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DE SANTA MARTA

A última palavra

por Francisco
16/06/2015 - O resumo das homilias do Santo Padre durante as missas matutinas celebradas na capela Domus Sanctae Marthae

Homilia de 09 de junho, publicada no L'Osservatore Romano, ed. em português, n. 24 de 11 de junho de 2015

A “identidade cristã” encontra a sua força no testemunho e não conhece ambiguidades: por isso o cristianismo não pode ser “diluído”, não pode esconder o seu ser “escandaloso” nem transformado numa “boa ideia” por quem tem sempre necessidade de “novidades”. E atenção também à tentação da mundanidade, precisamente de quem “alarga a consciência” de modo a abranger tudo. Afirmou o Papa, recordando que “a última palavra de Deus se chama “Jesus” e nada mais”.

“A liturgia de hoje fala-nos da identidade cristã” frisou Francisco, propondo a questão central: “Qual é esta identidade cristã?”. Referindo-se à primeira leitura de hoje (2 Cor 1, 18-22), o Papa recordou que “Paulo começa narrando aos Coríntios as situações que viveram, algumas perseguições”, e “o testemunho que deram de Jesus Cristo”. Praticamente, escreve-lhes: “Sinto-me orgulhoso disto — ou seja, orgulho-me da minha identidade cristã — que aconteceu assim. E Deus é testemunha de que quando vos dirijo a palavra, é um “sim”, isto é, revelamos qual é a nossa identidade”.

“Para alcançar esta identidade cristã — explicou Francisco — nosso Pai, Deus, fez-nos percorrer um longo caminho de história, séculos e séculos, com figuras alegóricas, com promessas, alianças e assim até ao momento da plenitude dos tempos, quando enviou o seu Filho nascido de mulher”. Portanto, trata-se de um “longo caminho”. E, afirmou o Papa, “também devemos percorrer na nossa vida um longo caminho, para que esta identidade cristã seja forte e dê testemunho”. Um caminho, frisou, “que podemos definir da ambiguidade para a verdadeira identidade”.

Na carta aos Coríntios o apóstolo escreve que “é verdade que Deus é fiel, quando vos dirijo a palavra não existe um ‘sim’ e um ‘não’”. De fato, acrescenta Paulo “o Filho de Deus, Jesus Cristo, que vos temos anunciado não foi um ‘sim’ e um ‘não’, mas sempre ‘sim’”. Eis então, disse o Pontífice, que “a nossa identidade consiste precisamente em imitar, em seguir Jesus Cristo, que é o “sim” de Deus para conosco”. E “esta é a nossa vida: caminhar todos os dias a fim de fortalecer esta identidade e dar testemunho dela, passo a passo, mas sempre rumo ao “sim”, não com ambiguidades”.

“É verdade, reconheceu o Pontífice, existe o pecado e ele provoca a nossa queda, mas temos a força do Senhor para nos levantar e ir em frente com a nossa identidade”. Mas, acrescentou, “eu diria inclusive que o pecado faz parte da nossa identidade: somos pecadores, mas pecadores com fé em Jesus Cristo”. De fato, “não é só uma fé de consciência” mas “um dom de Deus que entrou em nós por Deus”. Assim, explicou o Papa, “é o próprio Deus que nos confirma em Cristo. E conferiu-nos a unção, imprimiu o selo em nós, o sinal, o penhor do Espírito nos nossos corações”. Sim, afirmou Francisco, “é Deus quem nos concede este dom da identidade” e “o problema é ser fiel a esta identidade cristã e deixar que o Espírito Santo, que é precisamente a garantia, o penhor no nosso coração, nos leve em frente na vida”.

