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DE SANTA MARTA

Quando o Senhor exagera

por Papa Francisco
05/03/2015 - O resumo das homilias do Santo Padre durante as missas matutinas celebradas na capela Domus Sanctae Marthae

Homilia de 3 de março, publicada no L'Osservatore Romano, ed. em português, n. 10 de 5 de Março de 2015

Continuam — seguindo a quotidiana liturgia da palavra — as reflexões do Papa Francisco sobre o tema da conversão. Depois da exortação de segunda-feira “a acusar-nos a nós mesmos, a dizer-nos a verdade sobre nós mesmos, a não camuflar a alma a fim de nos convencer de que somos melhores de quanto realmente somos”, o Pontífice aprofundou “a mensagem da Igreja” que “hoje podemos resumir em três palavras: o convite, o dom e o ‘faz-de-conta’”. Um convite que, como se lê no livro do profeta Isaías (1, 10.16) diz respeito precisamente à conversão: “Escutai o ensinamento do nosso Deus. Lavai-vos, purificai-vos!”, isto é: “O que tiverem dentro que não for bom, o que for mau, o que estiver manchado, deve ser purificado”.

Diante das solicitações do profeta: “Afastai dos meus olhos o mal das vossas ações”, “Deixai de praticar o mal! Aprendei a praticar o bem”, há quem diga: “Mas, Senhor, não pratico o mal; vou à missa todos os domingos, sou um bom cristão, ofereço muitas esmolas”. A eles Francisco perguntou idealmente: “Mas você entrou no seu coração? É capaz de acusar a si mesmo nas ações que encontra ali?”. E no momento em que sentimos a necessidade da conversão, podemos até nos perguntar: “Mas como posso me converter?”. A resposta vem da Escritura: “Aprendei a praticar o bem”.

De fato, “a impuridade do coração”, explicou o Papa, “não pode ser eliminada como uma mancha: vamos à lavandaria e saímos limpos. É eliminada com um gesto”. A conversão é “empreender um caminho diverso, outro caminho diverso do mal”. Uma pergunta: “E como pratico o bem?”. A resposta vem também do profeta Isaías: “Procurai a justiça, socorrei o oprimido, fazei justiça ao órfão, defendei a causa da viúva”. Indicações que, como explicou Francisco, são bem compreendidas numa realidade como a de Israel, onde “os mais pobres e carentes eram os órfãos e as viúvas”. Para cada um de nós significa: vai “onde estão as chagas da humanidade, onde há muito sofrimento; e assim, praticando o bem, você lavará o seu coração. Será purificado! Este é o convite do Senhor”.

Portanto, conversão significa que somos chamados a praticar o bem “aos mais necessitados: a viúva, o órfão, os doentes, os idosos abandonados, que ninguém recorda”; mas também “as crianças que não podem ir à escola” ou “que não sabem fazer o sinal da Cruz”. Porque, frisou com amargura o Pontífice, “numa cidade católica, numa família católica há crianças que não sabem rezar nem fazer o sinal da Cruz”. Então é preciso “ir ao encontro delas” e levar “o amor do Senhor”.

Se fizermos isto, perguntou-se o Papa, “qual será o dom do Senhor?”. Ele nos “mudará”, disse retomando a frase na qual o profeta Isaías afirma: “Mesmo se os vossos pecados fossem escarlates, tornar-se-iam brancos como neve; se fossem vermelhos como púrpura, tornar-se-iam como a lã”. Até diante do nosso medo e hesitação — “Mas, padre, tenho muitos pecados! Cometi mesmo muitos! — o Senhor nos confirma: “Se tu vieres por este caminho, pelo qual te convido, mesmo que os teus pecados fossem escarlates, tornar-se-iam brancos como neve”.

O Pontífice comentou: “É um exagero! O Senhor exagera; mas é a verdade”, porque Deus, diante da nossa conversão, “concede-nos o dom do seu perdão” e “perdoa generosamente”. Deus não se limita a dizer: “Mas perdoo-o até aqui, depois veremos o resto...”. Ao contrário, “o Senhor perdoa sempre tudo”. Mas, explicou Francisco, concluindo o seu raciocínio, “se você quiser ser perdoado” deve caminhar pelo “caminho do bem”.

Depois da análise das duas primeiras palavras propostas no início da homilia — o “convite”, isto é, pôr-se a caminho para se converter, para praticar o bem; e o “dom”, ou seja, “dar o perdão maior, transformar, tornar puríssimo” — o Papa passou para a terceira palavra, o “faz-de-conta”. Relendo o trecho do Evangelho de Mateus (23, 1-12) no qual Jesus fala dos escribas e dos fariseus, Francisco fez notar que “também nós somos astutos”, como pecadores: “encontramos sempre um caminho que não é o justo, a fim de parecer mais justos do que somos: é o caminho da hipocrisia”.

Jesus refere-se precisamente a isto no trecho proposto pela liturgia. Ele “fala daqueles homens que gostam de se vangloriar como justos: os fariseus, os doutores da lei, que dizem coisas justas, mas que fazem o contrário”. Estes “astutos”, explicou o Pontífice, gostam da “vaidade, do orgulho, do poder e do dinheiro”. E são “hipócritas” porque “fingem que se convertem, mas o seu coração é uma mentira: são mentirosos”. De fato, “o seu coração não pertence ao Senhor; pertence ao pai de todas as mentiras, a satanás. Este é o “faz-de-conta” da santidade”.

É uma atitude contra a qual Jesus usou sempre palavras muito claras. Com efeito, Ele preferia os pecadores aos hipócritas. Pelo menos “os pecadores diziam a verdade sobre si mesmos: ‘Afasta-te de mim Senhor, porque sou um pecador!’” (Lucas 5, 8). Assim, recordou o Pontífice, “Pedro fez uma vez”. Um reconhecimento que nunca aflora na boca dos hipócritas, que dizem: “Agradeço-te Senhor, porque não sou pecador, porque sou justo” (cf. Lucas 18, 11).

As três palavras sobre as quais “meditar” nesta segunda semana da Quaresma: “o convite à conversão; o dom que nos concederá o Senhor, isto é, um grande perdão”; e “a ‘armadilha’, ou seja ‘fazer-de-conta’ que se converte e empreender a estrada da hipocrisia”. Com estas três palavras no coração podemos participar na Eucaristia, “a nossa ação de graças”, na qual sentimos o “convite do Senhor: ‘Vem a mim, alimenta-te de mim. Mudarei a tua vida. Pratica a justiça, o bem mas, por favor, afasta-te do fermento dos fariseus, da hipocrisia’”.

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