Diante da minha janela, tenho plantas ainda destruídas pelo gelo e pelo frio do inverno. Observando-as, pensava que todas as coisas, todas as nossas coisas terminariam assim se não existisse aquela força, aquela potência criadora que faz renascer outras plantas diante de mim, com folhas verdes e novas. Essa força misteriosa quis fazer-se ver, tornando-se familiar ao nosso caminho de homens”. Aquelas plantas, aquela planície que começa a se recuperar e das quais Dom Giussani fala no início do vídeo produzido pelo jornal italiano Corriere della Sera, são as mesmas que circundam Cascinazza, o Mosteiro Beneditino São Pedro e São Paulo, na entrada de Milão. “Quando ouvi aquelas palavras, pensei: ele tinha diante dos olhos a mesma realidade que eu vejo todos os dias. Caramba, mesmo assim, eu não penso nessas coisas”. Os monges riem do confraterno. Michelangelo continua: “Mas, se foi possível para ele, é possível que aconteça a mim, hoje. Eu desejo a mesma humanidade, a mesma familiaridade com Cristo no meu caminho de homem. No lugar onde Ele me chamou”. No refeitório, entre os dezessete monges e os três postulantes, há quem nunca conheceu Dom Giussani e há quem, por outro lado, lembra bem do encontro com ele, antes da escolha da vocação e, depois, nos momentos em que esteve visitando o Mosteiro. Eles recordam a palavras e os encontros que, desde o início, tinham com ele. Sua amizade fiel e discreta foi uma parte fundamental para a vida da comunidade. Mas, assistir ao vídeo suscita em todos um olhar para a própria vida. Não há vestígio de lembrança nostálgica. Comoção, sim, como algo que move, que coloca em movimento, como aconteceu na audiência de 7 de março, com o Papa Francisco. Em suas palavras há a narração de uma vida que urge, na qual o fio condutor é a “atração de Jesus” que preenche o dia fazendo a vida “explodir”. E, assim, tentamos revivê-la.
Fabrizio. Esse vídeo não nos deixa em paz. Porque Dom Giussani era assim, sua humanidade é surpreendente. Ouvir novamente o “sim” de Pedro é ouvir mais uma vez: somos pecadores, mas há a misericórdia que nos abraça. As mesmas palavras de Francisco, no sábado, 7 de março. É a graça de não precisar censurar nada da minha humanidade, a possibilidade de recomeçar, sempre.
Quique. Vê-lo, desperta em nós o infinito que carregamos. Houve um momento em minha vida em que tentei reduzir a realidade, de algum modo queria me defender e, por isso, dizia: isso aqui, tudo bem, mas aquilo, não. Era eu quem decidia, delineando a “minha realidade”. Mas há um ano, tudo isso “foi para os ares”. Eu disse: “Senhor, quero sentir que me amas em tudo. Não desista de mim”. A vida refloresceu. Não há seleção, é possível realmente gozar de todas as coisas. Até o próprio pecado se torna lugar privilegiado do encontro com Cristo. Assim, o moralismo, a própria medida são vencidos. Cristo vence. Ver alguém, Dom Giussani, pleno de seu temperamento e tão realizado até o último dia, dá esperança.
Pippo. Esse vídeo me deixa agradecido e maravilhado por estar aqui. É como se deixasse mais claro o paradoxo da origem da minha história. Quando Giussani diz que estava com os jovens para que redescobrissem as certezas e a afetividade as quais, de outro modo, não seriam capazes, me vejo totalmente descrito. Eu não seria capaz de uma afetividade como a que experimento agora. Tudo nasceu do relacionamento com ele. Mas há outro ponto importante de juízo e de desafio: “A fé foi-me dada para que eu a comunique”. Esse é o objetivo da minha vida. Um gesto que nasce de mim pode dar menos glória a Cristo. A vida foi-me dada para que a misericórdia me tome novamente, me dê a energia, a simplicidade de coração de me deixar olhar do modo como Dom Giussani sempre me olhou. Durante um período, preparava o café da manhã para os monges todos os dias. Muitas vezes, me levantava e pensava: perdi um tempo de sono e ninguém se dá conta daquilo que faço... Depois, aconteceu uma revolução. Uma manhã, eu disse: faço essa tarefa para mim, porque sou esperado. Todas as manhãs, procuro os sinais daquela Presença que dá entusiasmo. Algo se impôs, como a primavera. Você se dá conta de alguma coisa que já existe e a reconhece.
Giovanni. Fabrizio tem razão. O vídeo não nos deixa em paz. Num determinado momento virei-me e vi Matteo e Monfe comovidos. Aquela humanidade tocou os apóstolos e, depois, Giussani e, depois, através dos amigos, a mim, que nunca encontrei Dom Giussani e estou aqui há poucos meses. É a mesma experiência de João e André. Só que agora.