“Somos pessoas que não vão atrás de uma filosofia” afirmou ainda o Pontífice porque “temos um dom, que é a nossa identidade: somos ungidos, temos impresso em nós o selo e dentro de nós a garantia do Espírito”. E “o Céu começa aqui, é uma identidade bonita que se vê no testemunho”. Por isso, acrescentou, “Jesus fala-nos do testemunho como linguagem da nossa identidade cristã” quando diz: “Sois o sal da terra, mas se o sal perder o sabor, com o que salgareis?”. A referência é ao trecho evangélico de Mateus proposto hoje pela liturgia (5, 13-16).

Certamente, prosseguiu o Papa, “a identidade cristã, porque somos pecadores, é também tentada, sofre a tentação — as tentações chegam sempre — e pode voltar atrás, pode enfraquecer-se e perder-se”. Mas como isto pode acontecer? “Penso — sugeriu o Pontífice — que se pode voltar atrás sobretudo por duas estradas”.

A primeira, explicou, é “passar do testemunho para as ideias” ou seja “diluir o testemunho”. Como se disséssemos: “Sim, sou cristão, o cristianismo é isto, uma boa ideia, rezo a Deus”. Mas “do Cristo concreto, porque a identidade cristã é concreta — lemos nas bem-aventuranças; este aspecto concreto está também no capítulo 25 de Mateus — passamos para uma religião um pouco soft, que paira no ar e na estrada dos gnósticos”. Mas, por trás, “há o escândalo: esta identidade cristã é escandalosa”. Consequentemente, “a tentação é dizer “não”, não, sem escândalos; a cruz é um escândalo; que Deus se tenha feito homem” é “outro escândalo” que se deixa de lado; procuramos Deus “com estas espiritualidades cristãs quase etéreas, airosas”. A ponto que, afirmou o Papa, “existem gnósticos modernos que te propõem estas soluções: não. A última palavra de Deus é Jesus Cristo, não há outra!”.

“Nesta estrada”, prosseguiu Francisco, estão também “aqueles que precisam sempre de novidades na identidade cristã: esqueceram-se que foram escolhidos, ungidos, que têm a garantia do Espírito e buscam: “Mas onde estão os videntes que hoje nos revelam qual carta Nossa Senhora nos mandará às 4h00 da tarde?”. Por exemplo, não? E vivem disso”. Mas “esta não é a identidade cristã. A última palavra de Deus chama-se “Jesus” e nada mais”.

“Uma estrada para se distanciar da identidade cristã é a mundanidade”, continuou o Santo Padre. Isto é, “alargar muito a consciência até incluir tudo: “Sim, somos cristãos mas isto pode...”, não só moral mas também humanamente”. Porque “a mundanidade é humana, e deste modo o sal perde o seu sabor”. Eis porque, explicou o Papa, “vemos comunidades cristãs, e também cristãos, que se dizem os tais, mas não podem e não sabem dar testemunho de Jesus Cristo”. E “desta forma a identidade volta atrás, perde-se” e é “este nominalismo mundano que vemos todos os dias”.

“Na história da salvação — disse Francisco — Deus, com a sua paciência de Pai, levou-nos da ambiguidade para a certeza, para a realidade da encarnação e morte redentora do seu Filho: esta é a nossa identidade”. E “Paulo orgulha-se disto: Jesus Cristo, feito homem; Deus, o Filho de Deus, feito homem e morto por obediência”. Sim, frisou o Pontífice, Paulo “orgulha-se disto” e “esta é a identidade e nela há o testemunho”. É “uma graça que devemos pedir ao Senhor: que nos conceda sempre este dom, uma identidade que não procure adaptar-se às situações que lhe fariam perder o sabor do sal”.

Antes de continuar a celebração eucarística, Francisco não deixou de frisar que também ela é “um escândalo”. Aliás, concluiu, “permito-me dizer “um duplo escândalo’. Primeiro, explicou “porque é o “escândalo” da cruz: Jesus, o Filho de Deus, que dá a sua vida por nós”. E depois “o “escândalo” de que nós cristãos celebramos a memória da morte do Senhor e sabemos que aqui se renova esta memória”. Então, precisamente a celebração eucarística “é um testemunho da nossa identidade cristã”.

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