Homilia de 26 de maio, publicada no L'Osservatore Romano, ed. em português, n. 22 de 28 de maio de 2015
O “salário” do cristão é “assemelhar-se a Jesus”: não há recompensa em dinheiro nem em poder para quem segue verdadeiramente o Senhor, porque o caminho é só de serviço e na gratuidade. Ao contrário, procurando um “bom negócio” mundano, com “a riqueza, a vaidade e o orgulho”, cria-se “uma cauda de pavão” e dá-se inclusive um “contra-testemunho” na Igreja. Foi contra esta tentação que o Papa Francisco alertou.
Foi o “diálogo entre Pedro e Jesus” que sugeriu a meditação do Pontífice, iniciada precisamente pelo trecho de Marcos (10, 28-31) proposto pela liturgia do dia. Um diálogo, explicou, que se realiza depois do encontro com “aquele jovem que queria seguir Jesus: era bom, Jesus amou-o”, como narra o Evangelho. Contudo o Senhor “disse-lhe que lhe faltava algo: que vendesse tudo o que possuía”, que desse o dinheiro “aos pobres: ‘terás um tesouro no céu’ “. Mas “a estas palavras — afirmou o Papa — o jovem ficou abatido e foi embora entristecido”.
Assim “Jesus retomou o discurso e disse aos discípulos: ‘Como é difícil para quem possui riquezas entrar no reino de Deus’ “. E “os discípulos ficaram desconcertados com suas palavras”. Mas “Jesus replicou: “Filhos, como é difícil entrar no reino de Deus. É mais fácil passar um camelo pelo fundo de uma agulha do que entrar um rico no reino do céu’ “.
E eis o trecho evangélico da liturgia com Pedro que garante a Jesus: “Nós deixamos tudo e seguimos-te”. Como quem diz: “E a nós, o quê? Qual será o nosso salário? Deixamos tudo”. Em poucas palavras, “os ricos que nada deixaram — o jovem que não queria deixar as suas riquezas — não entrarão no reino de Deus, mas nós? Qual será o nosso ganho?”.
A questão, frisou Francisco, é que “os discípulos entendiam Jesus pela metade, porque o conhecimento pleno de Jesus aconteceu quando o Espírito Santo desceu”. E de fato Jesus responde-lhes: “Em verdade vos digo: quem tiver deixado a casa, irmãos, irmãs, mãe, pai, filhos ou campos por minha causa e por causa da boa nova receberá cem vezes mais agora, no tempo presente em casas, irmãos, irmãs, mães, filhos e campos, juntamente com perseguições”. Praticamente “Jesus responde indicando outra direção” e não promete “as mesmas riquezas que tinha o jovem”. Precisamente “este ter muitos irmãos, irmãs, mães, pais, bens é a herança do reino, mas com a perseguição, com a cruz. E isto muda”.
Eis porque, explicou o Papa “quando um cristão é apegado aos bens, faz a má figura de quem quer duas coisas: o céu e a terra”. E “o termo de comparação é exatamente o que diz Jesus: a cruz, as perseguições, negar-se a si mesmo, sofrer a cruz todos os dias”.
Por sua vez “os discípulos sentiam esta tentação: seguir Jesus mas depois qual será o fim deste bom negócio?”. E, acrescentou Francisco, “pensemos na mãe de Tiago e João quando pediu um lugar para os seus filhos: “Ah, que este seja primeiro-ministro, e este ministro da economia’ “. Era “o interesse mundano no seguir Jesus”: mas depois “o coração desses discípulos foi-se purificando até ao Pentecostes, quando entenderam tudo”.
“A gratuidade no seguir Jesus é a resposta à gratuidade do amor e da salvação que nos dá Jesus” esclareceu o Pontífice. “Quando se quer seguir Jesus e o mundo, quer com a pobreza quer com a riqueza”, verifica-se “um cristianismo a metade, que deseja um ganho material: é o espírito da mundanidade”. E “aquele cristão, dizia o profeta Elias, “coxeia das duas pernas’ “ porque “não sabe o que quer”.
Assim, sugeriu Francisco, “a chave para entender este discurso de Jesus — sim, cem vezes mais, mas com a cruz — é a última palavra: “Muitos dos primeiros serão os últimos e os últimos serão os primeiros’ “. E “eis o que diz do serviço: ‘Quem se considera ou é o maior de entre vós, faça-se servo: o menor’ “. Não foi por acaso, recordou o Papa, que dizendo estas palavras Jesus “pegou naquela criança e a mostrou”.
“Seguir Jesus sob o ponto de vista humano não é um bom negócio: é servir” insistiu o Pontífice. De resto foi exatamente o que “fez ele: e se o Senhor te der a possibilidade de ser o primeiro, tu deves comportar-te como o último, isto é no serviço. Se o Senhor te der a possibilidade de possuir bens, deves comportar-te no serviço, isto é, para os outros”.
“São três os aspectos, os degraus que nos afastam de Jesus: as riquezas, a vaidade e o orgulho” afirmou o Papa. “Por isto — explicou — as riquezas são tão perigosas: levam-te a ser vaidoso e a pensar que és importante”; mas “quando te consideras importante, crias a cauda de pavão e perdes-te”. Eis porque Jesus nos recorda o caminho: “Muitos dos primeiros serão os últimos e os últimos serão os primeiros, e quem for o primeiro entre vós seja o servo de todos”. É “um caminho de despojamento”, o mesmo que “ele percorreu”.
“Esta obra de catequizar os discípulos levou tanto tempo porque não entendiam bem o que Jesus dizia”. Assim hoje, recomendou Francisco, “também devemos pedir-lhe: que nos ensine este caminho, esta ciência do serviço, a ciência da humildade, a ciência de ser os últimos para servir os irmãos e as irmãs da Igreja”.
Para o Pontífice “é desagradável ver um cristão — leigo, consagrado, sacerdote ou bispo — que quer as duas coisas: seguir Jesus e os bens, seguir Jesus e a mundanidade”. É “um contra-testemunho e afasta as pessoas de Jesus”. Antes de prosseguir com a celebração da Eucaristia, o Papa convidou a pensar de novo na pergunta de Pedro: “Nós deixamos tudo: como nos pagarás?”. E ter presente a resposta de Jesus porque “o preço que ele nos dá é ser semelhante a ele: este será o ‘salário’ “. E “assemelhar a Jesus”, concluiu, é um “grande salário”.
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