Homilia de 17 de março, publicada no L'Osservatore Romano, ed. em português, n. 12 de 19 de Março de 2015
A Quaresma é o tempo propício para pedir ao Senhor “para todos nós, para a Igreja inteira”, a “conversão à misericórdia de Jesus”, porque muitas vezes os cristãos “são especialistas em fechar as portas às pessoas” que, debilitadas pela vida e pelos seus erros, estariam dispostas a recomeçar, “pessoas cujo coração o Espírito Santo anima a ir em frente”. A lei do amor esteve no centro da reflexão do Papa, que, partindo da primeira leitura do dia (Ez 47, 1-9.12), na qual se fala da água que brota do templo, “uma água benta, abundante como a graça de Deus”, que “cura as nossas feridas”.
A água volta no Evangelho (Jo 5, 1-16) onde se fala de uma piscina junto da qual “havia muitos enfermos” e sobre a qual, “segundo a tradição”, de vez em quanto descia um anjo” que movia as águas e os doentes que nela entrassem “eram curados”. Ali havia também “um homem doente há 38 anos”. Jesus perguntou-lhe: “Queres ser curado?”. O enfermo respondeu: “Senhor, não tenho ninguém que me ajude a entrar na piscina... e outros antecipam-me”. Era “um homem derrotado” que “tinha perdido a esperança”, era “não só paralítico” mas sofria também de acídia. “A acídia tornava-o triste, indolente”. Outra pessoa “teria encontrado um modo de chegar a tempo”. Mas ele “não queria ser curado”; não tinha “força”, mas sentia “amargura na alma: ‘Os outros chegam antes e deixam-me de lado’”, e “também um ressentimento”. Era “uma alma triste”.
“Jesus tem misericórdia” daquele homem e diz: “Levanta-te, pega na tua maca e caminha”. Depois, o Papa acrescentou: “Aquele homem ficou curado, pegou na sua maca e começou a caminhar, mas estava tão doente que não conseguia crer”. Mas “era sábado e o homem encontrou alguns doutores da lei”, que lhe perguntaram: “Por que carregas isto? Não podes, hoje é sábado”. O homem respondeu: “Fui curado! Aquele que me curou disse-me: ‘Pega na tua maca’”. Em vez de se alegrar, os doutores começam “uma investigação”: “Vejamos o que aconteceu, pois existe a lei... que devemos seguir”. O homem continua a caminhar “um pouco triste”. Mas o Papa comentou: “Sou mau, mas às vezes penso no que teria acontecido se o homem tivesse dado um bom cheque aos doutores. Teriam respondido: ‘Vai em frente, sim, desta vez vai em frente! ’”.
Continuando a leitura do Evangelho, vemos Jesus que “volta a encontrar aquele homem e diz: ‘Foste curado, não voltes a pecar para que não te aconteça algo pior’”. Assim, ele vai até os doutores da lei e diz: “O homem que me curou chama-se Jesus”. E “por isso os judeus começaram a persegui-lo, porque fazia tais coisas no dia de sábado”.
Esta história, disse o Papa, “acontece muitas vezes: um homem, uma mulher que se sente doente na alma, triste, cometeu muitos erros na vida, num certo momento sente que águas se movem, é o Espírito Santo”. E reage: “Gostaria de ir!”. E “com coragem, vai”. Ma “quantas vezes hoje encontra as portas fechadas nas comunidades cristãs”. Talvez lhe digam: “Não pode; errou e por isso não pode entrar. Se quiser, vem à missa de domingo”; “o que o Espírito faz no coração das pessoas, os cristãos destroem-no com psicologia de doutores da lei”.
Mas o Pontífice disse que a Igreja “é a casa de Jesus, e Ele não só acolhe mas vai ao encontro das pessoas”. “E se alguém está ferido, o que faz Jesus? Repreende-o? Não, carrega-o às costas”. Isto “chama-se misericórdia”. O próprio Deus “alerta o povo: quero misericórdia, não sacrifício! ’”.
Francisco concluiu, sugerindo um compromisso na vida diária: “Na Quaresma, devemos converter-nos”. Alguém poderia admitir: “Padre, há muitos pecadores na rua: roubam, vivem em acampamentos de ciganos... e nós desprezamos esta gente”. Mas, “e você, quem é você que fecha a porta do seu coração a um homem que quer melhorar, voltar ao povo de Deus, porque o Espírito Santo agiu no seu coração?”. Ainda hoje há cristãos que se comportam como os doutores da lei e “fazem como faziam a Jesus”: “Ele diz uma heresia, isto não se pode fazer, é contrário à disciplina da Igreja, contra a lei”. Assim, fecham as portas a muitas pessoas. Por isso, “peçamos hoje ao Senhor” a “conversão à misericórdia de Jesus”: só assim “a lei será cumprida, porque a lei consiste em amar a Deus e ao próximo como a nós mesmos”.
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