chamou mais um. Ao final do dia, na missa, a leitura era a de Pedro, que havia pescado toda a noite e não havia conseguido nenhum peixe, e Jesus diz a ele que lance outra vez a rede e a puxa cheia de peixes. Toda a questão do dinheiro tinha acontecido para que pudéssemos dizer: “É o Senhor”. E isto se transformou em uma grande alegria, “a alegria que só Ele pode dar”.
Poucos dias depois, voltou a acontecer o mesmo, tínhamos conseguido só dois meios de comunicação, uma rádio e um canal de televisão. Quando vieram gravar para a tv, o jornalista nos disse: “me encanta o que estão fazendo, quero ajudá-los a divulgar”. Então nos deu páginas de nomes e telefones de jornalistas. Durante quinze dias, não parávamos, dando notas na rádio, na TV, e nos jornais. Foram dias muito divertidos! Estávamos fazendo “confusão” como nos pediu Francisco!
E nós entendemos que os peixes logo acabam, mas o Senhor, não. Ele dura para sempre. Alguns meses atrás, uma amiga lançou uma pergunta na Escola de Comunidade: como posso me apaixonar por Cristo? Nós a convidamos para participar na organização do encontro. Ela se envolveu completamente. Logo nos disse: "A presença do Papa me perturba porque é um homem apaixonado: Isto me provoca”. Depois de muitos dias de encontros e de partilha, hoje essa amiga tem cara de apaixonada, e uma alegria que contagia quem está ao seu redor.
Finalmente, chegou o dia do evento. O padre Julián de la Morena já estava conosco desde o dia anterior, visitando nossas comunidades, compartilhando nosso cotidiano, envolvendo-se como qualquer um de nós nos detalhes da organização.
Só tenho uma palavra para definir o que ocorreu: aconteceu um encontro. Juan e Marcelo mostraram uma disponibilidade incrível, e nos trataram a todo momento como se nos conhecêssemos desde sempre.
Nós nos encontramos com duas pessoas que abriram seu coração, para nos comunicar o que receberam de Bergoglio. Marcelo Figueroa começou falando do que é para Bergoglio o diálogo e o encontro pessoal: “a característica fundamental de sua proposta de diálogo é o silêncio... Assim como as notas musicais, se não existem os silêncios, as pausas, não se pode haver partitura... Os silêncios e a escuta são fundamentais. Uma característica dele, de escutar com empatia ao outro que está falando, fazendo-o se sentir o mais importante... e que pode aprender do que o outro disse”. “Nunca tive uma audiência com ele, sempre tive encontros”.
Depois, o padre Juan disse que Bergoglio é “inalcançável e indefinível”. E acrescentou: “o que mais me ensinou Francisco como sacerdote é ser padre... Ele é padre de verdade, um grande padre. Ele me ensinou a gostar das pessoas e a cuidar das pessoas. E especialmente, do mais pobre, do mais fraco e do que está mais solitário. Ele me ensinou a ter um coração de pastor”.
“Como homem me ensinou a ser mais humilde, amigo de minhas fraquezas e das minhas misérias. Caminho que me levou a ser mais misericordioso”. “Como cristão me deu a possibilidade, algo que ele tinha me levou a ter uma forte amizade com Jesus. A amizade com Jesus é o centro do coração da vida de um sacerdote”. Ao final do encontro tínhamos a certeza de que com eles havia começado uma amizade. E nós retomamos o caminho, com o horizonte escancarado.
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