Aquilo que vemos de longe é o que está retratado na foto ao lado: uma cidade em ruínas. De perto, Aleppo é provavelmente só fome e sede. Adoecer pelo ar irrespirável da gasolina que queima ou pelo choque dos mísseis, enlouquecer de dor e não poder se tratar. É o ataque ao hospital pediátrico onde de uma vez morrem 17 crianças, das quais a mais velha tinha um ano. As perguntas sobre o sentido que queimam dentro há cinco anos, os cadáveres, as fugas, as famílias obrigadas a separar-se, os bancos que processam os desempregados sem dinheiro para quitar as dívidas. É um colapso vertiginoso.
No entanto, entre as ruínas existe uma vida tão doce e forte, que vai além de qualquer pensamento e agir humano. Padre Ibrahim Alsabagh, guia da paróquia latina de São Francisco, relata o que vê em cartas e testemunhos há dois anos (ou seja, palavras escritas ou ditas nas garras do mal). Sempre agradece a Deus, pelas menores coisas, por qualquer um que bate à sua porta, pelo milagre de quem perdeu os filhos e perdoa, por terem o poço de água, as pessoas que ajudam, os paroquianos que rezam, pelos terroristas, pelas forças físicas no limite que retomam vigor ao encontrar as pessoas. E assim volta tarde da noite “cheio de alegria e estupor pela fé que vi”. É como um Cântico das criaturas no meio da guerra, como o diálogo de enormes necessidades, uma caridade que é sempre a última palavra e missas celebradas sabendo que de um momento ao outro os mísseis podem atingi-los. Porém, mais chocante do que os ataques é a decisão dos frades de se reuniram com 230 jovens (título do encontro: “Sejam alegres. Repito: sejam alegres!), ou de ajudar centenas de famílias com dívidas, renunciando a tudo eles mesmos em primeiro lugar, e a cada dia ter a coragem de entrar nas casas de onde saem gritos e prantos.
Padre Ibrahim agradece também por isso. Por poder fazer aquilo que fazem. Levantar-se, rezar juntos “com calma”, porque aquele é “a fonte de tudo”. E, depois, “começa a correria”. Em uma jornada de graves decisões a serem tomadas instante após instante, e de emergências que fazem perguntar: por que arriscar a vida e não ajudar de longe? “A resposta é Jesus, que toca o leproso antes de curá-lo. Era necessário?”. É um desejo contínuo de participar a um amor grande e misterioso: “Aquele ‘tocar’ da Igreja”.
As cartas de padre Ibrahim estão sendo publicadas em livro na Itália. Na leitura é possível notar uma intimidade com o Senhor da qual nasce toda esta vida, como o relato de quando disse “sim” para ir morar na Síria, ou o olhar (também este pleno de misericórdia) sobre o Ocidente. Não tem medo de morrer repentinamente. “Meu único medo é não ser disponível a doar tudo”. Mas este nunca é o último pensamento sobre ele: “A razão verdadeira pela qual fazemos tudo é para que os olhos vejam e o coração experimente o amor de Cristo presente, que não nos abandona”.
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