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OS PAPAS NA HISTÓRIA

PIO VII. O papa prisioneiro de Napoleão

por Eugenio Russomanno
13/04/2016 - Pontífice na passagem entre XVIII e XIX século, Luiz Chiaramonti foi encarcerado por Bonaparte. Mas depois da queda do imperador foi o único a exprimir-lhe proximidade. Reconstituiu a ordem dos Jesuítas opondo-se aos soberanos europeus
J. B. Wicar, Pio VII, óleo sobre tela.
J. B. Wicar, Pio VII, óleo sobre tela.

O conclave que se seguiu à morte de Pio VI elegeu “como candidato de acordo” Luiz Barnaba Chiaramonti. Reunido em 1799 sob a proteção da coroa dos Habsburgo, foi possível graças aos esforços de Dom Ettore Consalvi, secretário do conclave, que conseguiu reunir em Veneza 35 cardeais.

Nascido em Cesena aos 14 de abril de 1742, em uma família nobre, Luiz Chiaramonti entrou bem cedo na ordem beneditina. Percorreu uma brilhante carreira eclesiástica até tornar-se Cardeal em 1785, nomeado por Pio VI. “Muito aberto às ideias modernas, enquanto era Bispo de Ímola se demonstrou um guia corajoso em tempos de conturbadas mudanças políticas; no Natal de 1797 [quando a Itália estava sob o domínio francês] desconcertou os conservadores, ao declarar em um sermão que não havia necessariamente contradição entre cristianismo e democracia”, lê-se no Grande Dicionário Ilustrado dos Papas.

Tendo sido eleito Papa, não lhe foi possível fazer o seu ingresso em Roma até o dia 3 de julho de 1800, depois que austríacos e napolitanos conseguiram expulsar os franceses. Depois de ter tomado posse dos territórios pontifícios, Pio VII persuadiu os seus libertadores a se retirarem do estado da Igreja e posteriormente, graças aos préstimos do ótimo secretário de Estado Consalvi, recomeçou a administrá-lo. No que diz respeito à França, tanto ele quanto o seu secretário miravam a encontrar um acordo com o governo revolucionário: aderindo a algumas propostas de Napoleão Bonaparte, então primeiro cônsul, fecharam com ele um tratado que restabelecia o catolicismo na França, reconhecendo que era a religião da maior parte dos cidadãos franceses. A Igreja teve de fazer muitas concessões, mas o tratado trazia notáveis vantagens.

Em setembro de 1803, após a segunda descida de Napoleão à Itália, Pio VII estipulou um tratado também com a recém-nascida República Italiana. Em 1804, “contra o parecer da cúria”, foi a Paris para presenciar à coroação imperial de Napoleão. Mas depois da autocoroação do general córsico como imperador dos Franceses, as relações se tornaram difíceis.

Aos 10 de junho de 1809, depois da segunda ocupação de Roma por parte das tropas napoleônicas, Pio excomungou todos os “depredadores do patrimônio de Pedro”, porém sem mencionar explicitamente Napoleão.

Foi assim que se chegou à prisão do Papa (5 de julho de 1809). Conta Cláudio Ceresa nas páginas do L’Osservatore Romano que o general Radet, diante de Pio VII acenou com constrangimento à sua tarefa: prender o sucessor de Pedro, e “pediu depois ao Pontífice, em nome do imperador, que renunciasse à soberania temporal da cidade de Roma e do Estado romano (…) Pio VII pegou a deixa das palavras de seu interlocutor, que havia lembrado o juramento de obediência por ele prestado ao soberano, e o convidou a considerar de que modo e com qual fidelidade o Vigário de Cristo era comprometido a defender os direitos da Santa Sé”. Pio VII foi levado preso a Savona: segundo Jean Leflon, um dos mais importantes estudiosos do pontificado de Pio VII, na viagem rumo a Savona mostra-se aquela “doce tristeza e o natural sorriso” de Pio VII “que durante o seu cativeiro caracterizará a sua usual atitude”. Ao longo do trajeto “como de tragicomédia “ que se estende entre a Itália e a França, Pio VII foi acompanhado e consolado por “demonstrações de respeito e de simpatia que populações silenciosas e muito tristes lhe tributavam “. Em particular, o papa Bento XVI, na visita a Savona e Gênova em maio de 2008, lembrou “o amor e a coragem com que os savonenses sustentaram o Papa em sua residência forçada”.

