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OS PAPAS NA HISTÓRIA

PIO V o vencedor de Lepanto

por Eugênio Russomanno
27/04/2015 - Antonio Ghisleri não é apenas o “grande pontífice da reforma tridentina”, mas também o protagonista da histórica batalha contra a frota turca. Um santo que teve ao seu lado amigos como são Carlos Borromeu e são Filipe Néri
Papa Pio V.
Papa Pio V.

Com o Concílio de Trento (1545-1563) “o novo incremento da vida católica apareceu como um dos mais estupendos fenômenos da história da Igreja. A resignação que aparentava ter atingido o povo católico, feito um exército já vencido e em plena retirada, cedeu lentamente o passo a um renovado espírito combativo e a uma consciência que foi pouco a pouco adquirindo sempre mais o sentido de sua verdadeira missão. As feridas dolorosas infligidas no período da grande apostasia no corpo da cristandade gradualmente cicatrizaram e quem se mantivera fiel à antiga fé se alegrou pelo novo curso da vida religiosa. A Igreja entrou na época da ‘reforma católica’ (Hubert Jedin) como um tempo de autoconsciência, por parte da Igreja, do ideal de vida católico graças a uma ampla renovação interior”. Estas palavras de August Franzen bem nos introduzem ao nosso santo Papa Pio V, que foi considerado “o grande pontífice da reforma tridentina”.

Antônio Ghislieri, “único piemontês que tenha sido elevado ao sólio de Pedro em dois mil anos de cristianismo” lembra Fábio Arduino, nasceu de uma pobre família rural dia 17 de janeiro de 1504 em Bosco Marengo, perto de Alexandria. Exerceu desde jovem o ofício de zagal e bastante cedo se fez dominicano com o nome de frei Miguel. Escreveu João Paulo II em sua ‘Mensagem por ocasião das celebrações promovidas para o V centenário do nascimento de San Pio V’: “A celebração do V centenário do seu nascimento é motivo de bênção para toda a Igreja e, de modo especial, para a amada Diocese de Alexandria, assim como para a Comunidade eclesial do Piemonte”. O seu ótimo trabalho a serviço da Igreja atraiu a atenção do cardeal Gian Pietro Carafa, o qual, tendo se tornado Papa Paulo IV, primeiro o nomeou bispo (1556), depois cardeal em 1557 (quando foi chamado a fazer parte do Colégio cardinalício era conhecido como o Cardeal Alexandrino) e, por fim, Inquisidor Geral de toda a Cristandade.

O conclave que elegeu Pio V durou dezenove dias; o novo papa deve a sua eleição (7 de janeiro de 1566) ao cardeal de Milão Carlos Borromeu (1538-1584). Segundo Fábio Arduino, no dia da coroação, ao invés de mandar jogar moedas para o povo como era costume, Pio V preferiu socorrer em domicílio muitos necessitados da cidade de Roma; também como papa, continuou a vestir o branco hábito dominicano, a dormir sobre uma enxerga, a nutrir-se de legumes e de fruta, dedicando sua jornada inteira a pôr em prática a regra beneditina ora et labora. “Continuando o seu sóbrio estilo de vida deu uma configuração muito severa à sua corte… e com vários decretos tentou remediar aos piores males da época: os contemporâneos tiveram a impressão que quisesse até mesmo transformar a cidade em uma espécie de mosteiro” escreve John Kelly. O seu lema de Pontífice era o de “caminhar na verdade”. Ele se opôs nitidamente ao nepotismo, proibiu a alienação de propriedades pertencentes ao estado pontifício, mandou os clérigos respeitarem a obrigação de residência, executou um inquérito sistemático no meio das ordens religiosas, nomeou os cardeais com grande atenção, nomeou uma comissão para o exame das nomeações de bispos. Em harmonia com as decisões surgidas do Concílio Tridentino, Pio V publicou um Catechismus Romanus (1566), uma nova edição do Breviarum Romanum (1568) e um novo Missale Romanum (1570). Instituiu uma comissão especial para a revisão da Vulgata. Fundou em 1571 a Congregação do Índex.

Continua o Kelly: “Usou todos os meios para promover as reformas tridentinas na Itália começando ele mesmo a visitar pessoalmente as basílicas romanas; organizou também uma comissão para visitar sistematicamente as paróquias e, além disso, constituiu muitos visitadores apostólicos enviando-os a todo o estado pontifício e a Nápoles. Por fim, dispôs fazer chegar os decretos do Concílio de Trento a todo mundo”. Em outubro de 1576 condenou setenta e nove teses de Miguel Baio (1513-1589), o precursor flamengo do jansenismo e no mesmo ano proclamou Doutor da Igreja o grande pensador dominicano Tomás de Aquino (1225-1274), obrigando as universidades ao estudo da Summa Theologica e fazendo imprimir em 1570 uma edição completa e precisa de todas as obras teológicas do santo Doutor. Infelizmente as intervenções de Pio V em campo internacional não tiveram sucesso, carecendo de “realismo político”. Um exemplo eloquente disso é o fato de que no dia 25 de fevereiro de 1570, ele tenha excomungado e destituído a rainha Elisabetta Iª (esta foi a última vez que um papa emitiu uma sentença de tal gênero contra um monarca reinante): tratou-se de um “ineficaz anacronismo”, que só fez piorar a situação dos súditos ingleses católicos.

“O empreendimento mais ambicioso e melhor sucedido de Pio V foi a constituição de uma liga santa (sob o supremo comando de Dom João da Áustria, filho natural do imperador Carlos V) com Veneza e a Espanha para a luta contra os turcos: a frota naval da liga enfrentou a frota turca no golfo de Corinto em 7 de outubro de 1571 e lhe infligiu em Lepanto uma importante derrota. Atribuindo a vitória à intercessão da Bem-aventurada Virgem Maria, o papa declarou o dia 7 de outubro festa de nossa Senhora da vitória — mais tarde transformada por Gregório XIII na festa de N.S. do Rosário —”, narra John Kelly. A batalha, que mudou o rumo da história, durou do meio-dia às cinco da tarde; Fábio Arduino lembra que, nessa hora, Pio V, ocupado com outros afazeres, improvisamente apareceu na janela, ficou alguns instantes “em êxtase” com o olhar voltado a Oriente e enfim exclamou: “Não nos ocupemos mais de negócios. Vamos agradecer a Deus porque a frota veneziana conseguiu a vitória”.

Morreu a 1° de maio de 1572 e o corpo jaz na basílica de Santa Maria Maior em Roma. Pio V foi de verdade um grande papa, proclamado santo pela Igreja, “um gigante da santidade” o definiu o Cardeal Ângelo Sodano, que agiu em sintonia com outros grandes santos da época como são Carlos Borromeu em Milão e são Filipe Néri em Roma; um grande papa reformador, cuja obra, que daria posteriormente frutos por muitas décadas, deu uma característica marca tridentina à Igreja inteira. A sua festa é comemorada dia 30 de abril.

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