Marco. Giussani nos diz que a raiz do nosso estar aqui é que somente Cristo basta. Nosso testemunho é dizer que Cristo basta para fazer um homem feliz. Aqui, não temos outra coisa.
Pietro. “O dom da fé para o mundo”, é o que Pippo dizia. Então, penso que a verificação se O estamos anunciando é a nossa experiência quotidiana. Isso acontece quando a consciência daquilo que nos tomou se torna um ímpeto. Dou um exemplo: a minha tarefa é passar roupa. Uma coisa é começar o trabalho apenas com um objetivo: livrar-me dele o mais rápido possível; e outra, pegar o ferro de passar com o desejo de que aquilo que me aconteceu, aconteça a todos. Essa é a oração.
Matteo. Certa vez, estava na cozinha descascando cenouras e percebi que me sentia contente. Não queria estar em nenhum outro lugar: eu coincidia com o gesto que fazia. Normalmente, sobretudo quando a situação é difícil, nós repetimos: faço isso por Cristo. Palavras santas, não são erradas. Mas Cristo já está com você. Isso muda tudo. Como diz o Papa Francisco: você é precedido por Ele. Nós pensamos que para suportar o que temos diante de nós, o melhor seja pensar em algo piedoso. No entanto, você está ali descascando cenouras e está contente. Você não pode se dar a letícia, mas só um Outro pode dá-la a você. Quando vemos Giussani no vídeo, damo-nos conta disto: ele coincide com aquilo que diz. O que há de mais desejável? Nunca vi Dom Giussani. Aqui, há muitas pessoas que o conheceram e, enquanto os ouço falar, digo: Deus pensou nesse carisma, nesse homem, para mim. Ainda mesmo antes de para o mundo, para a história, para a Igreja, o pensou para mim, para que eu encontrasse Cristo.
Claudio. Assistir ao vídeo foi como ser exposto ao fogo que encontrei cinquenta anos atrás, quando conheci Giussani. Um fogo que acendeu a minha vida e a reascendeu tantas vezes, apesar de todas as minhas tentativas de transformá-lo em cinzas. Volto à frase de Pippo – o dom da fé nos foi dado para que a comuniquemos – porque eu também fui tocado. Certa vez, Giussani nos disse: vocês precisam rezar, trabalhar e viver como se houvesse pessoas observando vocês. E mesmo que não haja ninguém, há os anjos que, depois, derramam sobre o povo aquilo que veem, como podemos ler no livreto Uma Morada para o Homem, no qual estão reunidas algumas das palavras que Dom Giussani dirigiu à nossa comunidade no decorrer dos anos. A missão, a tarefa de comunicar não é algo diferente ou um acréscimo em relação à intensidade de consciência da qual sou chamado a deixar-me reacender e que, aqui, encontra mil modalidades. O Papa, Giussani, Carrón, o mais novo entre nós e quem nos guia, as circunstâncias excepcionais e as cotidianas são os canais através dos quais o Senhor me toma e reacende esse fogo. Só é pedida uma coisa: a sinceridade do pedido. Depois, o Senhor concede sinais, não devidos, mas gratuitos, da fecundidade que tudo isso carrega. Há uma misericórdia maior do que as cinzas sob as quais gostaríamos de enterrar tudo.
Sergio. O filme diz respeito à vida, desperta a vida. Uma vida como sentido total. O encontro com Giussani foi a resposta à necessidade que eu tinha. Foi encontrar-me diante de algo tão excepcional e correspondente que compreendi que só pode ser Cristo. Qual é nossa responsabilidade em relação ao mundo? Uma obediência ao Mistério de Cristo que me ressuscitou e que determina a forma da pessoa na sua manifestação maior. Podia imaginar- me feliz casando, tendo filhos e, no entanto, ao aceitar a forma que o encontro determinou, me descubro feliz e surpreso pelo fato de que a minha realização passe através de uma modalidade tão estranha. Giussani, a um certo ponto do vídeo, diz: “João e André são uma coisa só, de tanto que estão plenos da mesma coisa”. Daqui nasce uma moralidade nova: começar a se olhar, a tomar nas mãos uma ferramenta afirmando Aquele que nos constitui. Essa é a vida monástica, melhor, a vida cristã. Quando compreendemos que com Cristo não nos falta mais nada, podemos limpar os banheiros felizes. Para mim, o testemunho de Giussani é sempre a retomada dessa vida. Ele e todos aqueles que nos testemunham isso. Porque o ponto é este: a vida é despertada com uma vida, não com discursos, ideias ou outra coisa. Em Giussani temos a graça e a misericórdia de encontrar, de tocar o Mistério de Cristo.
(Texto retirado da Revista Passos 169, maio 2015)
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