Por isto, Napoleão quis que Pio fosse transferido para Fontainebleau. Como observou Lorenzo Cappelletti para a revista 30Giorni, o escopo era o de enfraquecer-lhe a resistência (o Papa esteve em ponto de morrer durante o percurso), mas parece também que tenha sido motivado pela vontade de impedir o apoio dos fiéis a Pio VII, que nos anos de Savona nunca faltou.

O Papa, cansado e doente, foi forçado a firmar (25 de janeiro de 1813) o tratado de Fontainebleau no qual fazia amplas concessões, incluindo a renúncia aos Estados pontifícios. Mas em breve teria retratado a sua firma.

Aos 7 de junho de 1815, depois da definitiva derrota de Napoleão e do início do congresso de Viena, Pio pôde voltar definitivamente ao Vaticano, acolhido pela estima de muitos. “A quinquenal prisão de Pio VII (mas se poderia estender a afirmação ao inteiro pontificado seu) paga, não apenas em nível informativo, um déficit de conhecimento, mesmo no meio dos católicos, devido à prevalente atenção voltada, no bem e no mal, à figura de Napoleão”, escreve Cappelletti. Pio VII, tendo regressado a Roma, não participou da damnatio memoriae do seu antigo perseguidor. “Assim como no momento da captura de Pio VII, “nenhum protesto se fez ouvir, nenhuma só voz protetora desceu dos tronos católicos em favor deste ilustre recluso”, igualmente aconteceu no momento do exílio de Napoleão, salvo precisamente a misericórdia daquele que fora seu prisioneiro” como lembra Cappelletti. A mãe de Bonaparte em uma carta de 27 de maio de 1818 ao secretário de Estado vaticano escrevia: “A única consolação que me foi concedida é a de saber que o Santíssimo Padre esquece o passado para lembrar só o afeto que demonstra por todos os meus. Nós não encontramos apoio e amparo se não no governo pontifício, e a nossa gratidão é grande como o benefício que recebemos”.

John Kelly narra nestes termos o seu retorno a Roma: “Um dos seus primeiros atos foi reintegrar o Consalvi, que no congresso de Viena (1814-1815) negociou a restituição à Santa Sé de quase todos os seus domínios temporais (…) Pio VII recusou aderir à Santa Aliança de 1815 porque isto teria comportado a assinatura de um manifesto religioso junto com cismáticos e hereges. O Consalvi entretanto iniciou uma segunda reconstrução do Estado pontifício, mas as suas tentativas de enxertar no desatualizado sistema papal reformas administrativas, judiciárias e financeiras inspiradas no modelo liberal francês, exacerbaram tanto os reacionários quanto os progressistas. Enquanto isso Pio, sempre com o apoio do Consalvi, começou a reorganizar a Igreja, acidentada em toda parte pelos recentes conflitos. As modificações territoriais feitas pelo congresso de Viena e o clima mais favorável lhe permitiram fechar tratados”.

Mas os principais interesses de Pio eram de caráter espiritual e religioso antes do que administrativo e político. Em especial, apesar da oposição das várias potências reconstituiu a Companhia de Jesus em todo o mundo, com a bula Sollicitudo omnium ecclesiarum de 30 de julho de 1814. Ele se considerava o protetor da pureza da doutrina e como tal condenou as sociedades bíblicas protestantes, o indiferentismo encorajado pelo Iluminismo e a maçonaria.

Papa Pio VII se esforçou realmente para adaptar o papado ao mundo moderno e quando morreu (20 de julho de 1823) o mesmo gozava de um respeito impensável no momento em que assumira o pontificado.

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